Elio Gaspari vestiu o figurino da ‘Dona Santinha’
Magnho José*
O Elio Gaspari vestiu o figurino da ‘Dona Santinha’ e criticou a legalização dos jogos e a regulamentação das apostas esportivas em seu artigo sob o título ‘Laços da jogatina com o crime organizado são conhecidos’ veiculado pelo O Globo e ‘O preço da jogatina das bets’ pela Folha de S.Paulo na última quarta-feira (21).
Gaspari cita o equivocado estudo dos economistas do banco Itaú, que estimou que, nos 12 meses de junho de 2023 a junho de 2024, os brasileiros “perderam R$ 23,9 bilhões apostando no setor legalizado da jogatina, as chamadas bets”. O erro grave do estudo é o fato dos economistas foi não considerarem os valores dos apostadores retidos nas contas das plataformas de apostas esportivas. Sabemos que vários apostadores mantém seus recursos em suas contas nos sites para facilitar no momento das apostas. Sem a regulamentação é impossível dimensionar os valores que são mantidos como saldo pelos apostadores nas plataformas, comprometendo mortalmente o resultado da simples conta que os brasileiros apostaram R$ 68 bilhões e receberam R$ 44 bi em prêmios. Na verdade, estudos, estatísticas e pesquisas que estão sendo divulgadas com viés negativo e sem dados confiáveis têm servido de combustível em campanhas para idiotizar os apostadores.
Além disso, o jornalista insinua que existe vínculo dos jogos não regulados com o crime organizado. Na verdade, jogo ilegal existe enquanto o legal não existir. O jogo ilegal não é a razão pela qual as pessoas jogam, mas sim pela simples realidade da demanda e oferta. Sem leis e regulamentos, os jogos ilegais oferecem ao público os meios para praticar o que desejam, mas, infelizmente, eles criam negócios para o crime. A ilegalidade alimenta a corrupção e como nos ensina o ministro do STF, André Mendonça: “Onde não há Estado, há crime organizado”.
É totalmente equivocado o pensamento que pelo fato de os representantes das plataformas terem tido 251 reuniões com os técnicos da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda (SPA-MF) as plataformas foram beneficiadas em detrimento as poucas reuniões sobre jogo responsável.
Se o jornalista tivesse o cuidado de ler a portaria de jogo responsável produzida pela SPA-MF, descobriria que o documento com as ações voltadas à promoção do jogo responsável com as diretrizes e práticas a serem adotadas para prevenção ao transtorno do jogo patológico, regras para monitoramento e prevenção ao endividamento do apostador e de publicidade responsável, descobriria que o regramento segue as melhores práticas mundiais e é o resultado da participação dos especialistas consultados pela pasta.
Espanta ver um jornalista do calibre do Elio Gaspari propagar tanta desinformação e uma dose de preconceito com relação a jogos, apostas e loterias, inclusive usando o termo ‘jogatina’, usado comumente pelos lobistas carolas para manter o jogo na clandestinidade. O debate sobre a legalização dos jogos no Brasil é saudável para esclarecer sobre esta atividade econômica (e não de costumes), mas deveria considerar que este setor deve ser legalizado a exemplo das principais economias mundiais, que acolheram o jogo no seu sistema jurídico porque perceberam que existindo demanda ‘alguém’ vai prestar o serviço.
Ao legalizar todas as formas de apostas, os jogadores migrarão naturalmente para o jogo que apresente mais segurança e melhores chances de ganhos. Este processo aconteceu em todos os mercados que legalizaram este setor depois de longos períodos de proibição.
Gaspari seguiu a trilogia das teses de grupos religiosos para elencar a patologia, lavagem de dinheiro e ausência de controle como argumentos para manter o jogo na ilegalidade. Várias das propostas contidas na regulamentação das apostas esportivas e no projeto de legalização dos jogos foram introduzidas a partir das sugestões dos técnicos da Procuradoria-Geral da República – PGR, Polícia Federal, Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, Ministério da Saúde e Receita Federal, inclusive as recomendações adotadas pelo Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo – GAFI.
É ignorância ou má-fé afirmar que as apostas serão usadas “lavar dinheiro do tráfico de drogas e da corrupção”. Com a introdução do PIX como meio de pagamento, essa modalidade já é responsável por 98% das transferências bancárias para os sites de apostas e, até um estudante do primeiro período da faculdade de economia e/ou jornalismo, sabe que o novo sistema de pagamento instantâneo criado pelo Banco Central é totalmente rastreável.
Em resumo, o debate sobre a legalização do jogo no Brasil não deve ser somente sobre os investimentos internacionais, receitas de novos impostos e nem os milhares de empregos que criará e formalizará. Esses argumentos são óbvios e já não estão mais em debate. O verdadeiro desafio é a criação e o estabelecimento de leis e regulamentos, que permitam aos cidadãos exercerem seu desejo de jogar sob os olhos atentos de regras claramente definidas pelo Estado e sua efetiva aplicação.
Os benefícios positivos do jogo legal superam em muito as desvantagens propostas por qualquer pessoa, grupo ou jornalista contra o jogo. O jogo ilegal é, claramente, um passatempo mais prejudicial do que o jogo legal.
(*) Magnho José é editor do BNLData e presidente do Instituto Brasileiro Jogo Legal – IJL