Federico Lannes: “A indústria de Jogos bem regulamentada deve erradicar o jogo ilegal através de políticas de longo prazo”

Destaque I 20.02.21

Por: Magno José

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Federico Lannes é Auditor Público Certificado, Mestrado em Administração de Empresas no INCAE / Harvard. Membro do Institute of Internal Auditors (IIA), Ex-CEO do Intercontinental Mendoza, Gerente Geral do Salto Hotel and Casino (Uruguai), Gerente Geral do Hotel Altos del Arapey (Uruguai). Gerente de Auditoria do Casino Internal, Gerente de Crédito de Cassino e Diretor de Compliance no Iguazu Grand Resort and Casino (Argentina), Consultor de Negócios em hotéis e cassinos (no Paraguai). Consultor da Ernst & Young (Argentina)

 

Em sua entrevista exclusiva à Tribuna da Imprensa Livre, Federico Lannes, consultor em negócios internacionais, afirma que: “Poucos países da América Latina possuem atualmente uma regulamentação moderna e uma estrutura tributária atraente para os investidores. Há algumas exceções como o Peru e a Colômbia, que estão entre as mais avançadas da região.” Para ele:

“Não há destino de jogo que não tenha sofrido as consequências desta crise que está começando em sua segunda etapa em 2021. Por esta o jogo on-line tem uma grande vantagem sobre seus equivalentes terrestres. Com os novos padrões de clientes após a pandemia, hotéis e cassinos devem rever suas ofertas de serviços existentes para se adaptarem às mudanças na experiência do cliente, promovendo a cultura sem contato.”

Luiz Carlos Prestes Filho: Qual o tamanho do mercado legal de jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada da América Latina? Destaque para Bingos, Cassinos e Jogos Eletrônicos.

Federico Lannes: Antes de tudo, devemos distinguir o jogo presencial nos cassinos do jogo on-line. Aqui estão alguns números.

Mercado Brasileiro de Jogos

De acordo com um relatório de 2017 do Instituto Brasileiro de Jogos Legais (Instituto Jogo Legal), o mercado de jogos ilegais, junto con on-line, seria de US$ 6,4 bilhões de GGR (Receita Bruta de Jogos). Por sua vez, um estudo encomendado pela Remote Gaming Association (RGA) e realizado pela KPMG no final de 2017 estimou o mercado online offshore em US$ 2,1 bilhões anuais em termos de GGR (fonte: Gross Gaming Revenue)

Potencial da indústria de jogos on-line no Brasil

Um relatório esclarecedor sobre a indústria de jogos no Brasil, preparado pela BtoBet (BtoBet: Brazil Betting Focus Latam’s Largest Regulated Market in the making, 2017), líder no fornecimento de plataformas de jogos e apostas em Malta, destaca a importância do Brasil como um mercado potencial em si: com 211,8 milhões de pessoas, das quais 87% vivem em um contexto urbanizado, o Brasil tem, de longe, a maior população da região. Entretanto, o imenso potencial do país está baseado na paixão de seus jogadores pelo esporte, sendo que as apostas esportivas representam 95% de toda a indústria local. Hoje, o Brasil tem 97% de penetração de conexões móveis (205,8 milhões de pessoas) e 71% de penetração da Internet (150,4 milhões de habitantes), com um aumento anual significativo de 6% de janeiro de 2019 a janeiro de 2020. A região como um todo tem 469 milhões de usuários regulares de serviços on-line. Com base nas estatísticas, a LatAm é uma grande oportunidade para o mercado de apostas esportivas.

Prestes Filho: Quais são aqueles países que tem uma infraestrutura e base legal bem estruturada?

Federico Lannes: Primeiro definamos o que significa ter uma infraestrutura moderna e uma base legal. Poucos países da América Latina possuem atualmente uma regulamentação moderna e uma estrutura tributária atraente para os investidores. Há algumas exceções como o Peru e a Colômbia, que estão entre as mais avançadas da região. Na minha opinião, uma indústria do jogo bem regulada deveria atingir os seguintes objetivos: (1) Ter um portfólio de jogos de azar que contempla todas as opções presenciais e on-line; (2) Exigir o cumprimento das normas dos operadores; (3) Contribuir para os principais objetivos do Estado: saúde, educação pública e segurança; (4) Controle de lavagem de dinheiro através de entidades estatais independentes; (5) Ser uma indústria que contribui para o PIB do país e gera fontes genuínas de emprego, incentivando o investimento na indústria hoteleira, assim como no jogo; (6) Erradicar o jogo ilegal através de políticas de longo prazo. Vejamos o caso de alguns países da região que fizeram rápidos progressos com estas premissas.

Prestes Filho: Com a pandemia da Covid 19 os destinos turísticos da América Latina, voltados para Jogos de apostas em dinheiro sofreram grande impacto econômico e financeiro. Quais foram estes destinos? Qual a perspectiva para a volta para a normalidade?

Federico Lannes: Podemos dizer que não há destino de jogo que não tenha sofrido as consequências desta crise que está começando em sua segunda etapa em 2021, no inverno do norte. Pelo que experimentamos em 2020, podemos ver algumas tendências.

Prestes Filho: Quais são as diferenças que existem entre os mercados de jogos de apostas em dinheiro da América Latina se comparado com o da África; Ásia; EUA e Canadá; e da Comunidade Econômica Europeia?

Federico Lannes: Os operadores de jogos internacionais estão plenamente conscientes do grande potencial oferecido por um mercado de mais de 300 milhões de pessoas. Isto representa quase 3/4 de toda a população da América do Sul e é composto por pessoas com mais de 18 anos de idade que podem jogar legalmente. No entanto, existem acentuadas assimetrias entre os diferentes países. Há alguns países onde ainda não existe uma regulamentação estabelecida ou regulamentação de jogo. É aí que vejo muitas disparidades na região sobre o que é permitido ou não permitido, e sobre o quão atraente um país pode ser para um investidor não apenas com cassinos físicos, mas com a regulamentação do jogo on-line. Se analisarmos com números que em outros países a indústria hoteleira-casino é um grande dinamizador da economia, não só no emprego, mas também analisado a partir dos gastos e cobrança de impostos do jogador, como é o caso de Las Vegas, no Estado de Nevada. Por esta razão, a demora de alguns países em ter uma estrutura legal adequada para gerar riqueza a partir do setor privado é incompreensível. Este é o grande desafio para a América Latina. Cada país deve adotar um modelo que seja suficientemente atraente para os investidores, do ponto de vista fiscal, mas que também lhe dê continuidade ao longo do tempo, evitando aumentos de impostos ou mudanças regulatórias que deem mais intervencionismo ao Estado onde não é necessário. Uma administração tributária eficiente pode ajudar a incentivar as empresas a se registrarem formalmente e a economia a crescer, ampliando assim a base tributária e aumentando a receita tributária. O Brasil tem uma grande oportunidade de aprender as melhores práticas dos sistemas tributários de outros países para se tornar um modelo de estrutura regulatória ao longo do tempo. Casos de sucesso como Nevada nos Estados Unidos nos mostram o caminho para o crescimento contínuo com baixas taxas de impostos sobre o jogo que depois geram maiores gastos do consumidor.

Prestes Filho: Os países que têm uma infraestrutura de qualidade para jogos de apostas em dinheiro importam softwares, máquinas e mobiliário? Conseguem administrar suas marcas? Existe espaço para a países da América Latina produzir softwares, máquinas e mobiliário?

Federico Lannes: Teremos que ver o interesse dos fabricantes de acordo com a competitividade do país que eles estão olhando. Neste sentido, a América Latina tem um longo caminho a percorrer e há questões centrais que todo investidor avalia. Menciono abaixo alguns dos pontos estabelecidos no guia Doing Business do Worl Bank, que determina um ranking dos países mais competitivos para os negócios (fonte: Fazendo o ranking de negócios 2020) e também acrescento alguns aspectos que, em minha opinião, são centrais para uma economia que deseja atrair investimentos: Para ter estabilidade política ao longo do tempo; Tempo para registrar a propriedade intelectual ou registrar uma empresa; Tempo para obter licenças de construção; Acesso ao crédito para o crescimento dos negócios; Acesso à eletricidade e à água; Boa infraestrutura rodoviária; Solidez do sistema judicial, proporcionando segurança jurídica para os investidores; Resolução de disputas legais devido à insolvência; Recrutamento de trabalhadores; Contratos com o Estado através de licitações públicas; Baixa carga tributária total; Clima regulatório favorável aos negócios; Boa qualidade de vida do ponto de vista da saúde, educação, entretenimento e recreação; Baixos níveis de corrupção no Estado; Proximidade a centros populacionais, mercados, rotas de transporte e portos; Excelente infraestrutura para logística aeroportuária; Mão-de-obra qualificada.

Prestes Filho: Quais são as perspectivas do setor para os próximos anos?

Federico Lannes: A América Latina será sem dúvida uma terra de oportunidades, principalmente devido à grande expectativa de abertura no Brasil, um país onde o jogo é proibido desde os anos 40, ou seja, há mais de 70 anos. Apostas em corridas de cavalos, loterias estaduais e pôquer são os únicos jogos de azar legais no Brasil. O bingo foi legalizado nos anos 90, mas foi banido novamente em 2007. Estima-se que o mercado brasileiro de jogos de azar pode representar US$ 17 bilhões. Somente o jogo ilegal que movimenta aproximadamente 35 bilhões de dólares por ano, apostando como a loteria faz insetos, o que é muito popular em todas as classes sociais. Estima-se que os brasileiros gastam aproximadamente US$ 950 milhões por ano em ignição. É um país com 207 milhões de habitantes que fechou 2017 com 236,5 milhões de telefones celulares, dos quais 62% são pré-pagos. 92% dos brasileiros com acesso à Internet estão conectados via telefones celulares, enquanto apenas 54% dos domicílios têm uma conexão à Internet.

Prestes Filho: A realidade da América Latina para com os jogos de apostas em dinheiro administrados pela iniciativa privada facilita o caminho da regulamentação do jogo no Brasil?

Federico Lannes: Sem dúvida, as experiências de regulamentação do jogo presencial têm marcado um caminho na região, mas países como o Brasil devem olhar para experiências de sucesso na região e no hemisfério norte para gerar um modelo de regulamentação que promova investimentos e empregos no setor privado. Sem dúvida, a América do Sul continua a ser uma grande oportunidade, devido à abertura que o Brasil terá.

Confira na Tribuna da Imprensa, os gráficos, o sucesso do modelo regulatório da Colômbia, o processo de obtenção de licenças no Peru e os desafios para os sites de apostas esportivas.

(Entrevista nº 14 da série especial ‘Regulamentação de Jogos’ coordenada pelo Diretor Executivo do jornal Tribuna da Imprensa Livre, Luiz Carlos Prestes Filho – Entrevista publicada nesta sábado, dia 20 de fevereiro) 

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