Análise: Regulamentação de apostas esportivas flerta com o fracasso
O Brasil está caminhando para aprovar uma regulamentação para as apostas que pode estar flertando com o fracasso, que será creditado à sanha arrecadadora do Executivo, a insensibilidade do Legislativo e a falta competência do setor em esclarecer e convencer os agentes públicos sobre as melhores práticas e os marcos regulatórios fracassados ao redor do mundo.
O maior problema está na exagerada tributação da atividade em 18% do GGR, somados aos outros impostos de uma empresa prestadora de serviços (13,33% a 16,33%) e a Taxa de Administração prevista na Lei 13.756/18 poderá representar uma taxação total acima dos 35%, sem incluir a outorga. Além disso, pela legislação brasileira os apostadores terão de pagar 30% de Imposto de Renda sobre prêmios que ultrapassem R$ 2.112 e a proibição do operador conceder, sob qualquer forma, adiantamento, antecipação, bonificação ou vantagem prévia, ainda que a mero título de promoção, divulgação ou propaganda, para a realização de aposta.
O problema é que existem indicativos que os senadores conservadores podem piorar ainda mais o PL 3626/23 durante a sua tramitação no Senado. Um deles é a exclusão da proposta as apostas em ‘eventos virtuais de jogos online’, que permite a operação de jogos de cassinos online.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE), principal responsável pela criação da Frente Parlamentar por Um Brasil sem Jogos de Azar, instalada no Congresso, com a participação de senadores e deputados promete trabalhar para rejeitar a proposta ou no mínimo em restringir a publicidade. “Vamos precisar ter muita serenidade e responsabilidade com o Brasil e com os brasileiros para rejeitar”, disse.
A única emenda apresentada até a manhã desta segunda-feira (2) ao PL 3626/23 no Senado tinha sido do senador Styvenson Valentim (Podemos-RN) e membro da frente contrária é para que seja proibida a veiculação, em qualquer meio de comunicação, de ações de comunicação, publicidade e marketing que promovam a loteria de apostas de quota fixa.
Disputa pela Secretaria
Num esforço para tentar viabilizar sua meta de déficit zero nas contas públicas em 2024, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad buscou reunião com o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL) para aprovar medidas que aumentam arrecadação.
A relação entre eles ficou estremecida e os líderes partidários apontam vários fatores que têm provocado insatisfação como as mudanças no comando da Caixa Econômica Federal, indefinição na Funasa, alvo de disputa entre PSD e Republicanos.
Outra fonte de cobiça é a futura Secretaria Nacional de Prêmios e Apostas, programada para ficar na Fazenda. Mas aliados de Lira preferem que ela seja alocada na pasta de Esportes, comandada por André Fufuca (PP-MA).
O projeto de lei que taxa as apostas on-line, esportivas ou não, saiu da Câmara e aguarda análise do Senado. O PL ainda não avançou na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e aguarda relator.
Ilusão com a arrecadação
Em entrevista ao O Globo deste sábado, o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, afirmou que o plano B da equipe econômica para aumentar a arrecadação federal já está em andamento. Durigan, em sua primeira entrevista exclusiva a um jornal, explicou ao GLOBO que entram nesse critério projetos como a taxação das apostas esportivas e os programas de repatriação de ativos e antecipação de recebíveis.
“Apostas on-line, regulamentar este setor, cobrar outorga, tributo que pode gerar arrecadação de cerca de R$ 10 bilhões, segundo analistas. Nós apuramos R$ 700 milhões, porque ainda não temos a informação bem acabada”, comentou Durigan.
Para quem conhece o tema, é difícil acreditar que o PL 3626/23, da forma como foi aprovado na Câmara, possa ser um plano B de receita para o governo e gerar R$ 10 bilhões de arrecadação.
Comento
Infelizmente, Executivo e Legislativo podem estar cometendo um grande equívoco ao esquecer de algumas premissas na questão da regulamentação dos jogos, como nos ensinou o ex-diretor da Comissão de Jogos do Peru, Manuel San Román e responsável pela criação do marco regulatório que modificou o cenário do jogo ilegal no país através dos ‘7 mandamentos do Jogo Legal’:
- Regular antes de proibir.
- A proibição leva ao jogo clandestino.
- O jogo clandestino leva a corrupção.
- Jogo é atividade sensível que requer transparência.
- Política de portas abertas com os operadores.
- Não se pode regular fora da realidade.
- Publicação prévia das normas para críticas e comentários.
Menos de uma dúzia
Um especialista ouvido pelo BNLData acredita que com essa taxação das plataformas, tributação exagerada do apostar, exclusão dos jogos online e com todas as ‘amarras’ contidas no projeto, menos de uma dúzia de plataformas conseguiriam operar, mesmo assim, com odds e planos de marketing reduzidos.