Setor de varejo e consumo lança manifesto que pede a regulamentação de publicidade e fim do uso do cartão de crédito em apostas

Apostas I 20.09.24

Por: Magno José

Compartilhe:
Setor de varejo e consumo lança manifesto que pede a regulamentação de publicidade e fim do uso do cartão de crédito em apostas
Documento assinado por 15 de entidades foi lido na 9ª edição do Latam Retail Show, evento que acontece em São Paulo. Entidades empresariais alertam para o fato de que gastos com apostas atrai recursos da população, especialmente entre os mais pobres

Após o governo federal publicar uma portaria para apertar o cerco sobre as plataformas eletrônicas de apostas, conhecidas como “bets”, 15 entidades empresariais que representam setores de varejo e consumo divulgaram nesta quinta-feira um manifesto alertando para riscos associados ao crescimento dos gastos dos consumidores em geral com os jogos.

O governo está dando forma final às regras que vão formalizar o setor no país a partir de janeiro de 2025, inclusive com a previsão da cobrança de impostos, aprovada em lei no Congresso no ano passado.

Para as entidades que assinaram o manifesto, as “bets” deveriam estar sob maior regulação e pagar mais tributos, dada a natureza viciante dos jogos de azar. O documento defende restrições à propaganda por parte das plataformas de apostas e elevação da tributação sobre a atividade.

Movimento abaixo do normal

O setor de bares e restaurantes, lojas de moda e redes de franquias têm sentido, no dia a dia dos negócios, que a demanda não está tão pujante quanto poderia, diante do bom momento do mercado de trabalho, com emprego e renda em alta, disseram os líderes empresariais.

O documento — lido no Latam Retail Show, feira de negócios e congresso do setor encerrada nesta quinta-feira, em São Paulo, e divulgado inicialmente pelo Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), uma das entidades signatárias — alerta para o fato de que o crescimento das “bets” atrai “recursos da população dos mais diversos segmentos e faixas etárias”, principalmente “nas classes mais baixas” e entre os mais jovens.

— Isso pode, não só no varejo, mas de forma geral, afetar o jeito como a economia anda — afirmou Jorge Gonçalves Filho, presidente do IDV.

Segundo Paulo Solmucci Jr., presidente da Abrasel, que representa o setor de bares e restaurantes, o consumo das famílias com alimentação fora de casa parece estar abaixo do normal. Ainda mais diante do bom momento do mercado de trabalho, com crescimento do emprego e da renda.

— Historicamente, com a renda melhorando, temos um reflexo bem acima da reação da economia como um todo (no faturamento do setor), o que não está acontecendo — afirmou Solmucci Jr., citando estimativas de que as apostas on-line estariam retirando em torno de R$ 100 bilhões de potencial de consumo da economia.

Problema atinge funcionários

Bares e restaurantes têm sentido efeitos negativos também no relacionamento com seus funcionários. Os empregados do setor são um dos públicos consumidores típicos das bets, disse Solmucci Jr.:

— Os funcionários estão jogando e ficando sem dinheiro, pedindo vale o tempo todo (para os patrões).

Segundo Fabiana Estrela, diretora-executiva da ABF, que representa as empresas que usam o sistema de franchising em seus negócios, nos mais variados setores, a preocupação com a saúde financeira e mental dos funcionários também tem sido frequente entre os associados.

O tema ficou mais frequente nas conversas entre empresários no último mês. Agora, a ABF está estudando oferecer palestras ou fazer campanhas de informações sobre o tema para os funcionários das redes associadas.

— Estamos começando a organizar palestras. Esse volume de preocupação começou há um mês, de maneira mais forte. Já vínhamos acompanhando, mas um mês atrás o assunto entrou na pauta. Não tem um franqueador ou um dia nosso que não tem alguém comentando alguma coisa sobre a preocupação com as “bets”, seja sobre funcionário ou sobre o cliente ou sobre a economia” — afirmou Fabiana, lembrando que as apostas atraem, principalmente, pessoas jovens em idade produtiva.

A preocupação é tanta que a questão do impacto dos gastos com apostas no consumo entrou na pauta de uma reunião de representantes da ABF com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no fim de agosto, segundo a diretora-executiva da entidade.

Cobranças junto ao governo

Além dos alertas, o manifesto cobra algumas medidas por parte do governo, como “impedir de forma imediata o uso do cartão de crédito para pagamento das apostas”, proibição que só entrará em vigor em 2025, conforme a regulamentação definida até agora.

Outra cobrança é “rever a tributação prevista na lei”, de forma que “ela seja mais gravosa na operação de apostas on-line, tanto para a empresa de apostas quanto para o apostador”.

Segundo Gonçalves Filho, do IDV, embora contatos isolados sobre o tema já tenham ocorrido entre as entidades e autoridades do governo, o grupo signatário do manifesto também pretende fazer novas reuniões em conjunto, em Brasília, para cobrar mais regulação sobre as plataformas de aposta:

— O jogo está aí e vai continuar existindo. Precisamos já de regulação forte em todos os aspectos.

Confira o manifesto na íntegra e as entidades que assinam:

“As entidades nacionais que assinam este manifesto representam os mais importantes setores ligados ao consumo, comércio e varejo do Brasil, os maiores empregadores privados do país. E não podem se omitir ante o crescimento dos jogos e de tudo que está relacionado aos seus mecanismos conhecidos como ‘Bets’ ou jogos de apostas eletrônicas.

Eis os principais pontos para reflexão e ação:

  1. Essas modalidades de jogos estão crescendo seu faturamento de forma exponencial, atraindo recursos da população dos mais diversos segmentos e faixas etárias, mas de forma mais marcante nas classes mais baixas e de menor idade, redirecionando renda destinada ao consumo pessoal, inclusive de alimentos;
  2. Esse crescimento também tem atraído recursos direcionados pelos programas Bolsa Família/Auxílio Brasil para as famílias mais carentes e, originalmente, destinados às condições mínimas de sustentação familiar;
  3. O crescimento exponencial dos jogos e apostas traz consequências sérias para famílias e indivíduos pelo componente viciante, criando transtornos mentais e físicos e gerando problemas psicossociais que vão sobrecarregar o já sobrecarregado sistema público de saúde;
  4. O crescimento descontrolado das ‘bets’ gera vício e amplia o vínculo com jogos de azar, gerando comportamento compulsivo – em especial entre os mais jovens e vulneráveis emocionalmente, e com graves implicações psicológicas pelo aumento do endividamento para os apostadores e suas famílias;
  5. O cenário atual já mostra a deterioração das relações pessoais e emocionais, com empregadores públicos e privados tendo que atuar para dar apoio ao crescente número de casos crônicos que afetam o desempenho profissional, e num processo em visível escalada.

Por essas e outras razões, as entidades signatárias se integram e passam a atuar de forma conjunta para:

  1. Promover uma maior e mais ampla sensibilização sobre o potencial de problemas sociais que advirão dessa expansão;
  2. Regulamentar a comunicação publicitária, patrocínios e outras modalidades convencionais ou digitais de estímulo às apostas;
  3. Impedir de forma imediata o uso do cartão de crédito para pagamento das apostas, o que só ocorreria em 2025 pela legislação aprovada;
  4. Impor responsabilidade às empresas de apostas para que se tornem corresponsáveis por tratamentos envolvendo saúde mental e causados pelo vício com jogos nessas modalidades;
  5. Rever a tributação prevista na lei 14.790/2023, de modo que ela seja mais gravosa na operação de apostas on-line, tanto para a empresa de apostas quanto para o apostador.

Existem circunstâncias em que é preciso ir contra a correnteza representada pelo amplo engajamento em prol das apostas eletrônicas, para levar em conta o que é mais importante, saudável e responsável em prol da nação.

Associação Brasileira de Franchising (ABF)

Associação Brasileira da Indústria de Equipamentos e Serviços para o Varejo (ABIESV)

Associação Brasileira das Indústrias Ópticas (ABIÓPTICA)

Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT)

Associação Brasileira de Marcas Próprias e Terceirização (ABMAPRO)

Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (ABRASEL)

Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX)

Associação Brasileira de Empresas de Vendas Diretas (ABEVD)

Associação Brasileira de Tecnologia para o Comércio e Serviços (AFRAC)

Associação Nacional de Restaurantes (ANR)

Associação Brasileira de Strip Malls (ABMALLS)

Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB)

Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL)

Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV)

Instituto Foodservice Brasil (IFB)

 

Comentar com o Facebook