A abertura do mercado de loterias no Brasil

Destaque, Opinião I 06.11.17

Por: Elaine Silva

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Por Mansueto Almeida e Alexandre Silva*

Existem quatro modalidades de loterias no mundo: a de sorteio de números (no Brasil, representadas pela Mega-Sena, Quina, Lotofácil, Lotomania Dupla Sena e a Timemania); a baseada em prognósticos esportivos (aqui Loteca e Lotogol), nas quais a aposta se dá no resultado dos jogos; a passiva, cuja cartela já vem com números predefinidos (Loteria Federal) e a Instantânea.

No Brasil, a arrecadação federal com essas modalidades sempre oscilou em torno de 0,2% do PIB, cerca de R$ 13 bilhões, em 2016, valores muito inferiores ao que se observa em diversos países, onde a arrecadação apenas com loterias é pelo menos 1% do PIB (R$ 65 bilhões). Ou seja, há um grande potencial de crescimento do mercado lotérico no Brasil.

A loteria instantânea, cujas apostas são feitas por meio de bilhete com campos cobertos que, uma vez raspados, o apostador pode ganhar um prêmio em dinheiro, em produtos físicos como carros e computadores, ou mesmo uma combinação de ambos, existia no Brasil, mas foi descontinuada, no âmbito federal, em 2015; não havendo, portanto, qualquer tipo de operação deste serviço no âmbito federal. Isso aconteceu por determinação da Controladoria Geral da União, que apontou haver inadequado instrumento legal para sua operacionalização. Paralelamente a isso, a Lei Federal nº 13.155/2015 autorizou o Poder Executivo federal a instituir o Serviço Público de Loteria Instantânea Exclusiva (Lotex).

A loteria instantânea é a segunda mais importante no mercado lotérico mundial, respondendo, em média, por 25% desse mercado. Em Portugal, essa modalidade chega a representar metade do mercado de loterias. Não há dúvidas que a instantânea é um dos produtos lotéricos mais importantes no mundo e o governo brasileiro espera que haja sucesso semelhante no Brasil com a retomada dessa modalidade no âmbito federal. E qual a razão dessa expectativa por parte do governo brasileiro?

Primeiro, o modelo de operação da Lotex está alinhado às melhores práticas internacionais de operacionalização de loteria. A propósito, o que se observa nos principais mercados globais é que o papel do Estado no negócio loteria se circunscreve, em geral, à regulação. Na operação, seu papel é o de gestor de contratos (terceirizando todos os elos da cadeia de valor da operação lotérica) ou como poder concedente para a iniciativa privada, que foi a opção escolhida pelo governo federal no caso da concessão da Lotex. O Brasil nunca operou loteria instantânea sob quaisquer dessas formas.

Segundo, a prestação desse serviço público será por conta e risco da concessionária vencedora do processo licitatório, com a ausência de qualquer subvenção e/ou intervenção da União na gestão do negócio, diretamente ou por meio de suas empresas estatais, ficando a concessionária total e integralmente responsável pela viabilização da exploração da Lotex. Importante destacar também que a União será sócia deste sucesso, já que auferirá 16,7% do valor da venda dos bilhetes, além da arrecadação dos tributos sobre a concessionária e imposto de renda sobre as maiores premiações.

Terceiro, antes de 2015, quando havia operação da loteria instantânea no território nacional, o valor da venda de bilhetes que voltava na forma de prêmios para o apostador, o chamado payout, era menos de 40% do valor total das vendas, comercializados em cerca de 13 mil unidades lotéricas. No novo marco legal, o payout passará a ser 65%, o que significa prêmios maiores e/ou mais frequentes, e a comercialização poderá ser feita em outros pontos de venda, físicos e virtuais, podendo chegar a mais de 65 mil pontos de venda, distribuídos por todo o território nacional. Isso colocará a Lotex em linha com o payout e canal de comercialização de loteria instantânea observados nos demais países.

Dadas as características acima e a própria entrada no mercado brasileiro de operadores que há décadas trabalham com esse serviço em diversos países no mundo, não há como olhar para experiências anteriores de loteria instantânea no Brasil para projetar o futuro dessa loteria no país. Portanto, a Lotex é um projeto completamente novo, uma operação greenfield na linguagem técnica de plano de investimento.

Vale ressaltar também que, pela primeira vez em mais de meio século da existência de loterias no Brasil, teremos um leilão competitivo que requer experiência comprovada da futura empresa operadora e que marca a abertura do mercado brasileiro de loterias. Há cerca de vinte e cinco empresas no mundo com o potencial de participar do processo de concessão da Lotex, que é um serviço que exige uma logística eficiente na confecção, distribuição e controle na segurança de bilhetes em todo o território nacional, um desafio importante para um país com dimensões continentais como o Brasil.

Um leilão competitivo com a participação das maiores empresas de loterias do mundo, o pagamento mínimo de outorga de R$ 916 milhões, um plano de negócios que sinaliza para um crescimento de mais de 30% do mercado de loterias no Brasil pelos próximos cinco anos e mais que duplicá-lo ao longo dos próximos 15 anos é sem dúvida um excelente projeto para o país. Isso significa, entre outras coisas, um crescimento de mais de R$ 500 milhões no orçamento anual do Ministério do Esportes até 2022, um crescimento de 40% frente ao orçamento aprovado neste ano para este ministério.

Por fim, vale mencionar que, depois de mais de um ano de estudos cuidadosos sobre o melhor modelo para explorar a Lotex e de diversas reuniões sobre o assunto com diferentes empresários e pesquisadores no Brasil e no exterior, não há dúvida que, do ponto de vista do interesse público da União e transparência, a concessão da Lotex em leilão por um prazo semelhante ao observado em outros países é a melhor forma para a modernização e crescimento das loterias no Brasil, beneficiando de forma expressiva o investimento em esportes, assim como na seguridade social e no sistema penitenciário.

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(*) Mansueto Almeida e Alexandre Manoel Angelo da Silva são, respectivamente, secretário de Acompanhamento Econômico e secretário adjunto de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. O texto acima foi veiculado na edição deste segunda-feira do Valor Econômico.

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