Projeto que regulamenta jogos de azar deve ser votado até setembro, diz relator no Senado
O senador Irajá Abreu (PSD-TO), relator do projeto de lei que regulamenta os jogos de azar e apostas no país, afirmou que o texto que será discutido no Senado está “maduro” e ponto para ser votado. Ele disse estar confiante de que haverá votos suficientes para aprovação da matéria e que a votação deve ocorrer até setembro.
— A matéria está pronta, está madura. (…) Estou muito confiante de que temos os votos suficientes para aprovar essa matéria e entregar ao povo brasileiro um arcabouço, um ambiente novo de negócio, com regras claras e que possa convidar gente séria a atuar neste segmento que hoje está dominado e está sendo controlado pelo crime organizado — afirmou.
O senador participou do seminário “Desafios e regulamentação das bets e cassinos”, realizado pela Editora Globo com apoio do governo do Estado do Rio de Janeiro.
Ele discutiu o andamento do texto ao lado do ministro Celso Sabino; do presidente da Loterj, Hazenclever Lopes Cançado; e do presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal, Magnho José.
Votação nas próximas semanas
O projeto de lei 2234/2022 prevê o funcionamento de bingos e de cassinos no país e regulariza os jogos de azar, como o jogo do bicho. O texto foi aprovado no último dia 19 pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A proposta segue para análise do Senado.
O documento não contempla as chamadas ‘bets’, apostas esportivas on-line, cuja regulamentação já foi aprovada pela Câmara e sancionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em dezembro. As bets estão subordinadas à lei 14.790/23 que tributa empresas e apostadores e estabelece regras para a exploração do serviço.
Segundo o relator, a regulação dos jogos de azar e apostas é um tema inadiável dado que a atividade hoje funciona de forma clandestina e permite a atuação do crime organizado.
— Não podemos mais adiar esse enfrentamento, precisamos votar essa matéria. Conseguimos o convencimento da grande maioria dos senadores e senadoras da importância que essa agenda tem para o país — completou Abreu, durante o seminário.
O ministro do Turismo, Celso Sabino, espera que o texto seja votado nos próximos dias:
— Estamos querendo que vote esta semana. Se não, na outra — disse ele, em entrevista ao GLOBO após o painel.
O texto tem sido bem avaliado por representantes do setor de apostas. Magnho José Santos, do Instituto Brasileiro Jogo Legal, elogiou o projeto por contemplar não apenas os jogos de azar nos cassinos, mas também o jogo do bicho e os bingos. Sua entidade participou do desenho do texto durante reuniões temáticas em Brasília.
— O texto que está lá é muito bom. Aproveitar este momento para legalizar as outras verticais que hoje são atividades praticadas à margem da lei foi uma oportunidade grande. E o projeto prevê que parte dos recursos arrecadados sejam investidos no turismo. Isso será extremamente importante para a sociedade e para o país — frisou.
O dirigente também registrou que a origem dos problemas enfrentados pela operação das apostas esportivas foi a letargia do governo em regulamentar as apostas e jogos online. Segundo ele, a Lei 13.756/18, aprovada em dezembro de 2018 e que legalizou as apostas de quota fixa previu que o governo deveria regulamentar a legislação em até quatro anos. Devido à forte influência de dois pastores deputados junto a Jair Bolsonaro, o presidente conservador optou pela omissão e permitiu uma explosão da oferta de apostas e jogos online através de operações offshore baseadas em países onde a modalidade é regulada. Como as apostas estavam legalizadas, as principais plataformas do mundo passaram a operar offshore no Brasil e o mercado explodiu.
Contraventores que operam o jogo do bicho
O moderador Ascânio Seleme perguntou para o senador Irajá se os contraventores que operam hoje o jogo do bicho terão alguma vantagem com o mercado de jogos regulado ou serão alijados do processo.
O parlamentar comentou que a regulamentação será posterior a aprovação da lei e o Executivo é que definirá esse processo e que esse debate ficará para um segundo momento. Disse que qualquer processo licitatório deverá ser observado a fase de habilitação e com todo o rigor da lei fica praticamente impossível alguém que esteja funcionando de forma ilegal, clandestina ou mesmo o crime organizado se habilitar a operar no mercado formal.
O presidente do IJL interveio e comentou as experiências de outros mercados que ficaram muitos anos na mesma condição do Brasil.
— Naturalmente o banqueiro que operava na ilegalidade ele acaba migrando para o mercado regulado naturalmente para a operação regulada, mas aí ele vai ser obrigado a ter um CNPJ e modifica a relação dele com o Estado. Hoje ele está a margem, nas no futuro, cumpridas aas determinações da lei e da regulamentação nada impede que ele entre no processo – comentou.
Já Hazenclever Lopes Cançado, presidente da Loterj, destacou o protagonismo do Rio de Janeiro na atração de turistas e seu potencial para elevar a arrecadação do estado por meio dos jogos de azar e das apostas.
O presidente da Loterj lembrou que o estado do Rio se antecipou ao governo federal ao estabelecer normas para a operação de plataformas de apostas on-line. Agora, segundo ele, a entidade quer criar um centro de apoio psicológico voltado a jogadores viciados em apostas:
— Esse é um entretenimento milenar, mas que traz também danos à sociedade. E nós na Loterj, junto ao governo do estado, vamos implantar no Rio o primeiro centro de apoio psicológico a esses dependentes. Assim como o estado está sendo referência na legalização (das bets), queremos ser referência na questão do apoio psicológico.
Impacto na saúde mental
Especialistas, contudo, veem com cautela o processo de regulamentação dos jogos de azar no país. O jogo responsável foi o tópico da segunda mesa do seminário da Editora Globo, que debateu os cuidados com a saúde mental e financeira dos apostadores.
Anna Lucia Spear King, fundadora do Instituto Delete, teme impacto na saúde dos jogadores. Ela coordena o instituto pioneiro da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que atende usuários dependentes de jogos digitais e destacou os prejuízos físicos e emocionais causado pelo uso patológico de tecnologias.
Para a especialista, paralelamente à regulamentação dos jogos de azar, é preciso que o governo, o Congresso e a sociedade civil avancem nas orientações para uso responsável destes dispositivos. Contudo, segundo Anna Lucia, falta diálogo entre especialistas e o legislativo:
— Falta uma aproximação, uma formalização para que nós fizéssemos parte dessa confecção de normas, advertências e orientações. Isso faria com que esses jogos entrassem no mercado já respaldados por uma política pública e que resguardasse a pessoa que pode ser prejudicada e adoecer por conta de um jogo — afirmou.
Juliana Albuquerque, vice-presidente executiva do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), acrescentou que o atual contexto digital social torna desafiadora a regulação das publicidades de apostas e jogos de azar, o que exige maior adaptação:
— Precisamos buscar as melhores formas de impactar o consumidor e tornar compreensível o impacto (negativo dos jogos de azar). Este trabalho precisa ser feito ao lado da divulgação publicitária. (…) As regras à publicidade do álcool, por exemplo, foram introduzidas há muitos anos, num outro contexto. Houve uma mudança estrutural na comunicação. O desafio é como implementar as regras nesse sistema alterado. (Com informações do O Globo)