Juiz manda bens de bingos para entidades filantrópicas

Especial I 09.05.07

Por: sync

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A casa de bingos Only Play Diversões Eletrônicas, de Nova Friburgo, região serrana do Rio, não poderá mais explorar jogos de azar na cidade e os seus bens ficarão sob custódia de, pelo menos, quatro entidades filantrópicas. A determinação foi dada pelo juiz federal Elmo Gomes de Souza, da Seção Judiciária do Rio de Janeiro. Cabe recurso.
Na decisão, o juiz destacou que por se tratar de questão polêmica, há uma grande probabilidade do processo durar anos, já que a matéria é constitucional e está sendo prequestionada desde o primeiro grau da Justiça. Segundo ele, como a casa de bingo ficará fechada, os bens não serão utilizados tão cedo e, por isso, teria mais serventia às entidades, que ficarão como depositárias fiéis enquanto não se decide o mérito da questão.
“Além disso, percebo que existem bens que são de tecnologia recente e que, sem o uso, restarão praticamente inservíveis quando do desfecho definitivo da ação. Não será útil nem para a ré — caso saia vencedora — nem para a União, para fins de satisfação de eventuais créditos tributários não saldados”, ressaltou o juiz.
Destacou, também, que todos sabem das dificuldades pelas quais passam as (sérias) instituições filantrópicas, que devem se submeter à caridade alheia. Ele afirmou que o Poder Público, muitas das vezes, volta às costas para essas entidades, ou não assume os encargos que lhe são devidos e que são preenchidos pelo terceiro setor.
De acordo com ele, o poder Judiciário não pode ficar impassível diante de tal quadro. Elmo Gomes de Souza ressalta que são objetivos fundamentais da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, bem como ter em mira a redução das desigualdades sociais (artigo 3º, I e III, Constituição Federal de 1988).
Anteriormente, os bens estavam sob a responsabilidade de um único depositário. O juiz, no entanto, mandou que os bens fossem removidos para as entidades filantrópicas.
Ressaltou que é totalmente impossível que uma pessoa faça a conservação de 8 extintores de incêndio, utilize mais de 5 televisores de plasma, se utilize de mais de uma dezena de computadores, mais de 300 cadeiras, inúmeras impressoras, sistema de som e segurança, além de inúmeros armários, arquivos e outros bens.
“Creio que o depósito deve ser útil para a preservação dos bens, além do que deve haver uma destinação afetável provisória, se possível de interesse social”, finalizou o juiz.
Polêmica dos bingos
Antes da deflagração da Operação Hurricane pela Polícia Federal, que teve como alvo a máfia dos caça-níqueis no Brasil, as autoridades já demonstravam preocupação com o problema.
O Ministério Público do Estado de São Paulo, em fevereiro deste ano, conseguiu liminar em Ação Civil Pública contra os estabelecimentos comerciais do município de São Bernardo do Campo, que mantinham máquinas de caça-níqueis ilegais.
“A atividade dos caça-níqueis é explorada pela criminalidade organizada, dando margem à lavagem de dinheiro proveniente do tráfico de drogas e de armas, enriquecendo seus responsáveis, que não recolhem tributos, desdenhando da lei e do Poder Público. Ou seja, o fato é muito mais grave do que se imagina, não se limitando a lesar patrimonial e psicologicamente os jogadores, mas a municiar os barões do crime organizado”, defende o promotor Jairo Edward De Luca.
A ação pedia a apreensão das máquinas caça-níqueis e a cassação do alvará de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, interditando-os, caso os responsáveis não as retirassem de local acessível ao público, sob pena de multa diária no valor de R$ 500 por máquina.
Operações
O jogo do bicho e a máfia das máquinas de caça níqueis há tempos estão no foco das investigações da Polícia Federal. Desde dezembro, quatro grandes operações foram deflagradas. Na mais recente, Operação Hurricane, os policiais cumpriram 25 mandados de prisão.
Entre os dias 14 e 16 de dezembro de 2006, a PF desencadeou a Operação Gladiador. Nela, prendeu 19 pessoas acusadas de envolvimento com a máfia dos caça-níqueis. Ao mesmo tempo, era deflagrada a Operação Ouro de Tolo, que resultou na apreensão de mais de 4 mil caça-níqueis e na interdição de 18 casas de bingo, localizadas no Rio de Janeiro.
A última operação, realizada no início de abril, por mais de 100 agentes da Polícia Federal e cerca de 60 oficiais de Justiça, fechou 22 casas de bingo. A determinação partiu da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, informou a Agência Estado.
O mais famoso episódio envolvendo o jogo do bicho aconteceu em 1993. A então juíza Denise Frossard condenou 14 pessoas por envolvimento na prática ilegal. Três deles voltaram a ser presos na Operação Furacão: Antonio Petrus Kalil (o Turcão), Aniz Abraão David (o Anísio) e Ailton Guimarães Jorge (o Capitão Guimarães). (Revista Consultor Jurídico – Gláucia Milicio)

Leia a decisão


PROCESSO:
2006.5105001835-8/AÇÃO CIVIL PÚBLICA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: ONLY PLAY FRIBURGO DIVERSÕES ELETRÔNCIAS LTDA.
 
D E C I S Ã O

Estando os autos no MPF requisitei-os para proferir importante decisão de cunho social.
No auto de arresto, remoção e depósito de fls. 55/57 constam inúmeros bens que restaram depositados em mãos do sr. Carlos Alberto dos Santos Mattos. Desde televisores de plasma até lixeiras, passando por armários, mesas, fogões industriais, aparelhagem de som, extintores de incêndio, ar condicionados, dentre inúmeros outros.
Como a decisão monocrática não foi modificada no tocante à permissão de funcionamento do bingo, os bens não estão afetados, visto que a empresa-ré encontra-se totalmente paralisada.
Partindo desta premissa, entendo que três fatores aqui se entrecruzam: o tempo, a afetação e a destinação provisória dos bens arrestados e, além da serventia.
O referido processo, por tratar questão polêmica, possui grande probabilidade de durar anos, visto que matéria constitucional está sendo prequestionada desde o primeiro grau. Em virtude disto, os bens não serão utilizados tão cedo pela ré, visto que são basicamente destinados à sua atividade (mesas, aparelhos de som, cadeiras). Ademais, percebo que existem bens que são de tecnologia recente e que, sem o uso, restarão praticamente inservíveis quando do desfecho definitivo da ação. Não será útil nem para a ré – caso saia vencedora – nem para a União, para fins de satisfação de eventuais créditos tributários não saldados.
Daí porque entendo que o depositário que inicialmente aceitou o encargo não é o mais indicado para a guarda dos bens arrestados. Creio que o depósito deve ser útil para a preservação dos bens, além do que deve haver uma destinação afetável provisória, se possível de interesse social.
Todos sabemos as dificuldades pelas quais passam as (sérias) instituições filantrópicas, que devem se submeter à caridade alheia, mesmo porque o Poder Público muitas das vezes volta as costas para elas, ou não assume os encargos que lhe são devidos e que são preenchidos pelo terceiro setor.
O Poder Judiciário não pode ficar impassível diante de tal quadro, até porque são objetivos fundamentais da República a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, bem como ter em mira a redução das desigualdades sociais (art. 3º, I e III, CF/88). Buscar dar a máxima efetividade à Constituição, tão bem delineada pela doutrina .
Agora o Judiciário tem o poder de realizar (provisoriamente, diga-se de passagem) este objetivo perseguido pela República Federativa do Brasil. Não pode este magistrado ficar impassível diante de tais bens, diga-se de passagem suntuosos, novos e de imensa utilidade para cumprimento dos misteres das instituições. Chega a ser injusto deixar referidos bens relegados a depositários que não lhe darão a conservação que se preze . Antes, isto é pura imposição da ética de valores.
E não se diga que o atual proprietário fará cumprir o múnus a que se propôs, pois é totalmente impossível que uma pessoa perfaça a conservação de 8 extintores de incêndio, utilize mais de 5 televisores, se utilize de mais de uma dezena de computadores, mais de 300 cadeiras, inúmeras impressoras, sistema de som e segurança, além de inúmeros armários, arquivos e outros bens.
Por experiência jurídica, sabe-se que bens apreendidos chegam ao final praticamente inservíveis, por depreciação natural, superação de tecnologia ou falta de uso . Basta um real exame de constatação de preservação dos bens apreendidos pela Justiça Federal. Inúmeros não suportam o desfecho da ação.
Torna-se inarredável a afetação, de cunho social e servência dos bens, visando combater o tempo que gera tanta insatisfação, injustiça e depreciação, desgaste.
Assim, destituo o atual depositário dos seguintes bens abaixo relacionados, nomeando para o encargo as seguintes instituições:

Instituição 1:

— 1 fax Panasonic
— 2 extintores
— 1 impressora HP
— 1 espremedor de frutas Croidon
— 1 forno a gás com porta de vidro
— 1 TV, CCE, 29”
— 1 DVD marca Studii
— 1 amplificador de som
— 1 lixeira
— 1 ventilador de mesa FAET
— 1 arquivo de 4 gavetas
— 2 nobreak
— 2 cadeiras de escritório
— 14 mesas redondas;
— 2 teclados de computador
— 1 microfone
— 7 cadeiras de escritório com apoio de pé
— 1 monitor marca AOC
— 2 armários de ferro com 8 portas

Instituição 2

— 1 TV 29” – CCE
— 1 TV 14”, CCE
— 1 cofre, marca Techner
— 1 sofá de 2 lugares
— 2 nobreak
— 1 impressora HP
— 2 extintores
— 14 mesas redondas
— 1 lixeira
— 1 calculadora Sharp
— 1 arquivo de 4 gavetas
— 2 teclados de computador
— 2 mesas de escritório
— 7 cadeiras de escritório com apoio de pé
— 2 armários de ferro com 8 portas
— 1 monitor AOC

Instituição 3

— 1 microfone
— 1 mesa de som
— 1 amplificador de som
— 1 lixeira
— 1 aspirador de pó
— 2 fogões industriais de 4 bocas
— fritadeiras marca Tedesco e Croydon
— 1 moedor de carne
— 1 cortador de frios
— 1 máquina de abrir massa
— 1 cadeiras de escritório
— 1 cofre marca Techner
— 1 ventilador de mesa FAET
— 1 nobreak 600 Kva
— 2 extintores
— 2 teclados de computador
— 14 mesas redondas
— 1 mesa de escritório
— 1 mesa de escritório pequena
— 6 cadeiras de escritório com apoio para os pés
— 2 armários de ferro com 8 portas
— 1 TV CCE 29”
— 1 arquivo pequeno de 2 gavetas
— 1 arvore de natal.
 
Instituição 4
— 1 TV CCE 29” .

Ficarão como depositários os seguintes representantes das entidades: (omissis)
Lembro que havendo retirada do depositário dos quadros da entidade, esta deverá comunicar imediatamente a este Juízo, indicando novo nome.
E não se diga que as referidas instituições não possuem confiabilidade suficiente para exercício do encargo, pois todas elas estão devidamente inscritas no programa-piloto PROSOCIAL, de iniciativa da Corregedoria-Geral do TRF da 2ª Região, dirigido especificamente à execução fiscal e em operação na Vara Federal de Nova Friburgo.
Intime-se o depositário para entrega imediata dos bens. Os demais bens, além daqueles que porventura não forem removidos, permanecerão na guarda e confiança do primitivo depositário.
Transfiram-se as TV’s de plasma para a sede da Vara Federal de Nova Friburgo até atestar-se a segurança de permanência das mesmas nas referidas instituições.
Fica desde já decretada a prisão civil do depositário caso não sejam encontrados os referidos bens acima transcritos no dia da diligência, servindo esta decisão como mandado.
P.I.
Nova Friburgo, 25 de abril de 2007 (19h24min).

ELMO GOMES DE SOUZA
Juiz Federal

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