Liberação dos jogos de azar no país volta à pauta do Congresso

Destaque I 06.12.17

Por: sync

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A abertura de casas que exploram jogos de azar no Rio Grande do Sul e o crescente interesse de investidores internacionais em explorar o mercado no país aqueceram o debate sobre o tema. As discussões sobre a liberação de cassinos, bingos, jogo do bicho e caça-níqueis, que estavam em ritmo lento no Congresso, ganharam fôlego — projeto que tramita no Senado deve ter parecer lido nesta quarta-feira (6) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

No entanto, pressões da bancada evangélica e resistências de quem acredita em aumento da lavagem de dinheiro e do vício em jogos mantêm o assunto em suspenso. Entusiastas das apostas projetam arrecadação de R$ 18 bilhões por ano em tributos.

O relator do texto que está no Senado, Benedito de Lira (PP-AL), indica a exploração de jogos a partir de outorgas reguladas pela União.

– O longo período de proibição do jogo no Brasil, cerca de 75 anos, rotulou a atividade como uma questão moral, inclusive, contaminando o debate sobre a legislação dos jogos – afirma o senador.

A proposta prevê a instalação de até três cassinos por Estado, desde que integrem centros de lazer. Também autoriza o funcionamento de bingos, jogo do bicho e apostas online.

Os tributos arrecadados seriam divididos em 40% para o governo federal, 30% para os estaduais e 30% para os municípios. O investimento seria destinado para a saúde, Previdência e assistência social.

Dentro da CCJ, não há maioria formada sobre o tema. Pelo menos dois senadores — Lindbergh Farias (PT-RJ) e Magno Malta (PR-BA) — contestam as regras propostas e a expectativa é de pedido de vista, o que atrasa a votação. O projeto não deve ser apreciado no plenário do Senado em 2017.

Proposta na Câmara

Na Câmara dos Deputados, há um projeto sobre o tema pronto para votação conclusiva. A matéria foi protocolada há 26 anos e acabou reunindo outras 16 propostas.

O texto é semelhante ao do Senado. No entanto, os tributos previstos ainda não foram definidos, assim como a divisão dos recursos. Ainda assim, os valores só poderiam ser gastos em educação, saúde, previdência social, segurança pública, proteção a pessoas viciadas em jogos e atenção e cuidado ao idoso.

— Queremos votar ainda neste ano. Vamos cobrar do presidente da Câmara para que coloque em votação — relata o presidente da Frente Parlamentar pela Aprovação do Marco Regulatório dos Jogos no Brasil, Cesar Halum (PRB-TO).

Um trecho polêmico da proposição sugere a anistia a todos os acusados da prática ilegal de jogos de azar, enquadrados em leis existentes atualmente. O parlamentar afirma que outros crimes ligados à exploração irregular das apostas, como lavagem de dinheiro, não seriam perdoados.

Halum, que integra a bancada evangélica, admite que colegas ligados a igrejas resistem em apoiar a iniciativa. No entanto, avalia que isso ocorra por falta de conhecimento sobre o assunto.

Defensores das duas propostas buscam entendimento, já que os projetos precisam ser aprovados pela Câmara e pelo Senado ou vice-versa. A tendência é prevalecer o texto que for aprovado primeiro.

Além das duas propostas, há um processo aguardando julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em outubro de 2016, recurso do Ministério Público do Rio Grande do Sul chegou à Corte, tendo Luiz Fux como relator.

O documento contestava entendimento de Turmas Recursais Criminais do Tribunal de Justiça do Estado de que o jogo não caracteriza conduta ilícita. Os ministros reconheceram a repercussão-geral do tema, e o plenário deverá decidir se o jogo de azar é conduta ilícita. Ainda não há data prevista para a sessão.

Propostas em análise

Os projetos que liberam os jogos de azar que tramitam no Senado e na Câmara são semelhantes. A tendência é que os textos sejam unidos em uma das Casas para que a votação seja agilizada.

NO SENADO

– Libera a atividade de cassinos, bingos, jogo do bicho, caça-níqueis e apostas online

– Os estabelecimentos seriam controlados por uma agência pública federal

– Autoriza a instalação de cassinos por meio de licitação e dentro de complexos de lazer criados para esse fim

– Os equipamentos teriam de estar interligados com sistema eletrônico fiscal do governo

– O tributo a ser pago à União ficaria entre 10% e 20%. O valor arrecadado – cerca de R$ 15 bilhões por ano – seria dividido em 40% para o governo federal, 30% para Estados e 30% para municípios

– Os tributos seriam carimbados para educação, previdência social e assistência social

– Viciados em jogos, incluídos em cadastro nacional a ser criado, seriam impedidos de jogar

NA CÂMARA

– Libera a atividade de cassinos, bingos, jogo do bicho, caça-níqueis e apostas online

– Os estabelecimentos seriam controlados por órgãos públicos criados pelo governo federal (agência reguladora) e pelos Estados (empresa pública ou autarquia)

– Os municípios ficariam responsáveis pelas licenças a bingos

– Autoriza a instalação de cassinos por meio de licitação, desde que dentro de complexos de lazer

– Máquinas eletrônicas precisariam de laudo atestando seu funcionamento

– Os equipamentos teriam de estar interligados com sistema eletrônico fiscal do governo

– Haveria divisão do tributo a ser pago pela União, mas os índices ainda não foram calculados

– Os valores arrecadados seriam carimbados para educação, saúde, previdência social, segurança pública, proteção a pessoas viciadas em jogos e atenção e cuidado ao idoso

– Viciados em jogos – incluídos em cadastro nacional a ser criado – seriam impedidos de jogar

– Anistia todos os acusados da prática de exploração ilegal de jogos de azar sob a vigência de leis anteriores. (Zero Hora e GauchaZH – Mateus Ferraz – RBS Brasília)

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Arrecadação e lavagem de dinheiro pautam discussão sobre legalização de jogos

Comissão do Senado deve analisar nesta quarta-feira projeto que libera atividade no país, enquanto texto semelhante tramita na Câmara

O Rio Grande do Sul é um dos protagonistas das discussões sobre a liberação dos jogos de azar. Além do entendimento das turmas recursais do Tribunal de Justiça (TJ) do Estado, de que punições a quem explora as apostas seriam inconstitucionais, há uma lei de 1984 que regulamenta apostas em corridas de cavalos, chamada de Lei do Turfe. O artigo 14 da regra autoriza jockey clubs a explorarem "outros tipos de loterias".

O promotor de Justiça Luciano Vaccaro, que coordena o Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público (MP), relata que a instituição ainda analisa a situação de estabelecimentos amparados pela Lei do Turfe. Em relação às demais, que não têm vínculos com hipódromos, pontua que a prática segue ilegal e, por isso, ações continuarão sendo realizadas:

— É nosso dever, como fiscais da lei, atuar na repressão desse delito.

Ministério Público Federal (MPF) divulgou, em novembro, posicionamento contrário à liberação dos jogos de azar. Em nota técnica encaminhada ao Senado, a instituição afirma que o projeto "não cria mecanismos de controle efetivo da lavagem de dinheiro e da sonegação fiscal, ao contrário, cria novos e poderosos mecanismos para a lavagem de dinheiro".

A possibilidade de crimes financeiros, assim como a expectativa de aumento no número de viciados em jogos, é contestada pelo Instituto Jogo Legal (IJL). A entidade, criada para defender e trabalhar pela liberação das apostas no país, projeta benefícios ao Brasil na comparação com a realidade de outros países com regulamentação.

— A lei tem que ser dura e não nos causará obstáculos. O Brasil só vai atrair grandes investidores se tiver legislação séria sobre o assunto, transparente e que não permita aventureiros — diz o presidente do IJL, Magno José Santos de Sousa.

Ele avalia que a outorga de um cassino em grandes centros urbanos poderia render cerca de R$ 1 bilhão ao governo federal. Sousa também comenta que investidores estrangeiros demonstram interesse no Rio Grande do Sul e que um grupo português já visitou Gramado. Ele destaca que o Estado é o quarto com o maior potencial de apostas no país, perdendo apenas para São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

O presidente interino da Associação Gaúcha de Entidades Esportivas e Administradoras de Bingo (Agebi), Márcio Augusto da Silva, afirma que o controle da entrada e saída de dinheiro, caso a legislação seja aprovada, será facilitada pelo uso de cashless — um cartão com créditos e que poderá ser rastreado, eliminando o uso de dinheiro vivo.

A facilidade de controle é contestada pelo economista especialista em prevenção de lavagem de dinheiro Mauro Salvo. Ele questiona a capacidade da União de fiscalizar a atuação de casas de apostas.

— A vulnerabilidade desse setor é enorme. Tem de calcular o custo-benefício dessa legalização, qual benefício vai trazer — salienta.

Já o especialista em segurança pública e secretário-executivo do Instituto Cidade Segura, Alberto Kopttike, destaca que a regulamentação seria positiva. Para ele, como o jogo existe mesmo sem liberação, os recursos obtidos por meio da prática alimentam o crime organizado de forma desordenada.

— Tira esse recurso da ilegalidade, arrecada imposto e cria normas. Podemos taxar e trazer esse dinheiro para a segurança pública.

A possibilidade de canalização dos tributos obtidos com os jogos de azar para ações de segurança, como querem governadores, está no projeto em tramitação na Câmara. Ainda assim, o texto não obriga o investimento, já que outras áreas também são citadas. (Zero Hora e GauchaZH – Mateus Ferraz – RBS Brasília)

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