STF: decisão foi devido a questão processual
A decisão da ministra Cármen Lúcia em arquivar a Ação Cautelar ajuizada no STF pelas entidades esportivas Liga Nacional Futebol Sete Society e Parada Inglesa Futebol Society foi meramente processual. Não houve julgamento do mérito.
DECISÃO
AÇÃO CAUTELAR. INSTRUMENTO PROCESSUAL ACESSÓRIO. AÇÃO PRINCIPAL JURIDICAMENTE INVIÁVEL. AÇÃO CAUTELAR À QUAL SE NEGA SEGUIMENTO.
Relatório
1. Ação cautelar, com pedido de medida liminar, proposta por Parada Inglesa Futebol Society e Liga Nacional Futebol Sete Society contra o Presidente do Congresso Nacional.
O caso
2. As Requerentes alegam que são entidades de prática e administração do desporto na modalidade Football Society e sem fins lucrativos.
Sustentam que:
“Nos últimos anos [estão] enfrentando grandes dificuldades financeiras para desenvolver nossas atividades esportivas, pois uma das fontes mais importante de recursos, era a atividade de bingo, como previam os artigos 59º ao 81º da Lei nº. 9.615/98 (Lei Pelé), por uma interpretação equivocada das autoridades competentes quanto ao artigo nº. 2º da Lei nº 9.981/00 (Lei Maguito), que os bingos estariam proibidos de funcionar a partir de 31/12/2.001, como vamos demonstrar a seguir esta Lei nº 9.981/00 nunca teve a intenção de proibir a atividade de exploração de bingos, e sim regulamentar a atividade em lei específica para o bingo, separando esta atividade da Lei nº. 9.615/98.
Na Comissão Mista Especial, do Congresso Nacional convocada para analisar a Medida Provisória nº. 1.926/99, e suas posteriores reedições, nas Atas das 20 Reuniões, mostram claramente que a intenção dos parlamentares era de desvincular os jogos de bingo, da lei que regulamentava o esporte, por isso a Comissão Mista Especial
As Requerentes elencam uma série de atos normativos e transcrevem vários trechos de reuniões realizadas no Congresso Nacional e de decisões judiciais sobre o tema (40 laudas).
Defendem o preenchimento dos requisitos para o deferimento da medida liminar nos seguintes termos:
“A presença da fumaça do bom direito consiste na legalidade da exploração do jogo de bingo, tendo em vista que essa atividade é explorada em território nacional desde 1.993 com amparo na Lei nº 8.672/93 (Lei Zico) e posteriormente pela Lei nº. 9.615/98 (Lei Pelé), na ausência de norma legal que proíba expressamente a atividade ‘in casu’, na ofensa aos princípios consagrados na Carta Magna.
O princípio da livre iniciativa previsto pela Constituição Federal prescreve que: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, e não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, a lei não prejudicará o direito adquirido.
(…)
O perigo da demora também está presente ao caso e consiste que, caso não seja concedida a liminar, a requerente não poderá exercer mais sua atividade, disciplinada pelo art. 59 da Lei nº. 9.615/98 em sua original redação.
(…)
Não pode a requerente aguardar até o julgamento final da presente demanda com os seus estabelecimentos de jogos de bingo fechados, pois a mesma não terá como manter a entidade desportiva em funcionamento sem que possa angariar fundos desde já, o que lhe ocasionará danos imediatos e irreparáveis. ”
As Requerentes pedem, em resumo, o deferimento de medida liminar para que seja suprida a omissão do Requerido e concedida a autorização para explorarem o jogo do bingo, além da determinação para que a União, os Estados e Municípios, e suas respectivas polícias, se abstenham de praticar qualquer ato que impossibilite a exploração do bingo.
Requerem a decretação de tramitação do feito em segredo de justiça, por “se tratar de assunto polêmico”.
As Requerentes informam, ainda, “que será proposta no prazo legal (
Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO.
3. As Requerentes não apresentaram argumentos suficientes para justificar a decretação de tramitação da ação em segredo de justiça, não bastando a afirmação de que o assunto seria polêmico, razão pela qual indefiro o pedido.
4. A ação cautelar é manifestamente incabível.
Nos termos do art. 796 do Código de Processo Civil, “o procedimento cautelar pode ser instaurado antes ou no curso do processo principal e deste é sempre dependente”.
Por se tratar de instrumento processual acessório, a ação cautelar preparatória depende sempre da viabilidade da ação principal.
As Requerentes pretendem propor ação declaratória para obrigação de fazer e não fazer contra o Presidente do Congresso Nacional. Todavia, não há previsão constitucional de competência originária deste Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar toda e qualquer ação proposta contra o Presidente do Congresso Nacional, a não ser nas situações previstas nas alíneas b e d do inc. I do art. 102 da Constituição da República, não sendo o caso dos autos.
5. Este Supremo Tribunal Federal não conhece de ações cautelares preparatórias de outras ações que não configuram uma das hipóteses de competência originária previstas na Constituição da Republica, conforme decisão proferida na Ação Cautelar 349, Relator o Ministro Ayres Britto, Tribunal Pleno, DJ 23.9.2005:
“CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. PROCESSOS OBJETIVO E SUBJETIVO. EXCEÇÕES INDIVIDUAIS DE SUSPEIÇÃO CONTRA DESEMBARGADORES DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA PERANTE O QUAL FOI AJUIZADA REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI ESTADUAL Nº 8.033/2003, TAMBÉM IMPUGNADA PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, NA ADI 3.151. MEDIDA CAUTELR PARA SUSPENDER A EFICÁCIA DA REFERIDA LEI ATÉ O JULGAMENTO DA REPRESENTAÇÃO OU DAS EXCEÇÕES.
Nesta Suprema Corte, a ADI 3.151 tramita sob o impulso do art. 12 da Lei nº 9.868/99. Descabimento da medida cautelar porque as exceções de suspeição representam um instituto típico do processo subjetivo, que não se aplica às ações diretas de inconstitucionalidade, pela sua natureza objetiva.
Ademais, a maioria dos Desembargadores repeliu a pecha que lhes endereçou a excipiente, mas as exceções ainda não foram julgadas. Sendo assim, a competência originária desta coleda Corte para apreciar a questão de direito material, alojada nos autos da cautelar, somente será estabelecida se – e quando – o Supremo Tribunal acolher as referidas exceções. Precedentes. Não conhecimento do pedido cautelar.” (grifos nossos).
Não sendo plausíveis juridicamente as razões apresentadas quanto a uma eventual ação principal que venha a ser proposta pelas Requerentes, e, ainda, não se tendo como vislumbrar a competência deste Supremo Tribunal Federal, naquele caso, impede que se dê seguimento regular a esta ação cautelar que, sendo acessória, daquela depende.
6. Pelo exposto, nego seguimento à ação cautelar (art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), ficando prejudicado o pedido de medida liminar.
Publique-se.
Arquive-se.
Brasília, 10 de agosto de 2010.
Ministra CÁRMEN LÚCIA
Relatora
(DJE nº 152, divulgado em 17/08/2010)