Caso Paquetá: Entenda por que punição por cartão amarelo em apostas pode ser maior na Inglaterra do que foi no Brasil

BNL I 07.06.24

Por: Magno José

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Caso Paquetá: Entenda por que punição por cartão amarelo em apostas pode ser maior na Inglaterra do que foi no Brasil 1
Lucas Paquetá com a camisa do West Ham (Foto: West Ham United FC)

Acusado de supostamente receber o cartão amarelo de forma deliberada em quatro jogos da Premier League para que apostadores lucrassem, o meio-campista Lucas Paquetá, de 25 anos, aguarda a decisão da Football Association (FA), órgão máximo do futebol inglês, que deseja que ele seja “banido para sempre” caso considerado culpado. No Brasil, outros atletas também já se envolveram na mesma situação que o número 10 do West Ham é acusado, e sofreram com punições severas. O GLOBO ouviu especialistas para entender a diferença dos casos e quais poderão ser os riscos para a carreira do atleta da seleção brasileira.

Em 2023, 15 jogadores do futebol brasileiro foram apontados como investigados na operação Penalidade Máxima, do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO). Os casos envolviam apostas para lances como punições com cartões amarelo ou vermelho e cometer pênaltis. Na primeira fase da ação, um esquema com oito atletas de diferentes clubes foi denunciado pelo MP. Todos viraram réus por participarem do suposto esquema de manipulação em jogos da Série B de 2022.

Cada um dos atletas esteve envolvido em lances que geraram punições diretas pelo árbitro a fim de cumprirem com o combinado feito previamente com os apostadores. Julgados pelo STJD do futebol pelo envolvimento em esquemas de apostas relacionados à aplicação de cartões amarelos, a legislação aplicável ao caso era o Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD). As condutas pelas quais os atletas foram condenados se enquadraram no art. 243, § 1º, do CBJD, que prevê, para réus primários, pena de suspensão mínima de 360 dias e máxima de 720 dias.

A punição com origem em lances de cartão foi aplicada para nomes como Gabriel Domingos, afastado por 720 dias de suspensão e multa de R$ 15 mil; Moraes, 760 dias de suspensão e multa de R$ 55 mil; Fernando Neto, 380 dias de suspensão e multa de R$ 25 mil; e Kevin Lomónaco, 380 dias de suspensão e multa de R$ 25 mil. No pior dos casos, dentre os punidos, estão o de Romário, ex-atleta do Vila Nova, Gabriel Tota, ex-Juventude, Matheus Gomes, ex-Sergipe, banidos do esporte. No entanto, estes estiveram envolvidos no aliciamento de demais jogadores para fazer parte dos esquemas e, por isso, sofreram uma punição mais grave.

Para o auditor do STJD do futebol, Paulo Sérgio Feuz, o caso do meio-campista se compara ao dos atletas que jogavam no país e foram punidos pelos cartões recebidos. Ele ainda ressalta que no Brasil, o banimento não é permitido, e sim o desligamento, que permite, após dois anos, pedir o retorno.

— Os casos são distintos, porém, no Brasil, foram julgados pelo STJD baseado no CBJD e tiveram punições severas, inclusive com abrangência internacional determinada pelo STJD. Temos de diferenciar a responsabilidade penal da desportiva. O MP no Brasil apura responsabilidade penal. Na Inglaterra, da mesma forma que no Brasil, também se apura a responsabilidade desportiva […] Nosso Estado valoriza a possibilidade de reeducação e não aceitamos uma pena de morte desportiva— disse ao GLOBO.

Já Paulo Schmitt, consultor de integridade e coordenador da divisão de prevenção à manipulação do Comitê Olímpico do Brasil e presidente do comitê de integridade da Federação Paulista de Futebol, entende que as diferenças entre os casos são maiores. Segundo ele, as situações precisam ser vistas “incluindo a estrutura legal, a cultura esportiva, a percepção pública e as políticas de governança e compliance” que são distintas da Europa para o Brasil.

— A percepção pública na Europa é de tolerância zero para manipulação, resultando em uma maior pressão para punir severamente os infratores. No Brasil, a cultura pode ser mais leniente em alguns casos. Situações como as de jogadores na Itália e na Espanha envolvidos em escândalos de manipulação de resultados resultaram em punições rigorosas, incluindo rebaixamento de clubes, suspensões de jogadores e multas substanciais. No Brasil, basta lembrar que aqui a operação policial Game Over levou mais de cinco anos para ter uma sentença criminal, e a mais recente, Penalidade Máxima, não gerou nenhuma prisão, apenas delações aos envolvidos. E as penas disciplinares em média ficaram em um ano de suspensão — descreveu.

Na Inglaterra, se aplicam ao caso as “FA Rules”, código de regras definidas pela Federação Inglesa de Futebol. Paquetá foi denunciado por quatro infrações ao artigo E5.1 das FA Rules, que consiste em influenciar desempenho e resultado esportivo com o propósito de afetar intencionalmente o mercado de apostas, e em duas infrações ao artigo F3, baseado em não colaborar integralmente com a investigação. O advogado desportista João Marcello Costa explicou como isso poderá ser visto no caso do meio-campista:

— Tais normas inglesas preveem a possibilidade de aplicação de penas maiores aos réus primários do que a pena máxima de 360 dias que o CBJD prevê. Ou seja, no Brasil, o cometimento de uma infração do tipo tem pena máxima de 720 dias de punição, já na Inglaterra, uma eventual punição para uma infração de mesma natureza pode resultar em penas como o banimento do esporte, ainda que para réus primários. Caso condenado, Paquetá poderá recorrer a Corte Arbitral do Esporte (CAS). Do mesmo modo, caso absolvido, a Federação Inglesa pode recorrer.

Banido por uma década em caso semelhante, jogador inglês pede punição severa a Paquetá: ‘Deveria pegar 40 anos’

Caso Paquetá: Entenda por que punição por cartão amarelo em apostas pode ser maior na Inglaterra do que foi no Brasil
Kynan Isaac foi banido por 10 anos quando atuava pelo Stratford Town, da Inglaterra  (Foto: Reprodução)

Kynan Isaac foi suspenso por dez anos em outubro de 2022 pela Federação Inglesa de Futebol

Engana-se quem pensa que o caso envolvendo o brasileiro Lucas Paquetá é raridade no futebol inglês. Outros jogadores já se envolveram em casos parecidos, como por exemplo, o atacante Ivan Toney, do Brentford, e Sandro Tonali, do Newcastle, que também foram punidos por violarem regras de apostas no futebol inglês. No entanto, existe um caso ainda mais semelhante, onde o jogador recebeu uma punição de 10 anos.

Em novembro de 2021, Kynan Isaac, à epoca lateral-esquerdo do Stratford Town, um time que joga fora do sistema de divisões do futebol inglês forçou um cartão amarelo durante um jogo da primeira fase da Copa da Inglaterra, a FA Cup, contra o Shrewsbury Town. A casa de apostas inglesa ‘SkyBet’ revelou ao departamento da Federação Inglesa de Futebol (FA) dados que comprovavam 19 apostas feitas em um jogador de Stratford a ser advertido na partida, sendo 14 delas relativas a Isaac, e a FA considerou o jogador culpado por supostamente fazer parte de um esquema de apostas com amigos, e lhe deu um banimento de 10 anos.

O lateral também foi banido por mais 18 meses por ser considerado culpado de fazer ou permitir quase 350 apostas em jogos durante um período de cinco anos, entre agosto de 2016 e novembro de 2021.

Em entrevista ao jornal inglês ‘The Sun’, Isaac afirmou que se ele levou uma punição de 10 anos por conta de um cartão amarelo, o brasileiro Lucas Paquetá merece receber um banimento ainda maior do que o seu, já que o meia supostamente teria forçado cartões em mais de uma oportunidade.

– Será muito interessante ver o que eles farão com ele, não faz sentido eu ficar sentado aqui e deixar todo mundo escapar impune. É matemática básica: se eu peguei dez anos por fazer isso uma vez, pela mesma regra, ele deveria pegar 40 anos por fazer isso quatro vezes. Mal posso esperar para ver o que eles vão dar a ele – será algo patético, cerca de um ou dois anos, porque ele tem dinheiro e um advogado caro. Se isso acontecer, eles não poderão me ignorar e ignorar a proibição que me deram – disse Isaac.

O jogador, que atualmente tem 31 anos de idade, relembrou ao jornal inglês como foi receber a punição da Federação Inglesa, que levou o caso à polícia logo assim que deu o veredito do banimento.

– A polícia veio até minha casa e me disse que havia um mandado de prisão contra X, Y e Z. Eu estava com meus filhos, então perguntei se poderia me entregar em um determinado horário. Fui lá no dia seguinte, por volta do meio-dia, com meu advogado e a polícia nem levou isso em consideração. Fui banido por dez anos. Será interessante se fizerem o mesmo com o Paquetá, eles (FA) vão fazer a polícia bater na porta dele? Se não, por que não? Por que ele deveria ser tratado de forma diferente de mim? Além disso, embora eu não saiba os detalhes exatos sobre as apostas de que estamos falando, certamente serão na casa dos milhares. Comigo foram centavos – indagou.

Isaac também desabafou sobre os outros casos do futebol inglês em que jogadores foram pegos com envolvimento com apostas, principalmente o de Ivan Toney, atacante do Brentford, que alegou problemas de saúde mental e teve sua pena considerada branda. Toney, inclusive, foi convocado pela seleção inglesa e vai disputar a Eurocopa a partir deste mês de junho.
Fotos da carreira de Lucas Paquetá

Jogador tem passagens passagens pela seleção brasileira, além de Flamengo (BRA), Milan (ITA), Lyon (FRA) e West Ham (ING)

– Foi mentalmente horrível para mim. O jogador de futebol fora do sistema de ligas é suspenso por dez anos e então você vê um grande astro como Ivan Toney – que estava ganhando milhares de libras – sendo autorizado a jogar quando foi acusado, e foi convocado para a Inglaterra. A suspensão foi de apenas seis meses, porque incluía o período de entre as temporadas. E ele estará na Euro. A FA literalmente me impediu de jogar qualquer futebol, até mesmo o futebol de sete ou na várzea. Ninguém se preocupou com minha saúde mental depois de receber uma proibição tão grande. Fiquei deprimido e isso me atingiu muito, mas ninguém da PFA (Associação de jogadores profissionais) ou da FA entrou em contato para saber como eu estava – finalizou.

Kynan Isaac, hoje com 31 anos, caso não tenha sua pena reduzida nos tribunais, só poderá a voltar jogar futebol em abril de 2034, quando terá 41 anos de idade. (Globo Online)

 

 

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