Idosos se aglomeram em bingos clandestinos em Belo Horizonte com uso opcional de máscara

Destaque I 21.01.21

Por: Elaine Silva

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No último domingo, cerca de 100 apostadores se aglomeravam em mesas de plástico branco. Segundo afirmou uma garçonete, o bingo também funciona das 16h às 4h (Imagem: Amaury Ribeiro Jr/UOL)

Em meio a um lockdown estabelecido por decreto pelo prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), os idosos, o principal grupo de risco do coronavírus, estão ajudando a lotar bingos clandestinos da cidade.

Desde que foi proibida em 2002 por lei, a exploração de casas de bingo tornou-se contravenção penal, a exemplo do jogo do bicho. A pena é de três meses a um ano de reclusão mais o pagamento de multa.

Quatro dias depois de Belo Horizonte registrar, na quarta-feira (13), 9.100 casos de coronavírus (recorde diário em Minas Gerais), o UOL esteve desde a tarde do domingo (17) até a madrugada da segunda-feira (18) em dois bingos na capital mineira: o do Túnel da Lagoinha, no bairro Floresta, e o do bairro Carlos Prates.

A agitação nos bingos clandestinos contrastava com as ruas vazias e os bares e o restante do comércio fechados. Só é permitido o funcionamento de farmácias, mercados e lojas com serviços essenciais. Nos restaurantes, só é permitido o serviço de entrega. Segundo dados da Secretaria de Saúde, até domingo, dia da farra nos bingos, já haviam sido registrados 643 mil casos de covid-19 e 9.120 mortes em Minas Gerais.

Procurada pela coluna, a Prefeitura de BH informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que desconhece o funcionamento dos bingos na cidade. A administração municipal afirmou ainda que, ao tomar conhecimento, fechará estabelecimentos do tipo. A Polícia Civil não respondeu os questionamentos enviados pela reportagem.

Funcionando das 16h às 4h do dia seguinte, o Bingo do Túnel chama a atenção devido à aglomeração e ao entra e sai de carros. Por volta das 20h, havia cerca de 300 pessoas, calculou a reportagem, espalhadas por três salas: a principal, a área de fumantes e uma menor de informática, destinada aos clientes que anotam suas cartelas no computador.

No estacionamento privado do bingo havia cerca de 80 carros. Os clientes são recebidos por uma recepcionista e, após atravessarem o estacionamento, chegam a uma escada que dá acesso ao salão principal. Na porta de acesso ao bingo, o cliente encontra duas faixas colocadas no meio de uma fonte de água. “O Bingo do Túnel agradece a preferência”, diz uma delas.

Na entrada do salão fica um bar, que vende salgados e bebidas alcoólicas nacionais e importadas. O uso de máscara é opcional. A maior parte dos clientes escolhe não usá-la. Também não há distanciamento entre as mesas. Pelo contrário, uma mesma mesa chega a receber seis clientes que só se conheceram no local. Cada cartela é vendida a R$ 1, e os prêmios chegam a R$ 2.000.

Dificilmente o apostador compra menos de cinco cartelas por rodada, que dura em média cerca de 10 minutos, o que estimula novas compras de cartelas. Os números sorteados são anunciados por uma locutora e em painéis ou monitores de televisão colocados ao lado de câmaras de vigilância.

Idosa dá “escapadinha” até o bingo

Com o compromisso de que seu nome não fosse divulgado porque, segundo ela, havia “ido ao bingo escondida dos filhos”, uma aposentada de 76 anos disse ao UOL, antes de tomar um táxi para retornar para casa, que gastou R$ 80 e que não fechou nenhuma cartela.

Acompanhada de uma amiga de 73 anos, disse que foi ao local para se divertir, já que “estava se sentindo muito deprimida por ficar trancada sozinha em casa”. Ela disse que não tem medo de contrair a covid-19, visto que tomou cloroquina “como prevenção” — o remédio não tem eficácia comprovada no tratamento contra a doença causada pelo coronavírus.

A aposentada está em dúvida se vai tomar a vacina, pois teme contrair uma “doença genética” — algo de que também não há nenhuma comprovação científica.

Bingo funciona atrás de bar de sinuca

Localizado no Carlos Prates, o Bingo do Prado redobrou o esquema de vigilância depois que foi decretado o lockdown na cidade. O portão azul que dá acesso ao bingo passou a ficar fechado e só é aberto durante a entrada e saída dos clientes.

Três seguranças observam a chegada por meio de câmeras colocadas na fachada do bingo, pintada também de azul. Ao contrário do Bingo do Túnel, o Bingo do Prado não tem estacionamento. Para não chamar atenção da polícia e dos fiscais da prefeitura, os seguranças pedem que os carros fiquem estacionados a pelo menos 100 metros da entrada.

Antes de o prefeito determinar o fechamento de bares e restaurantes, o portão ficava aberto. Ele dava acesso a um bar com uma mesa de sinuca usada como fachada pelo bingo. Uma porta escondida dá acesso às salas de jogo.

O Bingo do Prado tem uma estrutura menos sofisticada do que o seu concorrente. Apesar disso, a cartela é vendida também por R$ 1. A exemplo do Bingo do Túnel, o do Prado tem um aparelho onde as bolas com os números ficam em constante movimento.

As garçonetes do bar, as vendedoras de cartelas e as pagadoras de prêmio circulam por todo salão, que é cercado por seguranças e câmeras.

O uso de máscara no local não é obrigatório. No último domingo, cerca de 100 apostadores se aglomeravam em mesas de plástico branco. Segundo afirmou uma garçonete, o bingo também funciona das 16h às 4h.  (Coluna Amaury Ribeiro Jr – BH – UOL Notícias)

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