Entenda as visões divergentes entre MP, a juíza que decretou prisões e desembargador no caso Gusttavo Lima e Deolane

Apostas I 25.09.24

Por: Magno José

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Entenda as visões divergentes entre MP, a juíza que decretou prisões e desembargador no caso Gusttavo Lima e Deolane
O desembargador Eduardo Guilliod Maranhão determinou a soltura dos investigados e criticou a determinação da magistrada. Segundo ele as justificativas usadas pela juíza para fundamentar o pedido de prisão preventiva “constituem meras ilações impróprias e considerações genéricas” e que os elementos levantados pela juíza para a prisão são frágeis (Reprodução Instagram)

O desembargador Eduardo Guilliod Maranhão, do Tribunal de Justiça de Pernambuco, suspendeu na tarde de ontem a ordem de prisão preventiva do cantor Gusttavo Lima, decretada na segunda-feira. Ele acolheu um habeas corpus impetrado a favor do sertanejo e revogou a decisão da juíza Andréa Calado da Cruz, da 12ª Vara Criminal do Recife. Ao acolher o pedido dos advogados de defesa, Guilliod, que já havia determinado no dia anterior a soltura de outros investigados no mesmo caso, criticou a determinação da magistrada.

Antes do habeas corpus, o cantor chegou a ter o nome incluído no sistema de alerta da Polícia Federal, para que fosse preso quando voltasse ao país. Após comparecer ao Rock in Rio no final de semana, Gusttavo viajou para Miami, onde se encontrava quando teve a prisão decretada.

Na nova decisão, o desembargador afirma que as justificativas usadas por Calado para fundamentar o pedido de prisão preventiva “constituem meras ilações impróprias e considerações genéricas”. Guilliod diz ainda inexistir “qualquer evidência material a justificar, nesse momento, a segregação cautelar” do cantor. O desembargador também pôs fim à suspensão do passaporte do sertanejo e do certificado de seu registro e de eventual porte de arma de fogo.

Na avaliação de Guilliod, os elementos levantados pela juíza para a prisão são frágeis. Um deles está na compra de 25% da Vai de Bet pelo astro sertanejo em julho. A Vai de Bet é uma das empresas investigadas na Operação Integration da Polícia Civil, que apurou a ligação de apostas esportivas com jogos ilegais no estado. Mas o desembargador afirmou não existir “lastro plausível capaz de demonstrar a existência da materialidade e do indício de autoria” de crimes de lavagem de dinheiro pela compra de parte da Vai de Bet pelo cantor.

O desembargador rejeitou a tese de Calado de que o sertanejo teria “dado guarida” a José André da Rocha Neto e a Aislla Sabrina Henriques Truta Rocha, sócios da Vai de Bet, quando ambos estavam foragidos. Guilliod lembrou que o casal embarcou de Goiânia em uma viagem à Grécia com Gusttavo, para a festa de aniversário do sertanejo, no dia 1º de setembro. E a prisão preventiva da dupla foi decretada dois dias depois. “Resta evidente que esses não se encontravam na condição de foragidos no momento do embarque, tampouco há que se falar em fuga ou favorecimento a fuga”, concluiu o desembargador do TJ de Pernambuco.

Visões divergentes

O que disse o Ministério Público de Pernambuco: Eram necessárias novas diligências para concluir o inquérito da Operação Integration e por isso não foi feita a denúncia dos investigados. O MP recomendou a substituição das prisões por outras medidas cautelares, por entender que se ultrapassaria o prazo previsto na lei para a denúncia, gerando um constrangimento ilegal. Além disso, opinou que a Justiça da Paraíba devia cuidar da parte da investigação relacionada à Vai de Bet, por ser o estado onde está a sede da empresa.

O que disse a juíza: A titular da 2ª Vara Criminal do Recife, Andrea Calado da Cruz, manteve na segunda-feira as prisões preventivas decretadas no início de setembro e determinou a de Gusttavo Lima. Para Calado, a alegação do Ministério Público em relação ao prazo legal era uma “mera conjectura”. Também foi contra a o envio de parte dos autos à Paraíba.

O que disse o desembargador: Ao suspender as ordens de prisão de 17 investigados na Integration na segunda-feira, Eduardo Guilliod Maranhão considerou que não era possível mantê-las sem elementos para a denúncia do MP. Ao revogar a ordem de prisão do cantor, disse que as alegações da juíza eram “ilações impróprias e considerações genéricas”, sem qualquer “evidência material”.

Caiado conta conversa

No dia 8 de setembro, Gusttavo voltou ao Brasil em seu avião particular, mas sem o casal. Para Calado, havia a possibilidade de que Rocha Neto e Aislla tivessem desembarcado nas Ilhas Canárias ou ficado na Grécia para fugir. A parada do avião no arquipélago espanhol não foi feita na ida.

À colunista do GLOBO Bela Megale, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), um dos convidados do sertanejo na viagem, relatou ter mandado o casal da Vai de Bet deixar o iate avaliado em R$ 1 bilhão alugado pelo cantor para celebrar o aniversário. Segundo Caiado, a conversa com os dois foi na manhã do dia 4, na ilha de Mykonos. Caiado, que também viajou no avião do cantor, acrescentou que não sabia até então da investigação da dupla.

— Eu disse a ele (José André Neto) que a informação que recebi do meu secretário foi a de que havia sido decretada a prisão dele e de sua esposa. Daí falei: “Como tal, vocês não têm ambiente para ficar aqui”. Imediatamente, ele e a esposa desceram e nós seguimos a viagem por mais quatro dias — contou Caiado à coluna, afirmando que foi apoiado por Gusttavo.

A decisão da juíza de prender Gusttavo e manter a prisão dos demais investigados, libertados na segunda-feira por Guilliod, contrariou um parecer do Ministério Público de Pernambuco de 20 de setembro. Os promotores alegaram ser necessárias novas diligências da Polícia Civil para apurar o caso, não sendo possível oferecer a denúncia. Com isso, a continuidade das prisões não seria possível, já que ultrapassariam o prazo determinado no Código de Processo Penal.

Ainda segundo o MP, os autos envolvendo a Vai de Bet deveriam ir para a Paraíba, onde a empresa está sediada. A imputação dos envolvidos com a empresa, entre eles Gusttavo, deveria, portanto, ser analisada pelo Ministério Público daquele estado, para a promotoria pernambucana.

Guilliod concordou com o MP ao analisar o habeas corpus da defesa de Darwin Henrique da Silva Filho, dono da Esportes da Sorte, outra empresa investigada, que levou à suspensão da prisão de investigados na segunda-feira. Além de Darwin Filho, foram beneficiadas outras 16 pessoas, inclusive a advogada e influenciadora Deolane Bezerra.

Deolane deixou ontem a Colônia Penal Feminina de Buíque, no agreste pernambucano. Como os demais que foram soltos, ela está proibida de fazer publicidade de plataformas de jogos de azar ou fazer menção a elas nas redes. Os envolvidos também não podem frequentar qualquer empresa envolvida na investigação ou de participar de tomadas de decisão nelas. A influenciadora é dona da Zero Um Bet, que explora jogos de azar.

Na noite de ontem, já em casa, a influenciadora gravou um story no Instagram em que aparece ao lado da mãe, que também havia sido presa na investigação. “Fui querer ser amostradinha, passei mais 14 dias presa”, afirmou no vídeo. Deolane havia sido solta em 9 de setembro, mas violou as restrições impostas pela Justiça ao comentar o inquérito e usar as redes sociais logo após deixar a cadeia. No dia seguinte, retornou à prisão.

Suspeita de lavagem

Gusttavo e Deolane são suspeitos de integrar um esquema de lavagem de dinheiro ligado a jogos ilegais. Movimentações financeiras como a compra de uma Lamborghini, no caso da influenciadora, e a venda de uma avião pelo sertanejo estão entre os elementos que chamaram a atenção das autoridades. Lima e Deolane fizeram transações financeiras com a HSF Entretenimento, empresa de Darwin Filho, investigado por lavagem de dinheiro e associação das bets com o jogo do bicho, da banca Caminho da Sorte, que pertencia ao pai do empresário.

Em maio e abril de 2023, a Balada Produções e Eventos, do sertanejo, teria agido para ocultar R$ 9,7 milhões recebidos da HSF, segundo a juíza Andrea Calado. Deolane Bezerra, por sua vez, adquiriu da mesma empresa, por meio da Bezerra Publicidade e Comunicação, uma Lamborghini de R$ 4 milhões. O veículo havia sido importado por Darwin Filho através da Sports Entretenimento. A suspeita levantada pela Polícia Civil é a de que a compra do carro fizesse parte do esquema.

Contra Gusttavo, pesa também a relação com a Vai de Bet. Para a polícia pernambucana, a Balada Eventos e Produções teria atuado para ocultar e dissimular a propriedade de uma avião Cessna modelo 560 XLS ao negociá-la com a empresa J. M. J. Participações, de José André da Rocha, da Vai de Bet.

O sertanejo teria recebido R$ 22 milhões na transação. Outra empresa da qual o cantor é sócio, a GSA Empreendimentos e Participações, recebeu, em 2023, mais de R$ 5,7 milhões em 14 Pixs da Vai de Bet e da Zelu Brasil, uma intermediadora de pagamento a serviço da casa de apostas. Na avaliação dos policiais, há indícios suficientes da participação em lavagem de dinheiro.

A defesa do sertanejo disse ter recebido a notícia da revogação da ordem de prisão com “tranquilidade e sentimento de justiça”. Os advogados acrescentaram que “a decisão da juíza de origem estabeleceu uma série de presunções contrárias a tudo que já se apresentou nos autos, contrariando inclusive a manifestação do Ministério Público”.

Segundo a defesa, a relação do cantor com as empresas investigadas era de uso de imagem e decorrente da venda de um avião: “Tudo feito legalmente, mediante transações bancárias, declarações aos órgãos competentes e registro na Anac”.

 

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