A regulamentação de apostas esportivas online no Brasil: um marco para o setor

Opinião I 28.12.23

Por: Magno José

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A regulamentação de apostas esportivas online no Brasil: um marco para o setor
Brunno Carmona Calado*

Durante o primeiro ano de mandato do governo Lula, um dos principais objetivos do Ministro da Economia, Fernando Haddad, foi criar mecanismos com o fim de aumentar a arrecadação fiscal do governo, para que sejam financiados os projetos prometidos durante a campanha e que seja mantido déficit zero. Em razão disso, um dos setores que passaram a ser visados foi o de casas de apostas esportivas online, autorizadas a atuar no país desde a sanção da Lei 13.756, de 2018, pelo ex-presidente Michel Temer.

Nesse contexto, em meados de 2023, o Poder Executivo apresentou, no Congresso Nacional, a Medida Provisória 1.182/2023, que perdeu eficácia, e o Projeto de Lei 3.626/2023 – ambos teriam o objetivo de regulamentar e taxar o setor. Adicionada à tentativa de o governo incrementar suas receitas, surgiram casos de manipulação de resultados em partidas de futebol, de modo a deixar ainda mais evidente, pelo menos para a população, de que a regulamentação do setor seria importante no Brasil. Os fatos que envolveram atletas nessas manipulações, inclusive, levaram à criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara dos Deputados.

Cabe salientar que ao redor do mundo diversas economias já regulam este setor, apesar de haver notáveis diferenças nos modelos de regulação em cada país. Nos Estados Unidos, esta regulamentação cabe a cada estado e, na Europa, as regras sobre apostas são diversas entre os países, com destaque para o Reino Unido, que possui uma legislação específica para o setor desde 2005. Na América Latina, onde há um enorme mercado para ser ainda mais explorado, a Colômbia foi a primeira a adotar, em 2015, regras e criar tributação sobre o setor – o país chegou a criar a “Colijuegos” como ente de supervisão. Na Argentina, as províncias são responsáveis por esta regulação. No Chile, há preocupação das autoridades devido à falta de regulamentação, tal como havia no Brasil até a aprovação do PL 3626/2023, na penúltima sessão da Câmara dos Deputados no ano de 2023.

Uma das principais barreiras para a aprovação de um texto de consenso no segundo semestre de 2023 foi a atuação da Frente Parlamentar Evangélica, uma das mais mobilizadas do Congresso e influentes nas redes sociais. Apesar da tentativa de barrar o texto e contribuir para as idas e vindas da proposta na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, o texto foi definitivamente aprovado e está para sanção do Presidente da República, o que deve ocorrer nas próximas semanas. Desse modo, cabe analisar importantes pontos do PL 3.626/23, um marco para o desenvolvimento do setor no Brasil, que, segundo o Ministério da Fazenda, permitirá a arrecadação de R$12 bilhões já em 2024.

Alíquotas aplicadas a apostadores e empresas

Embora o governo tentasse aplicar 30% sobre os prêmios ganhos por apostadores e 18% sobre a arrecadação das empresas do setor, durante a tramitação do texto no Senado, houve redução destas alíquotas que passaram a ser de 12% sobre o faturamento das casas de apostas e 15% sobre apenas o prêmio obtido como resultante da aposta (o valor apostado não entra no cálculo). Cabe enfatizar que somente os apostadores que somarem prêmios acima da faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física, o montante de R$2.112,00, deverão pagar os impostos devidos. Além disso, as casas de apostas terão de pagar uma Taxa de Fiscalização ao Poder Público, que será definida de modo progressivo e conforme a receita líquida da empresa operadora.

Obrigações para as casas de apostas

O Ministério da Fazenda autorizará o funcionamento das empresas que atuarão no Brasil, as quais deverão ter sede no país e sócio brasileiro com pelo menos 20% do capital social da empresa. Além de ter de adotar medidas para evitar o cometimento de crimes ligados aos recursos financeiro dos negócios, tais como lavagem de dinheiro, as empresas terão de pagar até R$30 milhões para terem o direito de explorar até 3 marcas por até cinco anos. Por fim, destaca-se a necessidade de as empresas aumentarem os padrões de segurança de seus usuários e de todo o sistema de apostas, já que terão de adotar mecanismos de reconhecimento facial para que os usuários consigam apostar.

Fortalecimento do jogo responsável:

A defesa de um jogo responsável é um posicionamento que vem sendo adotado ao redor do mundo por várias empresas do setor. Inclusive, várias casas de apostas esportivas adotam medidas para fortalecer o pilar social nas relações que possuem com as sociedades em que atuam – apoiam financeiramente projetos sociais, por exemplo. No Congresso Nacional, parlamentares argumentaram que o texto teria de contar com mecanismos que fortalecessem um jogo responsável por seus usuários. Em função disso, o texto previu a proibição de apostas por menores de idade e definiu que as empresas devem desenvolver meios para monitorar a atividade de cada usuário, a fim de identificar possíveis consequências negativas decorrentes do jogo. Alguns critérios que devem ser levados em consideração são: tempo de jogo, montante e padrões de gastos do cliente, entre outros.

Proibição de usuários

Para que se tenha um ambiente com menos riscos aos usuários e a todo o sistema, o texto do PL prevê a proibição de participação de alguns indivíduos. São eles: menores de 18 anos; pessoas ligadas a jogos esportivos, como atletas, árbitros e dirigentes; indivíduos que possuem distúrbios ligados a jogos; e pessoas que exerçam influência não apenas sobre plataformas de jogos, mas também sobre eventos esportivos.

Distribuição dos recursos oriundos da arrecadação:

O texto prevê que a distribuição da arrecadação será feita da seguinte forma: 36% para a área do esporte; 28% para o turismo; 13,6% para a segurança pública; 10% para a educação; 10% para seguridade social; 1% para a saúde; 0,5% para entidades da sociedade civil; 0,5% para o Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-fim da Polícia Federal (Funapol); e 0,40% para a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). Nas áreas para as quais os recursos serão destinados os Ministérios responsáveis por cada área serão envolvidos e receberão partes do montante.

Após a aprovação desta proposta legislativa, fica claro que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, mostra-se correto ao afirmar que é de fundamental importância a regulamentação das apostas esportivas online, uma vez que a ausência de leis para o setor não impede que pessoas apostem em eventos esportivos. Hoje, as apostas online são uma realidade no Brasil e no mundo, por isso deve haver regulamentação por parte do Estado brasileiro.

Para o governo, a aprovação foi uma vitória e, em parte, é resultado da aproximação que Arthur Lira tem tido principalmente com o Ministro da Fazenda. Nota-se que, quando se trata de pauta econômica, tais como a Reforma Tributária e os Projetos de Leis das Offshores e das Apostas Esportivas, Lira tem mostrado empenho para garantir a aprovação destas medidas.

Essa regulamentação é extremamente benéfica para o desenvolvimento do setor no Brasil e deve ser feita de forma a levar em consideração o incentivo deste crescente setor da economia, ao mesmo tempo em que haja proteção a brasileiros usuários de sites de apostas esportivas – nos aspectos relacionados à saúde, à segurança e ao financeiro. Para as casas de bets, essa regulamentação é importante para conferir maior credibilidade e segurança a elas no Brasil, um dos maiores mercados mundiais a serem explorados, não apenas devido à quantidade de população, mas também à paixão que os brasileiros possuem pelo esporte. Além disso, o crescente número de famílias que ascenderam economicamente nas últimas décadas e o fácil acesso que estas passaram a ter ao ambiente online favorecem o desenvolvimento do setor no Brasil, o que torna o país uma prioridade de investimento para as empresas do setor.

Por fim, cabe ressaltar que a medida é um marco na criação de um cenário regulatório que equilibre interesses sociais e econômicos, e que sua aprovação pode gerar vultosos investimentos no país nos próximos anos. Além disso, a futura Lei poderá conferir maior dinamicidade a uma nova cadeia produtiva que tem se desenvolvido em anos recentes, a qual tem incentivado novos desenvolvimentos tecnológicos no Brasil e criado milhares de empregos.

Brunno Carmona Calado é advogado sênior e coordenador da área de Relações Governamentais do Almeida Advogados. Possui MBA em Relações Governamentais pela FGV e é Pós-Graduando em Direito Regulatório pela UERJ. O artigo foi veiculado na Gazeta do Povo – PR.

 

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