Opinião: Cresce no Senado o lobby para manter o jogo na ilegalidade

Destaque, Opinião I 15.05.24

Por: Magno José

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Medida Provisória de apostas esportivas deverá caducar e o conteúdo da proposta será aproveitado pelo PL 3.626/23
Parte da resistência ao PL 2234/21 deve-se ao fato dos senadores estarem acreditando nas informações preconceituosas e dados sem nenhuma evidência acadêmica ou científica

O poderoso lobby para manter o jogo na ilegalidade está cada vez mais fortalecido com a união entre conservadores e religiosos, liderados pelo senador Eduardo Girão (NOVO-CE).

A votação do PL 2234/22, que autoriza o funcionamento de cassinos, bingos, jogo do bicho e jogo online, prevista para a reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desta quarta-feira (15) foi amplamente debatida durante a Ordem do Dia da sessão desta terça-feira (14) do Senado.

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) apesentou requerimento em plenário para que o PL 2.234/22 seja analisado além da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), nas comissões de Assuntos Econômicos (CAE); de Assuntos Sociais (CAS); e de Segurança Pública (CSP) do Senado. O requerimento não chegou a ser votado, mas a parlamentar informou que a proposta já conta com 40 assinaturas. O pedido da parlamentar deverá voltar a pauta da sessão plenária desta quarta-feira e com chances de ser aprovado.

Parte da resistência ao PL 2234/21 deve-se ao fato dos senadores estarem acreditando nas informações preconceituosas e dados sem nenhuma evidência acadêmica ou científica apresentados pelo senador Eduardo Girão.

Contrário à legalização da atividade, o parlamentar cearense usa questões de ordem religiosa, ideológica e moral para contaminar e distorcer o debate, aliado ao desconhecimento sobre o tema, gerando entre os parlamentares a percepção que os jogos são usados para lavagem de dinheiro, que aumentam a patologia e que não são controláveis.

“Esse projeto é uma grande preocupação para o Brasil. A gente até o coloca como um verdadeiro estatuto da jogatina no Brasil. Os dados do Girão, são estarrecedores. Nós temos, por exemplo, nos Estados Unidos, estados que têm uma liberação ampla, da mesma forma como tenta se implantar no Brasil. E os números… Vejam, por exemplo, uma universidade americana, que é a Universidade Baylor, no Texas. Ela diz o seguinte: para cada dólar – para cada dólar; não são dez, ou vinte, ou trinta dólares -, para apenas um dólar que entra resultante de jogos, lá nos Estados Unidos, o impacto é extremamente agressivo nas áreas da segurança pública, da saúde mental, da previdência social. Ou seja, a justificativa de que vamos fazer uma arrecadação não se sustenta, porque lá na frente o resultado é na área da saúde pública, é na área da segurança pública; é entrar por um lado e sair em grande quantidade por outro lado, trazendo prejuízos graves, sobretudo para a nossa juventude brasileira”, disse a senadora Eliziane Gama.

Nota sobre a regra 3:1

Na verdade, este discurso do senador Eduardo Girão se baseia nas teses equivocadas do livro da década de 90 “Gambling in America – Costs and Benefits”, de autoria do professor de Economia, Earl Grinols que para cada dólar arrecadado com os jogos, três são gastos com problemas sociais. Esta teoria é uma bobagem e desonesta, pois não há evidência sobre a regra 3:1. “Se fossem verdadeiras, as grandes nações já teriam banidos os jogos do seu sistema jurídico. Os especialistas que criaram esta e outras ‘evidências’ foram financiados nos anos 90 por igrejas e movimentos anti-jogo dos EUA”, comentou um professo da Universidade de Las Vegas com o BNLData.

Outra tese sem comprovação do parlamentar e repetida pela senadora Eliziane Gama é que “uma média de até 5% dessas pessoas que são viciadas recorrem ao suicídio. Entre 13% e 20% realmente tentaram, ou conseguiram se matar; ou seja, o viciado em jogos automaticamente é uma pessoa que sofre de problemas mentais graves, tendo que ter um apoio na área médica”.

Além do senador Eduardo Girão (Novo-CE), as senadoras Damares Alves (Republicanos-DF), Leila Barros (PDT-DF), Zenaide Maia (PSD-RN) e os senadores Cleitinho (Republicanos-MG) e Carlos Viana (Podemos-MG) atuaram para que a votação do PL 2234/22 na CCJ fosse adiada e o debate ampliado para além da CCJ), também na CAE, CAS e CSP.

Lobby da ilegalidade ganha reforço do Pastor Malafaia

Nesta terça-feira (14), o lobby para manter o jogo na ilegalidade ganhou o reforço do pastor Silas Malafaia, que alertou que a Comissão de Constituição de Justiça (CCJ) no Senado pretende votar a liberação de jogos de azar. Em apelo, o líder cristão exibiu o nome de cada parlamentar que integra o colegiado e pediu que a população pressione os senadores em questão a votarem contra.

Na gravação, Malafaia aponta que jogos de azar são capazes de destruir famílias e suas finanças.

“Esses senadores podem destruir a família brasileira, porque é provado que o imposto arrecadado com a jogatina não supera a desgraça que o jogo produz numa nação. Então vamos ficar atentos. A falta de escrúpulo é uma vergonha”, frisou.

Malafaia também recordou que o presidente do colegiado é Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que visa candidatar-se a presidente do Senado.

“Quero pedir a você que bombardeie [os parlamentares] com e-mails, ligue, está aí o nome deles, dos titulares e dos suplentes. Quando acabar a votação, eu vou dar aqui o nome de quem votou a favor e quem votou contra, porque em 2026 grande parte deles vai se submeter ao voto, e eu não vou deixar passar. Eu vou denunciar em cada estado os que votaram a favor desse lixo moral, que é um câncer na sociedade”, garantiu.

Mito x verdade

Os atores políticos e sociais contrários a legalização dos jogos no Brasil insistem em afirmar que a aprovação do PL 2234/22 vai aumentar a oferta de jogo no país, mas esquecem que, com a proibição o país transformou-se no campeão mundial do jogo não regulado.

Parece que o jogo no Brasil só vai existir a partir da aprovação do projeto que legaliza cassino, bingo, jogo do bicho e jogo online. O jogo já existe e está totalmente fora de controle, não recolhe tributos para o Estado, além disso, estes apostadores não têm nenhuma proteção do poder público. O país movimenta mais de R$ 200 bilhões em apostas ilegais através das operações de apostas esportivas, jogos online, cassinos, jogo do bicho, bingos, slot machines, entre outras opções. O Estado não recebe nenhuma contrapartida destes recursos.

‘Dona Santinha’ do século 21

Senadores e pastores insistem na cruzada de manter o jogo na ilegalidade através de argumentos frágeis e míopes. Alguns chegam a usar os argumentos da ‘moral e bons costumes’, usados há 78 anos pelo presidente Eurico Gaspar Dutra para decretar o fim dos cassinos no Brasil a pedido de sua esposa ‘Dona Santinha’.

A pergunta é: a quem interessa manter o jogo na ilegalidade?

 

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