PGR defende que STF proíba atuação nacional de bets autorizadas pela LOTERJ

Loteria I 28.10.24

Por: Magno José

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No mesmo dia da apresentação do parecer da Procuradoria-Geral da República, a Loteria do Estado do Rio de Janeiro protocolou pedido de impugnação e indicou questões que precisam ser necessariamente enfrentadas pelo ministro relator Edson Fachin

A Procuradoria-Geral da República – PGR apresentou na última sexta-feira (25), no Supremo Tribunal Federal (STF), petição na Ação Cível Originária (ACO 3696) ajuizada pela Advocacia-Geral da União (AGU) com o objetivo de proibir a Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj) de autorizar casas de apostas esportivas online em âmbito nacional. A ação da AGU pede concessão de liminar para que a proibição de exploração da atividade fora do Rio de Janeiro cesse imediatamente. A relatoria da ACO 3696 é do ministro Edson Fachin.

A petição assinada pelo Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, registra que a União sustentou que o descumprimento do parâmetro da territorialidade impacta diretamente na exploração da atividade de loteria de apostas de quota fixa por agentes autorizados pela União (âmbito nacional) e por outros entes federados (em seus respectivos territórios).

A LOTERJ, em manifestação complementar, ressaltou a recente decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 1.323 da Repercussão Geral, em que se fixou a tese de que a execução do serviço público de loteria por agentes privados depende de delegação estatal precedida de licitação. Argumentou que a União permite a exploração do serviço público de loteria a particulares sem prévia licitação, ao passo que a LOTERJ credencia as pessoas jurídicas interessadas após rigoroso procedimento licitatório.

A União apresentou manifestação, reforçando a existência de conflito federativo diante da flexibilização do parâmetro de territorialidade e da usurpação da competência material e legislativa privativa da União. Pontuou que os Estados do Paraná, Maranhão e Minas Gerais encaminharam manifestação ao Ministério da Fazenda relatando a ilegalidade praticada pela LOTERJ e o impacto nas loterias estaduais. Reiterou a assertiva de que a LOTERJ não instituiu mecanismos de combate à lavagem de dinheiro.

Gonet defende que a “admissão de apostas que sejam consideradas efetivadas no Estado, embora realizadas por apostadores que não estejam fisicamente no Rio de Janeiro, é uma forma de extrapolação da competência material do Estado, bem como da limitação da base geográfica que o legislador impôs à atuação de empresas dispostas a atuar no ramo das loterias”.

“De todo modo, a limitação territorial da exploração das loterias pelos Estados não é novidade do caput do art. 35 Lei n. 13.756/2018, com a redação da Lei n. 14.790, de 29 de dezembro de 2023. O §1º do art. 2º do Decreto-Lei n. 6.259/1944 desde há muito estabelece que as loterias estaduais ficarão adstritas aos limites do Estado respectivo”, registra o Procurador-Geral.

Paulo Gonet defende que o “reconhecimento de direito adquirido à exploração da atividade fora dos limites territoriais do Estado do Rio de Janeiro a pessoa jurídica credenciada junto à LOTERJ – e não junto ao Ministério da Fazenda – tem potencial de gerar desarmonia federativa, diante das ponderações da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda na Nota Técnica SEI n. 2994/2024/MF, citada pela União”.

Ao final da petição, o procurador registra que “verifica-se a existência de elementos que evidenciam a probabilidade do direito para a concessão das medidas liminares pleiteadas pela União, inaudita altera parte. O perigo de dano decorre, por sua vez, do impacto na harmonia federativa que é gerado pela atuação, em todo território nacional, de bets credenciadas apenas pela LOTERJ”.

LOTERJ contesta no STF ação da AGU contra atuação nacional das empresas autorizadas

LOTERJ defende atuação nacional de suas autorizações

Na própria sexta-feira, a Loteria do Estado do Rio de Janeiro – LOTERJ protocolou pedido de impugnação do parecer preliminar da PGR e “reiterar razões essenciais à impugnação do pedido liminar formulado e indicar questões que precisam ser necessariamente enfrentadas” pelo ministro relator Edson Fachin.

A LOTERJ cita na abertura do pedido de impugnação a falta de interesse de agir devido a omissão da União e da PGR acerca do regime de flagrante inconstitucionalidade da sua operação/exploração federal.

“Chama atenção o eloquente silêncio da União e da PGR em relação ao FATO amplamente já ventilado e apresentado nestes autos de que ATÉ A PRESENTE DATA NÃO FOI EXPEDIDA UMA ÚNICA AUTORIZAÇÃO FEDERAL, muito menos precedida de licitação como determina o Tema 1323 (Repercussão Geral) de observância obrigatória, tampouco concluída pela SPA/MF qualquer etapa de aferição de condições jurídicas, técnicas, econômico-financeiras ou de idoneidade dos seus operadores”, acusa.

A Autarquia registra que nenhuma licença foi concedida ao nível federal e nenhum real tenha sido arrecadado a título de outorga fixa ou variável pela União, apesar da “ampla e profusamente difundida a “lista nacional” de empresas “autorizadas” a operar em todo país, até o final do ano e durante o chamado “período de adequação””.

“Com todas as vênias, não se compreende como é possível que a União fale em riscos a “compromissos legais e transnacionais de prevenção à lavagem de dinheiro” por parte de licenças estaduais da LOTERJ, sendo que ela própria (União), em manifesto estado inconstitucional de coisas, tem fomentado exploração offshore e impassível de fiscalização ou tributação por mais de duas centenas de sites e marcas de Bets”, comenta.

A LOTERJ registra que beira o absurdo o pedido de liminar contra uma operação regular e licitada de credenciados perante autarquia estadual enquanto, simultaneamente, há uma tolerância ou leniência generalizada com operações offshore e a partir de paraísos fiscais, em detrimento de todo e qualquer interesse público possível.

“Sem credenciar uma única empresa a nível federal, quer a União obstar a exploração dos mesmos serviços a nível estadual pela LOTERJ, e todas as suas credenciadas que se submeteram à rigoroso procedimento licitatório, empresas brasileiras, vinculadas a um único meio de pagamento também previamente licitado e em operação no Brasil, as únicas empresas que atualmente arrecadam tributos no país, inclusive federais”, reclama a Autarquia.

A LOTERJ também reclama que a Ação Civil Originária da União foi ajuizada indevidamente para manipular a jurisdição do STF e subverter as competências jurisdicionais ordinárias devido ao Mandado de Segurança ajuizado pela Autarquia contra o Secretário de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, que atualmente tramita na 8ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, a fim de resguardar o direito líquido e certo previsto na lei 13.756/2018 para assegurar a validade do Edital de Credenciamento, com a preservação dos credenciamentos.

A petição destaca que o pedido liminar ofende o direito dos apostadores domiciliados no Estado e cerceados pela trava geral e ampla de oferta do site na internet.

“Existe, pois, um critério legal geral (afora a regra de aplicação da lei no tempo) que ASSEGURA a dois públicos o acesso incondicional aos serviços lotéricos estaduais em ambiente virtual: (1) às pessoas “fisicamente localizadas” no Estado; e (2) aos DOMICILIADOS no Estado (os quais, a seu turno, PODERÃO OU NÃO ESTAR “FISICAMENTE LOCALIZADOS” NAQUELE TERRITÓRIO, mas sempre manterão o direito ao uso das loterias estaduais ainda que em trânsito, ou temporariamente deslocados)”, defende.

A Loteria do Estado do Rio de Janeiro também registra a o risco a ofensa à segurança jurídica já que os termos de credenciamento assinados e vigentes com operadores estaduais não podem ser liminarmente alterados, sob pena de prejuízo econômico incalculável, insegurança jurídica e violação à Lei nº 8.437/1992.

“A LOTERJ tem termos de credenciamento assinados com operadores credenciados desde MAIO/2023; e a eventual “alteração” dos termos desses contratos, firmados no âmbito de credenciamento público regido por edital e pela Lei nº 8.666/1993, enseja direitos e reparações a esses particulares, consubstanciando risco significativo de passivos financeiros para a Autarquia e, eventualmente, o próprio Estado”, registra.

A Autarquia relata também a existência mecanismos de controle e que não haveria nenhuma razão para o reconhecimento de que há uma ameaça de dano irreparável a um direito, justificando uma solução imediata e provisória exclusivamente em virtude da discussão sobre a trava de geolocalização em razão dos diversos outros controles que existem no procedimento LOTERJ.

“A LOTERJ incorporou o mesmo critério de controle de territorialidade aplicado ao e-commerce, instituído a nível federal pela Lei Complementar nº. 116/2003. Também encontra respaldo nas diretrizes indicadas pela Lei nº. 14.129/21 com os princípios, regras e instrumentos para o Governo Digital e para o aumento da eficiência pública, conforme presunção de boa-fé dos usuários, no artigo 3º, inciso XV: “Art. 3º São princípios e diretrizes do Governo Digital e da eficiência pública: XV – a presunção de boa-fé do usuário dos serviços públicos””.

A petição também defende sobre a acusação da União, que a operação de bets do Rio de Janeiro não teria mecanismos para evitar a lavagem de dinheiro pelos operadores licenciados.

“Nos seus editais, a LOTERJ exige que as empresas participantes do credenciamento apresentem declarações atestando que: (i) adotam todos os procedimentos e práticas internas de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo, conforme exigido pela Circular nº 3.978/20 do Banco Central do Brasil (BACEN), em conformidade com a Lei nº 9.613/98; (ii) adotam ações de cumprimento das políticas de jogos responsáveis, de acordo com as normas aplicáveis e os padrões internacionais da World Lottery Association (WLA); (iii) possuem Sistema de Atendimento ao Cliente disponível 24 horas por dia, 7 dias por semana; (iv) implementam um programa de Jogo Responsável; (v) observam as disposições da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei nº 13.709/2018) no tratamento de dados pessoais e sensíveis, com a adoção de uma política de proteção de dados e privacidade dos clientes dos produtos lotéricos credenciados pela LOTERJ; e (vi) implementam um ‘Programa de Integridade’ em conformidade com a legislação vigente, ou similar”, defende.

Ao final da petição a Loteria do Estado do Rio de Janeiro pede:

(i) O recebimento e a consideração desta manifestação;

(ii) A prévia determinação de citação e regular intimação do Estado do Rio de Janeiro, antes de qualquer apreciação do pedido liminar da União;

(iii) Em qualquer caso, a consideração e o enfrentamento, por este Exmo. Relator, das relevantíssimas questões sumariadas nesta peça por ocasião da eventual apreciação do pedido liminar da União, quais sejam:

⇒ FALTA DE INTERESSE DE AGIR: omissão da União e da PGR acerca do regime de flagrante inconstitucionalidade da sua operação/exploração federal.

⇒ DESCABIMENTO DA AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA: ajuizamento indevido de Ação Constitucional pela União para manipular a jurisdição do Supremo Tribunal Federal e subverter as competências jurisdicionais ordinárias.

⇒ PEDIDO LIMINAR OFENDE A PRÓPRIA REGRA GERAL DO § 4º DO ART. 35-A: direito dos apostadores domiciliados no Estado e cerceados pela trava geral e ampla de oferta do site na internet, conferindo a solução jurídica adequada para viabilizar a comercialização às pessoas DOMICILIADAS.

⇒ RISCO DE DANO INVERSO E OFENSA À SEGURANÇA JURÍDICA: termos de credenciamento assinados e vigentes com operadores estaduais não podem ser liminarmente alterados, sob pena de prejuízo econômico incalculável, insegurança jurídica e violação à Lei nº 8.437/1992.

⇒ EXISTÊNCIA MECANISMOS DE CONTROLE DA LOTERJ: nenhuma razão haveria para o reconhecimento de periculum in mora exclusivamente em virtude da discussão sobre a trava de geolocalização em razão dos diversos outros controles que existem no procedimento LOTERJ.

⇒ SOB A ÓTICA DOS SUPOSTOS RISCOS DE LAVAGEM DE DINHEIRO, OCULTAÇÃO DE PATRIMÔNIO E REPRESSÃO AO TERRORISMO: absurdidade dos argumentos fortuitamente lançados e manipulados pela União.

(iv) Na remota hipótese de concessão de antecipação de tutela nesta ACO manifestamente incabível e carente de interesse de agir da União, a modulação ou limitação ex nunc de quaisquer efeitos, sem que se atinjam, liminarmente, os estatutos jurídicos e fáticos-operacionais das operações credenciadas e regulares já em curso, conforme termos de referência e contratos assinados por esta autarquia.

Confira a petição da Procuradoria-Geral da República

Confira a petição da Loteria do Estado do Rio de Janeiro – LOTERJ

 

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