Clubes podem perder até R$ 400 milhões com regra que restringe patrocínios de casas de apostas
Incluída no relatório aprovado pela Comissão de Esportes do Senado Federal do projeto que busca regulamentar as apostas esportivas on-line no Brasil, a emenda 38-A, de autoria do senador Eduardo Girão (Novo-CE), tem provocado forte reação por parte dos clubes de futebol e das empresas que atuam no setor, registra a Máquina do Esporte.
Em linhas gerais, a regra, que foi incluída à revelia do senador Romário (PL-RJ), relator do projeto, impõe restrições para patrocínios e publicidade feitas por empresas de apostas, que ficariam impedidas de patrocinar “equipes, atletas individuais, ex-atletas, árbitros, membros de comissões técnicas profissionais e amadores de todas as modalidades esportivas, bem como campeonatos organizados por confederações esportivas olímpicas, reconhecidas e vinculadas ao Comitê Olímpico do Brasil (COB), assim como as federações a elas filiadas de todas as modalidades esportivas”.
De acordo com André Gelfi, presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), as estimativas feitas atualmente pelo mercado indicam que, caso seja aprovada pelo Congresso e se torne parte da lei que regulamenta as apostas, a emenda poderá levar os clubes a perderem até R$ 400 milhões em patrocínios.
“É um dinheiro que deixará de existir para os clubes e que tem um peso importante nas séries A, B e C do Campeonato Brasileiro. Se a emenda for aprovada, o cobertor ficará mais curto para a maioria das equipes”, avalia Gelfi.
Clubes se mobilizam
Na última sexta-feira (10), 39 clubes das três principais divisões do Brasileirão divulgaram um manifesto criticando a emenda de Girão. Levantamento da Máquina do Esporte mostra que, atualmente, 19 clubes da Série A têm algum tipo de patrocínio feito por casas de apostas.
A única exceção é o Cuiabá, que, ainda assim, assina a nota ao lado de: América-MG, Athletico-PR, Atlético-MG, Atlético-GO, Avaí, Bahia, Botafogo, Ceará, Chapecoense, Corinthians, Coritiba, CRB, Criciúma, Cruzeiro, CSA, Figueirense, Flamengo, Fluminense, Fortaleza, Goiás, Grêmio, Guarani, Internacional, Ituano, Juventude, Novorizontino, Palmeiras, Paysandu, Red Bull Bragantino, Sampaio Corrêa, Santos, São Paulo, Sport, Tombense, Vasco e Vila Nova.
Na primeira divisão do Campeonato Brasileiro, 12 clubes têm patrocínio máster de casas de apostas. Já na Série B, as empresas do setor estão em todos os 20 times e ocupam o espaço principal nas camisas de 13 deles, incluindo o Botafogo-SP, patrocinado pela EstrelaBet, um dos poucos que não assinam o manifesto.
Caso a emenda venha ser aprovada junto do projeto final, ficarão sem patrocinador máster os seguintes clubes que hoje estão na Série A do Brasileirão: América-MG, Atlético-MG, Athletico-PR, Bahia, Botafogo, Cruzeiro, Fluminense, Fortaleza, Goiás, Santos, São Paulo e Vasco.
Possíveis impactos
Embora evite fazer projeções sobre o tamanho do impacto financeiro que poderá ser ocasionado pela emenda 38-A, a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) criticou a inclusão da regra no relatório.
“Hoje as empresas de apostas esportivas são as maiores anunciantes brasileiras. A eventual proibição de anúncios do setor repercutirá muito sobre o mercado publicitário, tirando centenas de milhões de reais desse segmento. O que não é bom para absolutamente ninguém”, afirmou a entidade, em nota enviada à Máquina do Esporte.
Já na visão de Gelfi, além de ocasionar perdas aos clubes, as restrições aprovadas pela Comissão de Esportes do Senado servirão para inviabilizar a atividade no país.
“Hoje, é importante frisar, não temos de fato um mercado brasileiro de apostas, pois as operações são realizadas fora do Brasil. Caso seja incluída na regulamentação, essa emenda reduzirá a atratividade do setor para os investidores, que estarão impedidos de anunciar seu produto”, afirma.
Proibicionismo
Na visão da ANJL, a postura proibicionista tende a favorecer o jogo ilegal. A entidade cita como exemplo a Itália, onde a publicidade de apostas esportivas e jogos on-line é vetada por lei.
“Isso resultou em um fenômeno interessante e que deixou as autoridades atrapalhadas. Somente de janeiro a setembro, o governo italiano tirou 9.800 sites ilegais do ar, mas um número maior do que esse foi criado. Portanto, essa proibição, na Itália, foi um desserviço para a sociedade. O resultado foi o fortalecimento do mercado ilegal que não paga impostos, não fornece informações, não está sujeito ao controle do Estado”, Associação Brasileira de Jogos e Loterias (ANJL)
Gelfi também adota essa linha de raciocínio, ao defender que a questão do jogo e das apostas deveria ser encarado a partir de sua dinâmica mercadológica e não escondido, para longe do campo de visão da sociedade.
“O que é melhor: um mercado regulado, onde podemos encarar os eventuais problemas e buscar meios de solucioná-los, ou inviabilizar a atividade regulamentada e deixar a população exposta aos operadores informais?”, questiona.
Na opinião do presidente do IBJR, as restrições às apostas esportivas não terão efeito prático, no sentido de impedir que as pessoas continuem jogando. “Estamos falando de um mundo digital. Medidas proibitivas vão contra a atividade saudável, em que é possível identificar e tratar problemas como compulsão por jogos ou mesmo garantir que a publicidade e os patrocínios sejam direcionados da melhor maneira, de modo a não impactarem crianças e adolescentes”, afirma.
Gelfi diz estar otimista em relação as chances de a emenda 38-A ser rejeitada pelo Senado. “Entendo que esse assunto gerou preocupação e os senadores ouvirão o clamor dos clubes”, acredita.