Legalização dos jogos de azar enfrenta resistência da bancada evangélica

Destaque I 14.01.22

Por: Magno José

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Felipe Carreras se diz confiante na aprovação da proposta de legalização, da qual é o relator (Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados)

Após ter a urgência da tramitação aprovada no fim de 2021, o projeto que legaliza os jogos de azar no país pode ser apreciado logo após o recesso parlamentar pela Câmara dos Deputados.

A proposta é antiga, foi apresentada há cerca de três décadas pelo ex-deputado Renato Vianna (MDB-SC) e sempre enfrentou resistências da bancada evangélica. O grupo, formado por importantes aliados do presidente Jair Bolsonaro, já trabalhou para impedir o avanço do texto no ano passado. E agora pretende cobrar postura mais assertiva do governo federal para tentar travar a sua tramitação.

Por outro lado, o relator da proposta, deputado Felipe Carreras (PSB-PE), fia-se no argumento de que é importante fiscalizar a atividade já existente no país e considerar os eventuais ganhos em arrecadação, caso a regularização avance no Poder Legislativo.

Com o controle da pauta na Câmara, quem dará as cartas será o presidente da casa, Arthur Lira (PP-AL). Ele não fez compromisso com nenhum dos lados, mas chegou a ensaiar, horas antes da votação do requerimento de urgência, uma defesa da aprovação da proposta.

“Essa questão da legalização dos jogos no Brasil é uma questão debatida há muito tempo. E tem que ser feita com muito debate. Quem defende a legalização vai dizer o motivo, quem é contra vai dizer o motivo. Vamos ter oportunidade de saber quem quer que o jogo continue sendo ilegal no Brasil como é hoje. Todo mundo sabe que tem cassino, que tem bingo, existe caça-níquel, apostas virtuais, que são debitados no cartão de crédito e pagos no exterior, jogo do bicho”, disse Lira no fim de 2021. “Mas tem que continuar na clandestinidade para continuar sem gerar empregos formais no Brasil? Sem pagar, mais ou menos, R$ 20 bilhões a R$ 25 bilhões de impostos para o povo brasileiro? Este debate se fará aqui. Agora, a forma, vamos tratar”, acrescentou.

O parecer mais recente apresentado pelo relator traz alterações em relação ao projeto original, feitas para diminuir as críticas à falta de fiscalização, à possível associação da atividade com organizações criminosas e aos riscos à saúde por causa do vício em jogo. Uma das mudanças prevista é acabar com a anistia explícita a quem está sendo processado por contravenção penal em razão de manter bingos clandestinos ou operações de jogo do bicho. A versão atual não trata do tema, que ficaria para a Justiça.

O relatório de Carreras propõe legalizar os jogos e permitir apenas que o governo federal fique responsável pela concessão de autorização de funcionamento para as empresas interessadas, seja de forma virtual ou física. Se aprovado, será criada uma agência reguladora para supervisionar as empresas que atuarem no setor.

Além dos impostos que já incidem sobre as empresas, como o Imposto de Renda, o projeto cria uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) Jogos de 25% sobre os jogos on-line e 20% para os demais. O rateio previsto desses recursos é de 50% para o governo federal e 50% para estados e municípios. Também são previstas a criação de taxas de autorização de funcionamento e de fiscalização – esta cobrada anualmente.

Ao Valor, Carreras afirmou estar confiante em uma rápida aprovação da proposta. O tema deve ser assunto na primeira reunião de líderes de partidos da Câmara, que ainda não tem data para ocorrer. “No final do ano passado, quando a gente conseguiu a aprovação da urgência, falamos na possibilidade de se reunir quando estiver perto do retorno dos trabalhos. Há o compromisso feito por vários líderes de a gente votar o mérito assim que o recesso acabar.”

Segundo pessoas a par da situação, o relator do projeto na Câmara já teria conversado com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e com o senador Veneziano Vital do Rego (MDB-PB), que relatará a proposta na Casa. Ambos estariam alinhados com os argumentos de Carreras e defendem a celeridade da aprovação do projeto.

Já a bancada evangélica deve elevar o tom para que governistas engrossem o movimento para impedir o avanço da proposta. Aliados do presidente admitem que a importância do apoio dos religiosos em ano eleitoral pode esvaziar qualquer tipo de ofensiva do Palácio do Planalto pela aprovação da proposta. Ainda assim, ministros têm garantido, em caráter reservado, que o governo também não deve se movimentar para evitar a legalização dos jogos no país. Alguns deles já teriam confidenciado a parlamentares que são favoráveis à iniciativa.

Os dois grupos têm muitas fichas para o embate que se aproxima. Em fevereiro, a sorte estará lançada. (Valor Brasília – Marcelo Ribeiro)

 

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