“O longo período de proibição estigmatizou o jogo no Brasil”

Destaque I 20.03.20

Por: Elaine Silva

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Essa situação, segundo seu ponto de vista, se deve ao longo período de clandestinidade e à visão arcaica da bancada evangélica no Congresso

Em entrevista ao El Diario del Juego, o jornalista e presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal, Magnho José, disse que hoje não há indicadores que garantam que o jogo será legalizado e regulamentado no Brasil este ano. Ele também explicou que não é possível prever se a regulamentação das apostas esportivas será concluída em 2020. Além de qualquer especulação jornalística, ela só será avançada quando um dos dois projetos que está nas câmaras legislativas for aprovado.

Para o analista, o longo período de proibição estigmatizou o jogo no Brasil, na mesma faixa de aborto, casamento homoafetivo e drogas. “Enquanto o resto do mundo considera a indústria de jogos uma atividade econômica, boa parte da sociedade brasileira a considera uma questão de costumes”. Essa situação, segundo seu ponto de vista, se deve ao longo período de clandestinidade e à visão arcaica da bancada evangélica no Congresso. “A bancada cristã, especialmente os evangélicos, ainda se baseia em conceitos desatualizados e errôneos da década de 1990. Eles são baseados em estudos de professores americanos patrocinados por movimentos anti-jogo, para afirmar que a legalização dos jogos será um desastre para a sociedade, mas não percebem que acabam beneficiando os jogos clandestinos. O jogo no Brasil não começará com a legalização, porque ele já existe e é necessário que seja legalizado, regulamentado, controlado e determinado para que o cidadão fique protegido dos males do jogo ilegal”, alertou.

Cabe ressaltar que a bancada evangélica do Congresso Brasileiro, forte inimigo da legalização do jogo, representa 25% dos parlamentares e existem deputados no mesmo bloco favoráveis à legalização. “Uma parcela pequena e barulhenta de parlamentares evangélicos tem como bandeira a luta contra costumes populares, como o jogo, por isso quer impedir qualquer indício de jogo legal. No entanto, não há indicadores que garantam que eles impedirão sua legalização”.

No entanto, ele esclareceu que o Brasil precisa criar uma estrutura para lidar com o jogo patológico, porque, como o jogo é ilegal no país, não existem políticas públicas para proteger os jogadores patológicos.   “Mas se considerarmos que 1% da população tem algum tipo de problema com o jogo, o Brasil já tem milhões de brasileiros em risco e sem proteção do Estado. O verdadeiro desafio do jogo é a criação e o estabelecimento de leis e regulamentos, que permitam aos cidadãos exercer seu desejo de jogar sob o olhar atento das regras claramente definidas pelo Estado e sua aplicação efetiva”.

Apostas esportivas

No que diz respeito às apostas esportivas, que estão dando muito o que falar, Magnho afirmou que, para que operem de maneira eficaz, é necessário emitir o decreto regulatório, que está em fase de produção.

“A demora deve-se ao fato dos equívocos da legislação ao tratar apostas esportivas como modalidade lotérica, premiação inadequada e tributação errada e elevada. A lei, que legalizou a modalidade é mediana e terá que ser aperfeiçoada através de nova proposta legislativa junto ao Congresso Nacional. Caso contrário, as casas de apostas offshore vão continuar recebendo apostas dos brasileiros”.

O especialista esclareceu que a última minuta do decreto regulamentador publicado pela Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria do Ministério da Economia (SECAP) no dia 17 de fevereiro, juntamente com a terceira consulta pública, não continha os valores das licenças ou garantias. “Esses valores serão definidos no edital de concorrência, que será publicado depois que a SECAP coletar sugestões sobre a regulamentação das apostas esportivas. Além disso, ele não manterá os conceitos manifestados na minuta do decreto de regulamento disponibilizado pela SECAP no site do Ministério da Economia, então acho que não haverá nada concreto para este ano devido ao período de seis meses para entrada em vigor do regulamento”. A minuta que regula as apostas esportivas sugere um número ideal de 30 operadores. “É muito difícil saber o que essa quantidade significa, será o máximo ou o mínimo? Quais critérios ou estudos definiram essa quantidade?   Infelizmente, essas dúvidas só serão elucidadas após o período de consulta pública”, afirmou.

Cassinos em resorts

Quanto à legalização dos cassinos em resorts e ao estreito relacionamento de alguns funcionários do governo com o magnata Sheldon Adelson, Magnho considerou que as promessas do bilionário seduziram vários atores políticos no Brasil. “O CEO da Las Vegas Sands prometeu investimentos significativos se o Congresso brasileiro legalizar apenas alguns resorts integrados aos cassinos, como em Cingapura, porque ele diz que esse modelo é o melhor para o Brasil.   No entanto, para o jornalista, “isso é um grande absurdo que o magnata dos cassinos tenta vender aos congressistas brasileiros”. “Um dos principais argumentos da construção de cassinos em resorts é aumentar o fluxo de turistas para o Brasil, mas somente a legalização de cassinos integrados não aumentará o número de turistas estrangeiros, não gerará tantos empregos ou receitas esperadas pelo setor. Essa proposta não é boa para o Brasil, é apenas para o Las Vegas Sands”.

Ele acrescentou que a legalização dos Resorts Integrados poderá gerar uma forte crise na combalida ocupação dos hotéis atuais. “Os resorts integrados representariam milhares de quartos com hospedagens subsidiadas pela arrecadação dos jogos e os empresários dos hotéis no Rio de Janeiro, que já enfrentam uma grave crise de ocupação, estão iludidos pela possibilidade de impulsionar seus negócios com a legalização e instalação de resorts integrados com cassinos, conforme previsto na chamada Lei Sheldon Adelson”. Para ele, o melhor para o Brasil é a aprovação do marco regulatório que contempla a legalização de todas as modalidades, “porque é a melhor solução após um longo período de clandestinidade e pelo qual lutaremos incansavelmente”.

Nota do editor: a entrevista foi veiculada no dia 05 de março de 2020.

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