Juiz do Rio de Janeiro atendeu, em parte, o pedido do Ministério Público.

Especial I 10.09.03

Por: sync

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Diferente da interpretação divulgada na edição de ontem do BNL, o juiz André Felipe Alves da Costa Tredinnick da 7ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro, concedeu liminar proibindo a renovação das autorizações dos 39 bingos do Rio de Janeiro que expiram no próximo mês de novembro.
Devido ao fato do Tribunal de Justiça, só divulgado ontem em seu site a parte final da “Decisão”, ficou caracterizado que a Loterj não poderia conceder novas licenças, diminuindo assim a concorrência, como divulgamos.
A assessora jurídica da Loterj, Marta Monteiro, também tem o mesmo entendimento. “Não se trata de nova concessão, mas de renovação das autorizações já existentes”, afirmou a advogada. Mas a promotora Gláucia Santana do Ministério Público diz que não. “A Loterj está interpretando o que lhe é conveniente. As atuais licenças não poderão ser renovadas e os bingos terão que parar de funcionar”, assegura Gláucia. O fechamento das casas, a partir de novembro, foi confirmado com o juiz Tredinnick, por meio da assessoria de imprensa do TJ.
A Loterj por sua vez vai recorrer da medida. Ainda segundo Martha Monteiro, uma liminar concedida pelo Tribunal Regional Federal, em vigor desde 2002, dá direito ao Governo do estado de legislar sobre as casas de bingo. Já a Associação de Bingo e Similares informou que também vai recorrer da decisão do Juiz.
Sob fogo cerrado.Com essa ação, passam a ser cinco ações públicas em que o Ministério Público do Rio de Janeiro pretende fazer valer a tese de que o Estado do Rio de Janeiro não possui competência para legislar sobre a Loteria de bingos.
Atualmente, existe decisão de antecipação de tutela concedida em Apelação em Mandado de Segurança, do desembargador federal Alberto Nogueira, que considerou legítimas as autorizações concedidas pela Loteria do Estado do Rio de Janeiro. A referida decisão foi informada ao Ministério Público Estadual, em 29 de novembro de 2002 e existe também decisão do mesmo desembargador federal Alberto Nogueira, proferida em Agravo de Instrumento em Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal, em que aquele magistrado ratifica o entendimento pela manutenção da atividade por presunção de constitucionalidade.
Além disso, a Procuradoria Geral da República ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal questionando o Decreto do Governador Garotinho que criou a Loteria de Bingos da Loteria do Estado do Rio de Janeiro.
Abaixo, na íntegra a decisão do juiz André Felipe Alves da Costa Tredinnick da 7ª Vara de Fazenda Pública do Rio de Janeiro. 

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO7ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL.
Proc. No 2003.001.106509-0
Ação Civil Pública
A: Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro
R: Loterj e outros.    
DECISÃO
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro propôs a presente Ação Civil Pública com pedido de tutela antecipada em face da LOTERJ e outros, instaurada a partir, de inquérito civil.
Tendo sido formulado pedido de antecipação de tutela, descabe a aplicação do artigo 2° da lei 8.437/92, ainda que a LOTERJ seja uma autarquia estadual, conforme o artigo 2o  da Portaria n° 138 de 23 de junho de 1975 e artigo 1° do Decreto n° 11.269 – de 04 de maio de 1988.
A lei 8.672 de 06 de julho de 1.993 (“Lei Zico”), que instituía normas gerais sobre desportos, autorizou no seu artigo 57 "s entidades de direção e de prática desportiva [a] …(promover reuniões destinadas a angariar recursos para o fomento do desporto, mediante sorteios de modalidade denominada Bingo, ou similar” como uma exceção à regra da proibição do jogo e de sua tipificação penal (artigo 50 da LCP).
A lei 9.615/98 (‘Lei Pelé’), que em seu artigo 96 revogou expressamente a lei 8.672/93, regulou o jogo do bingo no território nacional.
A lei 9.981/2000 revogou todas as disposições da lei 9.615/98 sobre o referido jogo, em seu artigo 2°, estabelecendo que a partir de 31 de dezembro de 2001 estariam revogados os artigos desta lei, criando assim um prazo para que os beneficiados com o jogo pudessem se ajustar ao retorno da proibição, "respeitando-se as autorizações que estiverem em vigor até a data da sua expiração". 
Como se pode extrair do parágrafo único do citado dispositivo, bem como das diversas disposições sobre a matéria, especialmente o então artigo 60 da lei 9.615/98 e o Decreto da PR n. 3.659/2000 (que regulamentava as disposições da lei 9.615/98 sobre o jogo do bingo), a referida autorização somente pode ser concedida pela Caixa Econômica Federal.
No âmbito local, por conta do permissivo do § 1° do artigo 57 da lei 8.672/93,  revogada desde 1.998, que estabelecia que "o órgão competente de cada Estado e do Distrito Federal normatizará e fiscalizará a realização dos eventos de que trata esse artigo”, o Estado do Rio Janeiro publicou a lei Estadual n° 2.055, de 25 de janeiro de 1993, dispondo sobre as aliquotas de ICMS, e estabeleceu em seu artigo 9° que ”fica a loteria do Estado tio Rio de Janeiro- Loterj – autorizada a distribuir prêmios ao "sorteio de bingo”, de conformidade com a Legislação em Vigor" (grifei).
É de se notar também que a lei estadual foi editada assim antes mesmo que a lei federal 8.672/93 fosse publicada.
No intuito de regulamentar esta disposição da lei estadual, foi editado o Decreto 25.723/99, que “dispõe sobre a exploração de Loterias de Bingos pela Loteria do Estado do Rio de Janeiro – Loterj”, que foi modificado pelo Decreto 27.460/00 e posteriormente pelo Decreto 30.135/01.
O Presidente da Loterj, com fundamento nos Decretos n° 25.723, de 16 de novembro de 1999 e n° 30.135, de 12 de dezembro de 2001, editou a Portaria n° 168, de 17 de dezembro de 2001, regulamentando diversas modalidades de bingo.
Sustenta o Ministério Público estadual que estas disposições legais e administrativas da autoridade pública são inconstitucionais, porque além de tudo violam a regra de competência privativa da União para legislar sobre "sistemas de consórcios e sorteios" (artigo 22, XX, CF), que se consubstancia em regra histórica do direito brasileiro, para atribuir tal competência com exclusividade à União.
Neste sentido, é expresso o artigo 3° do Decreto-lei n° 854 de 12 de novembro de 1.938, verbis.  "A concessão lotérica, como a derrogação das normas de direito penal, que proíbam o jogo de azar, emanara sempre da União, por autorização direta quanto à loteria federal ou mediante decreto de ratificação quanto às loterias estaduais", repetido com alterações em outras disposições legais.
Recentemente, no julgamento da ADIN 1.169, onde se questionava a constitucionalidade dos dispositivos da lei revogada n° 8.672/93, no que dizia respeito justamente à delegação do jogo aos Estados-membros, o STF entendeu que tal autorização seria constitucional, ressalvando o Ministro Ilmar Ga1vão o que se afirmou sobre a competência privativa da União sobre a matéria. Não mais vigendo tal legislação, são manifestamente ilegais e inconstitucionais as disposições da autarquia estadual sobre a matéria.
Dito isso, passamos a enfrentar o pedido de antecipação de tutela, que é duplo: a1meja o Ministério Público tanto a suspensão do funcionamento das casas de bingo quanto vedação da concessão de novas licenças para o funcionamento de locais destinados a exploração de bingo.
Quanto a este, há prova inequívoca do direito, havendo verossimilhança nas alegações do Ministério Público, sendo plausível a inconstitucionalidade do artigo 9 °  da Lei Estadual n° 2.055, de 25 de janeiro de 1993, e dos Decretos n° 25.723, de 16 de novembro de 1999 e n° 30.135, de 12 de dezembro de 2001, e a ilegalidade da Portaria n°  168, de 17 de dezembro de 2001.
O periculum in mora também está presente com relação a este pedido, tendo em vista que em se permitindo tal atividade da autarquia estadual, estar-se-ía perpetuando a situação que se afigura ilegal e inconstitucional, ao invadir competência legislativa privativa da União. No que tange à suspensão do funcionamento das casas de bingo demandadas, entendo que se afigura prematura a concessão da tutela antecipada, não havendo que se falar em periculum in mora, quando se afigura próxima a data de expiração das autorizações para funcionamento dos estabelecimentos nos termos do artigo 9° da Portaria 168/2.001.
Isto posto, em plena cognitio, defiro em parte o pedido de tutela antecipada para determinar que a Loterj se abstenha de conceder novas licenças ao autorizações para funcionamento de estabelecimentos destinados a exploração de loteria de bingo de qualquer modalidade, nos termos do Art. 273 do CPC. Citem-se e intimen-se os réus, expedindo-se precatórias quando necessário.
Rio de Janeiro, 08 de setembro de 2.003.
André Felipe Alves da Costa Tredinnick
Juiz de Direito 

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