Com prêmios altos, bingos ilegais operam com portas abertas em São Paulo
Apesar de ilegais há mais de 20 anos, bingos continuam operando normalmente na capital de São Paulo. Quatro deles funcionam com liminares da Justiça sob o argumento de serem entidades beneficentes. Mas muitos outros movimentam milhares de reais em apostas na ilegalidade. A CBN visitou alguns desses estabelecimentos.
As portas ficam completamente abertas, revelando para qualquer um que passa pela Avenida Engenheiro Caetano Alvares as 16 telas de TV que mostram as bolas numéricas sorteadas no bingo ilegal que funciona ali. Não há nenhuma preocupação em esconder a atividade fora da lei que acontece dentro do Espaço Caetano, em uma das principais avenidas da Zona Norte.
Na entrada, a única preocupação do segurança é que os frequentadores apresentem RG. Uma viatura da Polícia Militar passa nos arredores do Espaço Caetano por volta das 23h de uma quarta-feira, mas o movimento no bingo continua normal.
Na Zona Leste, o bingo clandestino na movimentada Rua Tuiuti, no Tatuapé, costuma fechar as portas para evitar chamar a atenção. Atravessando um pequeno corredor na entrada, é possível encontrar um salão com cerca de 50 mesas de 5 cadeiras. O local tem até mesmo andar superior. Perto das sete da noite, o Espaço Tatuapé fica lotado, com um público principalmente de idosos, de vestes simples, todos vidrados no anúncio dos números enquanto preenchem correndo as cartelas.
Sob o verniz de ser beneficente, o Bingo Real da Sorte funciona há anos em um dos endereços mais caros da cidade: na Floriano Peixoto, Itaim Bibi, Zona Oeste. Apostadores de diversas partes da capital atravessam a cidade até lá, atraídos pelos preços dos prêmios, que podem passar dos R$ 50 mil.
O Bingo Real da Sorte é um dos quatro autorizados pela Justiça para funcionar na cidade amparados pelo argumento de serem beneficentes e estarem vinculados a ONGs. A lei estabelece que todo o lucro deve ser repassado a instituições ligadas a causas sociais. O preço da cartela no Bingo Real da Sorte varia conforme a premiação. Quando estava em R$ 20 mil, cada cartela custava R$ 10, com cerca de 70 pessoas no salão.
O promotor Silvio Loubeh, do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO) de São Paulo, afirma que o argumento de instituição beneficente funciona como fachada. E ainda apresenta outros fatores que dificultam as investigações:
‘Tem uma questão da corrupção em várias investigações pelo GAECO e ficou bem evidente o pagamento de propina para policiais para não haver atuação repressiva ou, pelo menos, para ter omissão. O jogo de azar é uma contravenção. As pessoas não temem repressão porque ninguém vai preso por causa disso.’
Segundo o promotor, os valores sorteados nos prêmios são só um percentual do lucro dos bingos. Analista do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Guaracy Mingardi aponta que os bingos não são vistos como ilegais pela sociedade, o que dificulta a fiscalização:
‘Tem que investigar e gastar esforços em uma coisa que não é vista pela sociedade — e muito menos pela polícia — como prioridade. Vai gastar gente e dinheiro para fazer isso ou vai priorizar outras coisas? É muito maior a facilidade de corrupção. O policial recebe dinheiro do bingo porque acha que não é nada demais, que crime é outra coisa.’
De janeiro a maio deste ano, a Polícia Civil informou ter autuado 424 pessoas pela prática de bingo na capital. O número, de apenas 5 meses, já é próximo ao do total do ano passado, quando 670 suspeitos foram autuados. Neste ano, a polícia já apreendeu mais de mil máquinas caça-níqueis. No ano passado, foram mais de 4 mil apreensões.
A Prefeitura de São Paulo afirmou que fiscaliza atividades comerciais e está à disposição para receber novos endereços suspeitos de funcionarem como bingos. (Ouça a reportagem na CBN)