Façam suas apostas.

Bingo I 28.10.03

Por: sync

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Um setor que gera mais empregos que o conglomerado Pão de Açúcar e o Banco Itaú juntos – 120 mil postos nas 1.100 casas espalhadas pelo País – e é capaz de engordar os cofres da União em pelo menos R$ 20 milhões por mês. Estes são os principais argumentos da Associação Brasileira de Bingos (Abrabin) a favor da regulamentação da atividade. Outrora tidos como vilões, hoje estes empresários tentam reverter esta imagem fixada na opinião pública. E ganharam um forte aliado: o próprio governo federal. A intenção é arrecadar dinheiro para investir no desenvolvimento do esporte e em programas de inclusão social, além de ajudar a criar empregos. Para isso, o Palácio do Planalto está preparando um projeto de lei para enviar ao Congresso Nacional regulamentando o funcionamento das casas de bingo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no primeiro dia de outubro, criou uma comissão, coordenada pelo ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e com representantes dos ministérios da Justiça, da Fazenda e dos Esportes, agora responsável por fazer o levantamento completo sobre a situação jurídica do setor, que hoje funciona graças a decisões liminares obtidas na Justiça.Não é de hoje que o PT apóia a regulamentação do bingo. Na abertura do ano legislativo, em fevereiro deste ano, o governo enviou ao Congresso um conjunto de idéias pelas quais pretendia lutar. Entre elas está a normatização do setor, a fim de transferir a arrecadação para o Ministério do Esporte. As casas de bingo vivem hoje em um limbo jurídico e só funcionam porque algumas delas conseguiram autorizações provisórias na Justiça, onde centenas de ações esperam julgamento definitivo. Agora, tudo indica que a regulamentação está a caminho, embora a passos lentos.

Pelo social – Em dezembro de 2000, a Lei Federal 9.981 revogou a permissão concedida pela Lei Pelé para a abertura dos bingos. Leis estaduais e liminares na Justiça, no entanto, vêm garantindo o funcionamento em quase todos os Estados. No Paraná, dois decretos assinados em 9 de abril pelo governador Roberto Requião (PMDB) proibiram os bingos e os caça-níqueis, transformando o Estado no único onde o jogo não pode funcionar. “O bingo é danoso pela facilidade com que se sonega e lava dinheiro. O Estado não tem como fiscalizar o número de cartelas, de jogos, de pessoas”, diz o secretário estadual de Segurança do Paraná, Luiz Fernando Delazari. Do outro lado do campo, o Rio de Janeiro, por exemplo, apóia as casas.
O argumento do governo fluminense é o mesmo dos empresários: a indústria do jogo gera trabalho – seriam seis mil empregos diretos, segundo a Associação dos Administradores de Bingos do Estado do Rio – e ajuda, por tabela, programas sociais. Além dos 7% da receita bruta que os bingos têm de destinar a clubes e federações esportivas, o governo do Estado criou uma taxa de administração variável – 5% do faturamento daqueles localizados na zona sul e 2% na zona norte do Rio – que arrecada R$ 3 milhões por mês. Segundo a Loterj, 70% desse valor é destinado, por meio da ONG Vida Obra Social, a projetos como o Farmácia Popular, o Sopa da Cidadania e os restaurantes populares. A Loterj informa ainda que patrocina 18 atletas com esses recursos. “O bingo para o Rio de Janeiro é fundamental. O repasse dessas casas representa 80% da nossa receita”, afirma Rogério Vargas, presidente da Loterj.

Atletas – É também por motivos nobres que o ministro dos Esportes, Agnelo Queiroz, se diz a favor dos bingos no País. Agnelo, que é deputado do PCdoB eleito pelo Distrito Federal, onde a Justiça permitiu o funcionamento das casas, apóia a regularização do setor. Ele argumenta que, até 2002, os bingos financiavam o esporte amador. Mas, este ano, os muitos atletas que dependiam do dinheiro para continuar competindo deixaram de receber apoio. Para o bem ou para o mal, os procuradores do Ministério Público são quase unânimes em afirmar que só o governo federal tem poder para regulamentar os bingos. No entanto, de olho na receita e nos empregos que geram, a maioria dos Estados decidiu por conta própria regularizar. Por isso, pipocam batalhas nos tribunais do País. No Rio, a disputa judicial entre o MP e os empresários tem provocado um abre e fecha dos bingos da cidade. Durante uma semana, entre 9 e 15 de outubro, os 39 bingos do Rio, além dos quatro de Niterói, ficaram fechados por ordem da Justiça. “Eles não podem funcionar porque os Estados não podem legislar sobre bingos”, afirma o procurador da República José Augusto Vagos.

Entretenimento – Mas, para a Abrabin, o que importa é o fato de o ministro Marco Aurélio de Melo, do Supremo Tribunal Federal, ter autorizado a reabertura das casas no Rio. “Para nós é uma decisão emblemática porque amplia a convicção de que o bingo será reordenado”, diz o presidente da entidade, Olavo Sales, sócio do Bingo Augusta, de São Paulo, um dos maiores do País. Os empresários do setor acreditam que a normatização pode gerar cerca de 300 mil novos empregos. A idéia é transformar as casas de bingo em centros de entretenimento, com restaurantes, espaços para shows e boates. “Nós queremos uma legislação dura que não permita a sonegação. As punições também devem ser severas. É importante que tudo esteja na lei para não haver brechas para duplas interpretações”, defende Olavo. A Abrabin também quer a criação de um fundo único que abrigue o porcentual destinado ao esporte, a fim de evitar que empresários mal intencionados façam acordos com pequenas entidades e não repassem o valor obrigatório. A tributação sobre o setor certamente será o principal tema tratado pela comissão interministerial. Ainda não se sabe quanto o governo quer abocanhar dos bingos nem como será a divisão do bolo. Sabe-se, sim, que o Ministério dos Esportes deve ficar com a maior parte. A nova proposta do governo Lula vai atropelar um outro projeto de lei que desde novembro de 2001 está pronto para ser votado pela Câmara, mas ainda não entrou em pauta. Esse projeto foi relatado pelo deputado Gilmar Machado (PT-MG), defensor da regularização dos bingos. “Não fui consultado pelo Planalto”, reclama o deputado, que não entende a demora do Legislativo para resolver a questão.Por orientação do Planalto, o presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), engavetou o projeto de lei e irritou Gilmar Machado. Pela proposta do deputado mineiro, os bingos não poderiam mais repassar dinheiro a entidades esportivas, como acontecia até dezembro do ano passado. O projeto já foi aprovado pelas comissões de Constituição e Justiça, Educação e Cultura, Desporto e Finanças da Câmara e prevê o repasse de 35% do total arrecadado pelos bingos para a Caixa Econômica Federal. Com o dinheiro, a CEF financiaria as entidades esportivas, que não teriam mais contato com as casas de jogos.A comissão interministerial nomeada por Lula começa a se reunir nesta semana. Como tem prazo inicial de 45 dias para fazer a análise da situação jurídica dos bingos, só terminará seus trabalhos depois do final do ano legislativo. Ou seja, a previsão é de que o projeto do governo só chegue ao Congresso em fevereiro do ano que vem. Enquanto isso, a situação dos bingos continuará indefinida.
Isto É – Ines Garçoni e Leonel Rocha – Colaborou: Ricardo Miranda (RJ)

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