Bets requerem educação financeira e podem esvaziar geladeira dos brasileiros, diz presidente da CVM

O presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), João Pedro Nascimento, afirmou nesta quarta-feira (28), que o tema das bets é alarmante e que é preciso construir a consciência coletiva de que elas impõem risco aos mais vulneráveis.
“Tem uma agenda social aqui, porque os mais vulneráveis são os que mais se expõem a essas promessas de retorno fácil, típicas dos cassinos e dos jogos de azar. As bets não se comparam com o mercado de capitais, têm seu lugar como entretenimento”, disse ele na Conferência Anual do Santander, em São Paulo, registra reportagem do VALOR.
“É uma temática que remete à educação financeira, e que precisa de uma grande coordenação para evitar um mal maior às famílias brasileiras. Falam que as bets vão esvaziar o mercado de capitais, mas vão é esvaziar a geladeira do brasileiro.” Segundo ele é preciso criar consciência coletiva sobre o que é investimento e poupança.
Carlos André, vice-presidente do Santander e presidente da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), citou uma pesquisa que mostra que uma parcela da população que usa casas de apostas considera isso forma de investimento, o que, para ele, “acende o sinal amarelo.” E comentou que o comprometimento de renda com essas casas de apostas chega a 10%. “É muito importante uma ação coordenada entre CVM, Anbima e outras entidades. O próprio Banco Central e outros agentes estão preocupados.”
Já Gilson Finkelsztain, presidente da B3, afirmou que é preocupante que o brasileiro entenda as bets como investimento e lembrou da dificuldade de repressão a plataformas que oferecem falsas promessas de ganhos aos brasileiros, já que muitas vezes elas não estão no país.
“Precisamos saber como fazer para banir e tirar essas plataformas do ar e tirar algumas dessas ofertas da mão do investidor desavisado ou da população que acha que está investindo, mas na verdade está sendo lesada com o viés de entretenimento.”
Nota do editor do BNLData: Cinco anos e meio sem regulamentação
Devido ao crescimento acelerado e desregulado, setor enfrenta campanhas criticando o avanço das apostas no cotidiano dos brasileiros. A maioria das críticas negativas são provocadas pela ausência de regulação e poderão ser mitigadas com a entrada em vigor das normativas em 1º de janeiro de 2025
Na verdade, a origem dos problemas ou externalidades negativas da operação das apostas de quota fixa ou bets foi a letargia do governo federal em regulamentar as apostas e jogos online. A Lei 13.756/18, aprovada em dezembro de 2018 e que legalizou as apostas de quota fixa previu que o governo deveria regulamentar a legislação em até quatro anos. Devido à forte influência de pastores deputados junto a Jair Bolsonaro, o presidente conservador optou pela omissão e permitiu uma explosão da oferta de apostas e jogos online através de operações offshore baseadas em países onde a modalidade é regulada. Como as apostas estavam legalizadas, as principais plataformas do mundo passaram a operar offshore no Brasil e o mercado explodiu chegando a movimentar mais de R$ 150 bilhões (US$ 30 bilhões) de turnover, segundo levantamento do Instituto Brasileiro Jogo Legal – IJL e BNLData.
Logo após a posse, o atual governo através do Ministério da Fazenda teve que correr contra o relógio. O executivo enviou para o Congresso Nacional o projeto de lei 3626/23 para aperfeiçoar a Lei 13.758/18. Em dezembro de 2023, o Presidente Lula sancionou a Lei 14.790/2023, que criou tributação adequada para as empresas e apostadores, definiu regras para a exploração do serviço e determinou a partilha da arrecadação de apostas esportivas e jogos online.
Durante os seis primeiros meses de 2024, o Ministério da Fazenda editou em tempo recorde um conjunto de normativas para regulamentar a modalidade, que entrarão em vigor no dia 1º de janeiro de 2025, após o período de seis meses previstos na Lei 14.790/2023.
Os próximos quatro meses, até a entrada em vigor da regulamentação, serão ainda mais turbulentos.