Jogada de risco – as apostas online no Brasil
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O mercado das bets no Brasil e as regras que agora passam a valer são o tema do próximo episódio do ‘Caminhos da Reportagem: Jogada de risco – as apostas online no Brasil’, que vai ao ar na segunda-feira (16), às 23h, na TV Brasil.
“Começou como diversão. Mas depois eu estava jogando todos os dias e as perdas foram se acumulando até chegar a um patamar de quase R$ 2 milhões”, confessa um empresário que agora faz tratamento contra a dependência de jogos. “Eu tinha por volta de uns R$ 5 mil na minha conta, dinheiro do meu trabalho e comecei a colocar na plataforma. Eu perdi em segundos”, conta uma cirurgiã dentista, que tenta parar e não consegue. Histórias de pessoas que preferem o anonimato pela vergonha da compulsão em jogos de aposta.
Os relatos chocam, mas estão se tornando mais comuns. No Ambulatório do Jogo (PRO-AMJO), do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), criado pelo psiquiatra Hermano Tavares, já se nota os aumentos dos casos. “Estamos vivendo uma epidemia de azar causada pela liberação atabalhoada de uma legislação incompleta que viabilizou a aposta online, mas não criou a regulação e as limitações necessárias para impedir que isso cause mais danos à nossa sociedade”, afirma.
Uma das estratégias usadas até agora por empresas foi a de investir em influenciadores digitais para atrair a atenção do público. O advogado Cícero Goulart, especialista em direito digital, moveu a primeira ação judicial no país contra esse tipo de celebridade online. “Nós tínhamos ali pessoas famosas que induziam a quem estava os assistindo a jogarem, dando a certeza de ganho pros seus seguidores”, explica.
Para o diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), organização que reúne empresas que dominam 75% do mercado de apostas no país, esse tipo de publicidade vai ser mais difícil de acontecer a partir de 2025. “ A gente entende que menor de idade, falsas promessas, influências prometendo mundos e fundos, se isso seguir acontecendo, isso vai ter suas consequências e a tendência é que isso diminua ao longo do próximo ano”, garante.
Regras claras
Em 2018, as apostas online no país, as bets, foram autorizadas pela lei 13.756. A regulamentação deveria ser feita em até quatro anos, mas não ocorreu. Em 2023, o presidente Lula editou as regras na Lei das Bets, e passa a valer a partir de 2025. Antes, não houve regras para o mercado. “Aí, colaborou muito 4 anos de governo Bolsonaro, isso foi um desastre, sob qualquer aspecto que você olhe. Foi uma renúncia fiscal do que se calcula de R$ 5 bilhões por ano. Isto é um crime”, afirma o jornalista esportivo Juca Kfouri.
Por ano, o Banco Central calcula que os sites de apostas esportivas movimentam de R$ 18 bilhões a R$ 21 bilhões por mês. “Os 12% que vão ser cobrados agora, não foram cobrados no governo anterior”, explica Giovanni Rocco Neto, secretário nacional de Apostas Esportivas e Desenvolvimento Econômico do Ministério do Esporte.
Enquanto o governo deixou de arrecadar, no futebol a história foi diferente. Os sites de apostas online dominaram os patrocínios dos campeonatos e times brasileiros. Na série A do Campeonato Brasileiro, dos 20 clubes, apenas 1 não tem nenhum tipo de patrocínio de bets. O investimento teve retorno: algumas casas de apostas tiveram um aumento de mais de 400% de acessos após fechar contrato com times do Brasileirão, segundo o site Aposta Legal Brasil.
O aumento das apostas teve impacto no consumo. A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) fez um levantamento após suspeitar que apesar da economia do país ter melhorado, isso não se refletiu nas vendas. “O grande susto foi na inadimplência das famílias, com mais de 1 milhão de brasileiros se tornando inadimplentes por conta das apostas”, conta o economista-chefe da CNC, Felipe Tavares.
Mas o que ninguém ainda havia observado até então era o impacto entre pessoas que recebiam benefícios sociais, como o Bolsa Família. O Banco Central constatou que, apenas em agosto de 2024, 5 milhões (24%) dos beneficiários do Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em apostas online. O levantamento foi feito a pedido da CPI da Bets, a comissão parlamentar de inquérito que investiga as apostas online no Congresso Nacional.
Outro dado que chama a atenção: a geração Z, ou seja, jovens entre 16 e 17 anos, foram os que mais apostaram – 29% dos entrevistados de uma pesquisa feita pelo Datafolha, a pedido da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA). A aproximação desse público é perceptível nas escolas. “Não tem como um adolescente que está mergulhado nas plataformas digitais não saber o que que tá acontecendo e a gente vê que muitos acabam entrando e testando”, confirma Vitor Rios Valdez, diretor do Centro Educacional do Lago, escola pública de Brasília.