Não faz sentido a equação: quanto mais estelionato, mais público nos estádios

Blog do Editor I 19.05.23

Por: Magno José

Compartilhe:
PVC: "É fundamental criar regras de funcionamento para sites de aposta"
Segundo o jornalista e comentarista PVC, a sexta rodada do Brasileiro foi recorde, com média de 28 mil torcedores por jogo

Não fazia ainda um ano da divulgação do escândalo da Máfia da Loteria Esportiva, pela revista Placar, o Campeonato Brasileiro registrou sua maior média de público: 23.983 espectadores por partida. Mais de 155 mil pessoas pagaram ingressos para assistir a Flamengo 3 x 0 Santos, finalíssima disputada sete meses depois de a reportagem denunciar 125 jogadores, árbitros e treinadores.

Faz 41 anos e o fenômeno agora é semelhante —e novamente surpreendente.

O mais moderno e globalizado esquema de manipulação já fez o Superior Tribunal de Justiça Desportiva pedir a suspensão preventiva de oito jogadores. Pela primeira vez, há atletas que confessam ter recebido dinheiro para receber cartões amarelos ou fabricar pênaltis.

Contraponto: o Brasileiro tem, neste momento, o melhor público de todas as suas edições. A sexta rodada teve 28 mil espectadores por jogo. Depois de seis rodadas, a média é de 26 mil, 13% superior ao índice de 1983.

Não faz sentido a equação de quanto maior o escândalo, maior a atração de torcedores. A lógica seria o inverso, ou seja, quanto mais se tem a certeza de que se pode ser enganado ao assistir a algum esporte, mais se foge do estelionato.

A Bundesliga teve seis jogos arranjados na temporada 1970/71. Puniu 52 jogadores, dois técnicos, seis funcionários de clubes e, mesmo assim, perdeu 15% de público na temporada seguinte. Demorou três anos para retornar ao nível anterior, alcançado apenas em 1973/74, em parte por causa da proximidade da Copa do Mundo.

A Itália perdeu 15% de espectadores, tanto depois do Tottonero, a máfia da loteria deles, em 1980, quanto após o Calciopoli, manipulação de escalas de arbitragem, em 2005/06. No segundo caso, levou três anos para recuperar o índice anterior, mesmo tendo sido campeã mundial na Alemanha. Talvez em função do rebaixamento da Juventus, clube mais popular do país.

Em 1980, o retorno do público foi mais rápido, provavelmente em função da reabertura do mercado para jogadores estrangeiros após 14 anos. Em duas temporadas, a Itália já se havia tornado a meca do esporte e os estádios ficaram repletos de novo.

No Brasil, a pandemia fechou portões em 2020 e 2021 e há crescimento a cada temporada desde 2016, com ligeiro declínio em 2019 –segundo melhor índice da história– e 2022.

A taxa de ocupação dos estádios no ano do Flamengo de Jorge Jesus era de 49%. Neste início de Brasileiro alcançou 67%.

Há mais margem de crescimento com espaços populares nos estádios. O aumento de público continua se dando, aparentemente, pelo fortalecimento dos planos de sócios-torcedores, principalmente os que têm fidelização. O corintiano que não passar pela catraca contra o Ituano não terá prioridade na eventual semifinal de Libertadores. O mesmo vale para o palmeirense, embora esse não seja o formato adotado por Flamengo e São Paulo, por exemplo.

Até 2019, nunca tinha havido três clubes com média de público por partida superior a 30 mil torcedores num mesmo campeonato de pontos corridos. Nestas seis primeiras rodadas do Brasileiro 2023, há sete times assim –Flamengo, Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Vasco, Bahia e Fortaleza.

O Atlético-MG tem média de 35 mil no Mineirão. Um jogo no Independência, de menor capacidade, derrubou o número.

É sobrenatural, quase. Mas um fenômeno para continuar sendo acompanhado.

O escândalo, por enquanto, não derruba o público.

Isso exige trabalho. Prender os corruptos.

E estudar para chegar ao mais alto limite que o Brasileiro ainda pode alcançar.

(Folha de S.Paulo – PVC)

 

Comentar com o Facebook