Levantamento revela conexões da máfia das apostas
A Operação Penalidade Máxima identificou envolvimento de 72 pessoas com a máfia das apostas que manipulou partidas do futebol brasileiro, aponta um levantamento feito pelo GLOBO com base na análise das quase 3 mil páginas da investigação. Até agora, foram descobertas conexões de 43 atletas — 60% do total de investigados — com o esquema. Os dados também revelam múltiplas conexões da quadrilha que ainda não foram desvendadas pelo Ministério Público de Goiás (MP-GO): apenas nove dos 21 apostadores, financiadores e membros do núcleo administrativo mencionados nas conversas obtidas pelos investigadores foram denunciados e viraram réus. Três já prestaram depoimentos e são alvo da nova etapa da investigação. Outros nove sequer foram formalmente identificados.
O levantamento deu origem a um mapa interativo sobre o escândalo das apostas, disponível no site do GLOBO. Na ferramenta, os leitores podem conferir quem são todos os envolvidos, qual a atuação de cada um, suas situações jurídicas e, no caso dos jogadores, as punições desportivas sofridas. Os novos dados complementam o guia interativo de todos os 35 jogos sob suspeita, também no ar.
Entre os integrantes ainda não identificados há quatro membros do “Frota Bet”, grupo de WhatsApp usado por Bruno Lopez, o BL (apontado pelo MP-GO como chefe da quadrilha), para captar dinheiro para as apostas. Do chat, foram extraídas grande parte das provas usadas na última fase da operação, como listas de jogadores envolvidos e comprovantes de pagamentos feitos aos atletas. Além de BL, participavam das conversas quatro dos mais ativos financiadores da quadrilha, nomeados no aplicativo como João Vitor P., Leo Cunha, Victor Coimbra e Guilherme Alpino — todos usavam números de celular cadastrados em São Paulo.
Esses integrantes movimentavam quantidades consideráveis de dinheiro semanalmente para que BL conseguisse fazer as “operações” — como o grupo chamava os acordos prévios com os jogadores. No dia 9 de setembro de 2022, por exemplo, o quarteto de financiadores conseguiu juntar R$ 40 mil para pagar adiantamentos aos atletas. “Aqui é papo reto, já chega os 40 aí”, avisou Victor Coimbra a BL. Por outro lado, o lucro proveniente das apostas era dividido entre esses financiadores, o chefe do bando e uma parte era separada para pagar as dívidas contraídas com os atletas.
A relação entre o chefe do bando e os financiadores, no entanto, nem sempre era amistosa. No fim de novembro, quando o grupo teve prejuízo numa das rodadas do Brasileirão, o homem identificado como Guilherme Alpino pressionou BL para que ele devolvesse o dinheiro investido: “Nós só quer nosso dinheiro de volta, já perdemos muito aí, não dá pra esperar mais não (sic)”.
Jogadores banidos
Outro núcleo da quadrilha que está na mira do MPGO para a próxima fase da operação é o de intermediadores. O levantamento aponta que, ao todo, oito empresários, agentes e amigos de jogadores negociavam com a quadrilha em nome dos atletas. No entanto, somente um deles virou réu: o empresário Pedro Gama Junior, amigo do zagueiro Victor Ramos, acusado de ter negociado com os apostadores um pagamento de R$ 100 mil para que Ramos cometesse um pênalti. Os outros sete são tratados como suspeitos, sendo que três ainda não tiveram seus nomes descobertos.
Um dos intermediadores que ainda não foi formalmente identificado é Ramon RJ, integrante de outro grupo de WhatsApp com BL, o “Boa”. As conversas entre os dois mostram que Ramon é responsável por indicar jogadores para o bando. Em fevereiro deste ano, ele chegou a cobrar de BL uma comissão de R$ 2 mil por ter intermediado a entrada de um atleta no esquema: “Quem tá a semana toda fazendo o corre? Quem arrumou e fechou fui eu (sic)”.
Entre os 43 jogadores já identificados na investigação, 15 são réus na Justiça de Goiás e oito fizeram acordo com o MP-GO, admitiram os crimes e são testemunhas no processo. Outros 20 atletas foram citados em conversas dos apostadores ou tiveram diálogos com integrantes da quadrilha encontrados em celulares apreendidos e são investigados. Um deles é o zagueiro Didi, atualmente no Avaí. Mensagens revelam que Didi não só sabia das apostas ilegais como também tentou cooptar um jogador para a quadrilha e chegou até a apostar numa combinação previamente ajustada pelo grupo.
Como não tem pendências na Justiça Comum nem na Desportiva, Didi segue treinando e jogando normalmente, assim como outros 19 jogadores mencionados na investigação. Quatro foram banidos do futebol — Ygor Catatau, Romário, Gabriel Tota e Matheus Phillipe — e outros dez receberam penas de suspensão por períodos que vão de 12 jogos a mil dias. Sete tiveram contratos rescindidos.