Governo proíbe cartão de crédito e cripto nas ‘bets’, prêmio terá de ser pago em 2 horas

Apostas I 18.04.24

Por: Magno José

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Apostas esportivas são legais no Brasil? Entenda como funciona a operação no país
Aposta só poderá ser feita por meio de Pix, TED, cartões de débito ou pré-pagos. Será necessário uma conta cadastrada na empresa que realiza o jogo ( Foto: Editoria de Arte/O Globo)

O governo definiu em portaria divulgada nesta quinta-feira a listagem de meios de pagamento das apostas on-line chamadas de “bets”, que estão em processo de regulamentação pelo Ministério da Fazenda. O cartão de crédito será proibido, revela reportagem do Globo Online, que ouviu especialistas e dirigentes do setor sobre a portaria de meio de pagamento.

O apostador só poderá pagar a aposta por meio de Pix, TED, cartões de débito ou cartões pré-pagos. Será necessário uma conta cadastrada na empresa que realiza o jogo. Não serão aceitos pagamentos por meio de dinheiro em espécie, cartão de crédito, boletos de pagamento, criptoativos, etc.

A portaria também proíbe pagamento de “qualquer outra forma alternativa de depósito que possa dificultar a identificação da origem dos recursos”. A proibição do cartão de crédito é citada pela Fazenda como uma “medida prudencial de desestímulo” ao endividamento das pessoas que realizam apostas.

De acordo com Pedro Porcaro, advogado da área de Sportainment do Madrona Fialho Advogados, a intenção do governo é que todos os pagamentos vinculados a bets sejam realizados entre contas em instituições financeiras reguladas pelo Banco Central.

O advogado Marcus Fonseca, sócio do TozziniFreire Advogados, afirma que existe uma preocupação do governo em prevenir a lavagem de dinheiro, daí a importância de se conhecer quem é o apostador e qual é a origem do recurso das apostas, o que não é possível quando o pagamento acontece por meio de criptomoedas, por exemplo.

Enquanto esse mercado ainda não é regulado no Brasil, o advogado considera natural que o governo impeça o uso de cripto em apostas online:

— A cripto ainda está para ser regulada pelo Banco Central. Ainda não se sabe como vai ser feita a prevenção à lavagem de dinheiro (nesse mercado). O Pix e o TED, por exemplo, são operacionalizados por instituições que já estão sujeitas à regulação.

Duas horas para receber o prêmio

Outra definição que consta na portaria é que o ganhador deverá receber valor do prêmio em até 120 minutos. O prazo é contado a partir do encerramento do evento de temática esportiva ou de uma sessão do evento virtual de jogo on-line objeto das apostas.

Em janeiro, um decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, oficializou a criação da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA), que ficará responsável por todo o processo de regulamentação, abrangendo as apostas esportivas chamadas de “bets”. A expectativa é terminar esse processo até o início do segundo semestre.

A Secretaria também é responsável por ações de prevenção à lavagem de dinheiro, assim como de monitoramento do mercado visando prevenir a compulsividade nos jogos e buscar a proteção de pessoas vulneráveis, especialmente menores. A fiscalização das ações de comunicação, de publicidade e de marketing também está prevista.

O Ministério da Fazenda anunciou um cronograma para regulamentar o mercado de prêmios e apostas on-line, que inclui a publicação de 11 portarias para a regulação do mercado, até o início do segundo semestre. Serão tratados diversos temas, desde o combate à lavagem de dinheiro a fraudes relacionadas à exploração comercial de apostas de quota fixa.

Haverá também, outro exemplo, um normativo de “ação sancionadora”, com procedimentos de aplicação de sanções administrativas na atividade de exploração comercial para as apostas de quota fixa.

Mercado

O Instituto Jogo Legal (IJL) estima que o mercado de apostas online no Brasil movimentou R$ 45 bilhões no ano passado.

No início de 2024, mais de 130 empresas manifestaram interesse no mercado brasileiro, número acima das expectativas do Ministério da Fazenda. Cerca de 298 sites já foram identificados em funcionamento no país, mas mais de um domínio pode pertencer a mesma empresa.

A lista traz companhias de grande porte, como a MGM Resorts, com sede em Las Vegas, nos Estados Unidos, e outras casas do Reino Unido, China, França, Portugal, além de uma grande quantidade de empresas sediadas em paraíso fiscal.

A lei que trata das apostas de quota fixa (quando se sabe qual valor do prêmio em caso de vitória na aposta) foi sancionada no fim do ano passado. O texto também taxa os ganhos dos apostadores e o faturamento das empresas. A arrecadação vai para áreas como saúde e segurança pública.

Com o mercado “totalmente regulado”, o Ministério da Fazenda diz que o potencial de arrecadação anual com as apostas esportivas on-line fica entre R$ 6 bilhões e R$ 12 bilhões.

– Esse mercado já existe há anos sem o governo ganhar nada com isso. E você tem um potencial muito grande de crescimento desse mercado, com a regulamentação, que coloca regras claras – avalia Leonardo Baptista, CEO e cofundador da Pay4Fun, instituição de pagamento que opera no setor de apostas,

O processo de regulamentação teve início em fevereiro, mês em que o assessor especial José Francisco Cimino Manssur foi exonerado do cargo a pedido. Ele esteve à frente das negociações com o Congresso e da criação de regras para esse mercado.

As portarias passam pelo crivo da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGNF), antes de serem publicadas. Há críticas internas sobre a demora na tramitação.

Pix é maioria

As medidas anunciadas pelo governo foram bem recebidas por representantes de casas de apostas e especialistas no tema, que avaliam que o veto a alguns meios de pagamento, por exemplo, busca prevenir o transtorno de jogo compulsivo.

— A proibição ao cartão de crédito traz a segurança de que o brasileiro não vai se endividar para apostar — resume André Gelfi, presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa empresas como Betfair, Bet365, SportingBet, Betano e outras.

Na ponta da linha, no entanto, o impacto é limitado. Estimativa do IJL mostra que aproximadamente 95% dos pagamentos realizados em plataformas de apostas online são por meio do Pix.

José Victor Valadares, diretor de negócios da Case de apostas Bet7k, diz que a grande maioria das empresas que atuam no Brasil tem apenas essa modalidade de pagamento.

Pagamento instantâneo

Já quanto ao prazo de 120 minutos para o pagamento dos lances em que o apostador saiu vencedor, os representantes das casas de apostas dizem que é importante ter uma regra comum ao segmento.

Atualmente, o apostador pode fazer lances envolvendo um volume elevado de recursos financeiros, mas ter o saque prorrogado a critério da empresa.

Ainda que a maior parte das casas de apostas normalmente já pague em menos de duas horas, o advogado Luiz Loques avalia que ter um limite de tempo é importante para que os ganhos do jogador não sejam represados.

Representantes das empresas dizem que já realizam o pagamento ao apostador “em instantes”:

— O prazo anunciado pelo governo é completamente justo. Em nossa plataforma, realizamos o pagamento com agilidade para que os jogadores possam usar o prêmio em instantes — conta Rafael Borges, Country Manager da Reals.

É o mesmo que diz Marcos Sabiá, CEO da galera.bet. Ele considera importante traçar limites comuns ao mercado, mas a realidade é que as empresas já realizam esses pagamentos em tempo bem inferior a duas horas.

Atualmente, as plataformas criam seus regramentos de forma individual, impulsionando certa disputa entre as empresas, que buscam conseguir pagar o consumidor o quanto antes.

Para o presidente do IJL, Magnho José, a mudança deve acabar excluindo operadoras menores do mercado, que encontram mais entraves operacionais para realizar pagamentos com rapidez.

— A normativa “subiu a régua”. As operadoras terão que buscar maior nível de desempenho e excelência, além de reservas financeiras para atender as exigências da portaria. A norma vai ajudar a eliminar os aventureiros — diz José.

Outro ponto importante da série de medidas anunciadas pelo governo é a implementação de uma reserva financeira no valor de R$ 5 milhões.

Cada operador de apostas deve manter um fundo como medida preventiva para garantir o pagamento de prêmios e demais valores aos apostadores, em caso de problemas de liquidez.

Fonseca afirma que o governo busca garantir que os recursos dos apostadores não sejam comprometidos em caso de saques elevados.

O documento ainda diz que os valores depositados pelos apostadores devem ser considerados patrimônio separado, ou seja, que não se confunde com os recursos do agente operador de apostas.

— O patrimônio separado já estava previsto e agora só está sendo replicado de novo na portaria. O que é recurso da empresa é dela e o que é recurso dos apostadores estaria segregado desse patrimônio — resume Fonseca.

A nova portaria prevê que devem ser estabelecidos mecanismos para mensurar e monitorar os riscos de liquidez aos quais estão submetidos os apostadores. Para Loques, isso poderia incluir, por exemplo, que a empresa garanta sua capacidade em arcar com as odds mais atrativas. Quanto maior a odd, mais dinheiro o apostador recebe se vencer o lance.

— Um mesmo lance pode ter odd menor em uma casa (ou seja, com prêmio menor para caso o resultado se concretize) do que em outra. O consumidor precisaria saber se a casa que oferece uma odd maior pode pagar essa aposta, para não correr o risco de não receber.

 

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