Em uma simulação com ‘alíquota básica’ a taxação das apostas esportivas seria de 38,5% e a de jogos de azar de 44,5%. Imagina com o Imposto Seletivo?

Apostas, Destaque I 18.07.24

Por: Magno José

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Em uma simulação com ‘alíquota básica’ a taxação das apostas esportivas seria de 38,5% e a de jogos de azar de 44,5%. Imagina com o Imposto Seletivo? 1
É uma incógnita prever quanto o setor poderá arrecadar com Imposto Seletivo pelo fato de não estar regulado (bets) e legalizado (jogos de azar). O ‘Imposto do Pecado’ poderá se transformar no ‘Imposto do Sonho’; confira a análise do BNLData

A Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto que regulamenta a reforma tributária (Projeto de Lei Complementar 68/24), e manteve a cobrança do (IS) Imposto Seletivo ou ‘Imposto do Pecado’ para concursos de prognósticos incluindo as apostas de quota fixa e os sweepstakes, as apostas de turfe e as demais apostas (jogos de azar), fantasy games (em que o jogador simula uma equipe esportiva e ganha em cima dos resultados no mundo real). Pelo texto aprovado pelos deputados, até os jogos de azar quando forem legalizados pelo Congresso Nacional serão incluídos no Imposto Seletivo por serem apostas.

O PLP 68/24 regulamenta diversos aspectos da cobrança do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo (IS), que substituirão o PIS, a Cofins, o ICMS, o ISS e parcialmente o IPI.

A regulamentação da Reforma Tributária, aprovada ontem na Câmara, que manteve o Imposto Seletivo (IS) para uma série de setores, significa que seus produtos poderão pagar mais imposto que a alíquota padrão, de 26,5%. O Imposto Seletivo também conhecido como ‘Imposto do Pecado’, vai incidir sobre produtos nocivos à saúde e terá a alíquota definida no futuro e que vai variar de acordo com o produto e serviço.

Mas o caminho do projeto de regulamentação da Reforma Tributária ainda é longo. Após a aprovação na Câmara, o texto seguirá para o Senado, onde ainda pode ser alterado. Para o consumidor, nada muda no curto prazo. A Reforma Tributária será implementada de forma gradual. Em 2026, será implementada uma alíquota-teste, mas as mudanças só começam a valer de fato para o consumidor em 2027, em um processo que se estenderá até 2033.

Desde que foi anunciada a inclusão do setor no Imposto Seletivo, representantes do e entidades atuaram em Brasília para tentar reverter essa opção pelos parlamentares, mas sem sucesso. Existe um pensamento equivocado entre os atores políticos sobre jogos, apostas e loterias e este déficit de imagem levará anos para ser revertido.

Até a modalidade dos Fantasy Sports, que simulam jogos reais foi incluída no imposto seletivo. Popularizado por plataformas como o Cartola e o Rei do Pitaco, com mais de 30 milhões de usuários, o segmento argumentou que os jogos se diferem de sites de apostas e jogos de azar, considerados prejudiciais à saúde e que serão taxados, mas sem sucesso.

Reforma tributária: É preciso cautela em taxar ‘bets’ para não estimular a informalidade, diz Appy 1
Segundo o secretário de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, a tributação dos jogos de azar, caso sejam mantidos no imposto seletivo, terão uma alíquota total superior a 40%

Em entrevista ao O Globo, o secretário de Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, estimou que os jogos de azar, caso sejam mantidos no imposto seletivo, terão uma alíquota total superior a 40%, já que se somará a alíquota padrão de 26,5%, e ao imposto seletivo, a alíquota de 12% estabelecida na lei de regulamentação das apostas, sobre a margem de serviço das empresas.

Simulação com a alíquota básica para as bets

Atualmente, negócios com faturamento acima de R$ 78 milhões no ano-calendário ou ano anterior são obrigados a se enquadrarem no Lucro Real.

Atualmente, as apostas esportivas e jogos online deverão pagar Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins (7,6% do faturamento), Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ (15% do faturamento) Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL (9% sobre o lucro) e Programa de Integração Social – PIS (1,65% sobre o lucro), que daria um total de 33,25% de tributos federais, além do municipal Imposto Sobre Serviços – ISS, que acrescentaria a taxação de 5% a 2% dependendo do município onde estiver instalada a empresa. Com este cenário a tributação das bets seria de 38,25% a 35,25%. Se somarmos a estes valores os 12% do GGR, este setor teria uma taxação de 50,25% (ISS de 5%) e 45,25% (ISS de 2%). Isso sem contar o pagamento periódico de outorga à União, outros tributos trabalhistas e o próprio Imposto de Renda sobre os prêmios líquidos, que, nesse caso, será recolhido pelo apostador.

Se usarmos como base o imposto da alíquota padrão de 26,5% somado aos 12% do GGR, o setor de apostas esportivas e jogos online teria uma taxação de 38,5%, que já é considerada altíssima para esta atividade se compararmos com outros mercados.

Alguns exemplos mundiais de tributação sobre o GGR são o da Ilha de Man (0%), Antígua e Barbuda (3%), Grécia (5%), Estônia (5%), Malta (5%), New Jersey (10%), Chipre (13%), Reino Unido (15% apostas esportivas e 21% cassino remote gaming), Bulgária (15%), Suécia (18%), Espanha (20%), Itália (22%); República Checa (15% apostas esportivas e 35% cassino); Dinamarca (28%) e Alemanha (5.3% do turnover).

Para ficar mais claro esse entendimento, confira esta tabela comparativa:

Simples Nacional Lucro Presumido Lucro Real
Faturamento permitido até R$ 4,8 milhões até R$ 78 milhões não há
IRPJ alíquota única conforme anexo correspondente 15% sobre a parcela de presunção do lucro + 10% do que superar R$ 60 mil da presunção do trimestre 15% até R$ 240 mil da receita bruta anual; + 10% para valores acima
CSLL alíquota única conforme anexo correspondente 9% sobre a parcela de presunção do lucro do trimestre 9%
PIS alíquota única conforme anexo correspondente 0,65% 1,65%
Cofins alíquota única conforme anexo correspondente 3% 7,6%
ISS alíquota única conforme anexo correspondente entre 2% a 5%, de acordo com a determinação do município entre 2% a 5%, de acordo com a determinação do município
ICMS alíquota única conforme anexo correspondente alíquota conforme regras do Estado alíquota conforme regras do Estado


Simulação com a alíquota básica para os jogos de azar

Outro setor que poderá ser impactado com a introdução do Imposto Seletivo (IS) serão os jogos previstos no PL 2234/22, que deverá ser votado ainda este ano pelo plenário do Senado. A taxação aprovada pela Câmara dos Deputados para cassino, bingo, jogo do bicho e jogos online será através da CIDE de 17%, mais 1% destinado para a formação de atletas.

Se também usarmos como base o imposto da alíquota padrão para os jogos de azar –, que nem ainda não foram aprovados pelo Congresso –, cassino, bingo, jogo do bicho e jogos online teriam uma taxação de 18% (CIDE + formação de atletas) somados aos 26,5% que daria um total de 44,5%, praticamente inviabilizando todas as operações. Lembrando que a alíquota final ainda não foi definida.

Segundo especialista ouvido pelo BNLData, o artigo 103 do PL 2234-22 que criou a Cide-Jogos pode restringir a tributação das operações de cassino, bingo, jogo do bicho e jogos online em apenas  17%. Já que a “alíquota da Cide-Jogos será de até 17% sobre a receita bruta auferida em decorrência da exploração de jogos sem a incidência de quaisquer outras contribuições ou impostos sobre o faturamento, a renda ou o lucro decorrentes da exploração de jogos e apostas, descontado o valor de que trata o § 3º deste artigo.

Além das apostas esportivas, jogos online e jogos de azar, as empresas operadoras de loterias terceirizadas pelos governos estaduais e municipais também serão incluídas no Imposto Seletivo (IS) e terão alíquotas superiores que a padrão de 26,5%.

Tributação fora da realidade

O problema é que com a inclusão do setor de jogos, apostas e loterias no Imposto Seletivo (IS) a alíquota será superior a padrão de 26,5% e vai acabar prejudicando a sociedade e a implementação de políticas públicas, uma vez que as operadoras que atuarem ilegalmente no país não serão alvo desse tipo de cobrança e, portanto, vai estimular a migração de apostadores para o mercado ilegal porque as premiações serão mais atrativas.

Os parlamentares incluíram os jogos, apostas, loterias e fantasy games nas alíquotas do Imposto Seletivo para compensar concessões feitas no texto da reforma, como a inclusão de mais itens na cesta básica, dos setores de saúde e educação e profissionais liberais, por exemplo.

Existem variáveis que não foram avaliadas como as publicações das portarias pelo Ministério da Fazenda na regulação das apostas de quota fixa, pincipalmente a de jogo online, que será fundamental para definir a quantidade de operadores que vão aplicar a licença federal e a taxa de canalização dos apostadores. Além disso, os executivos interessados em uma licença federal avaliam outros riscos como a concorrência com as operações não reguladas, os operadores offshores e as operações estaduais e municipais.

Uma tributação fora da realidade das melhores práticas mundiais poderá ser decepcionante para as estimativas do governo, que trabalha com uma canalização de superior a 85% dos atuais apostadores.

O grande problema da inclusão dos concursos de prognósticos (loteria, apostas, jogos de azar e fantasy games) no Imposto Seletivo ou ‘Imposto do Pecado’ é que ninguém tem condições de afirmar com clareza o quanto este setor poderá gerar de tributos para os cofres públicos pelo fato de não estar regulado (bets) e legalizado (jogos de azar). Na verdade, o ‘Imposto do Pecado’ poderá se transformar no ‘Imposto do Sonho’.

***

Capítulo do Projeto de Lei Complementar (PLP 68/24) que trata da inclusão dos concursos de prognósticos (loteria, apostas e fantasy games):

CAPÍTULO IV

DOS CONCURSOS DE PROGNÓSTICOS

Seção I

Das Disposições Gerais

Art. 226. Os concursos de prognósticos, em meio físico ou virtual, compreendendo todas as modalidades lotéricas, incluindo as apostas de quota fixa e os sweepstakes, o fantasy sport, as apostas de turfe e as demais apostas, ficam sujeitos a regime específico de incidência do IBS e da CBS, de acordo com o disposto neste Capítulo.

Art. 227. A base de cálculo do IBS e da CBS sobre concursos de prognósticos é a receita própria da entidade que promove essa atividade, correspondente ao produto da arrecadação, com a dedução de:

I – premiações pagas; e

II – destinações obrigatórias por lei a órgão ou fundo público e aos demais beneficiários.

Art. 228. A alíquota do IBS e da CBS sobre concursos de prognósticos será nacionalmente uniforme e corresponderá à soma das alíquotas de referência das esferas federativas.

Art. 229. Fica vedado o crédito de IBS e CBS para os apostadores dos concursos de prognósticos.

Art. 230. As premiações pagas não ficam sujeitas à incidência do IBS e da CBS.

Art. 231. A empresa que opera concursos de prognósticos deverá apresentar obrigação acessória, na forma do regulamento, contendo, no mínimo, informações sobre o local onde a aposta é efetuada e os valores das apostas e das premiações pagas.

Parágrafo único. Caso as apostas sejam efetuadas de forma virtual, na obrigação acessória de que trata o caput, deverá ser identificado o apostador.

Seção II

Da Importação de Serviços de Concursos de Prognósticos

Art. 232. Ficarão sujeitos à incidência do IBS e da CBS pela mesma alíquota prevista para concursos de prognósticos no País as entidades domiciliadas no exterior que prestarem, por meio virtual, serviços de concursos de prognóstico de que trata este Capítulo para apostadores residentes ou domiciliados no País.

§ 1º O fornecedor do serviço de que trata o caput é o contribuinte do IBS e da CBS, podendo o apostador ser responsável solidário pelo pagamento, nas hipóteses previstas no art. 21.

§ 2º A base de cálculo é a receita auferida pela entidade em razão da operação, podendo regulamento prever a aplicação de um fator de redução para contemplar uma margem presumida, dentro dos limites estabelecidos neste Capítulo para as deduções de base de cálculo dos serviços de concurso de prognósticos no País.

§ 3º Aplica-se o disposto no Capítulo IV do Título I deste Livro às importações de que trata a presente Seção, naquilo que não conflitar com o disposto neste artigo.

Seção III

Da Exportação de Serviços de Concursos de Prognósticos

Art. 233. Os serviços de concursos de prognósticos prestados a residentes ou domiciliados no exterior serão considerados exportados, ficando imunes da incidência do IBS e da CBS, para efeitos do disposto no Capítulo V do Título I deste Livro.

Parágrafo único. O regulamento disporá sobre a forma de comprovação da residência ou domicílio no exterior para efeitos do disposto no caput.

Reforma tributária: É preciso cautela em taxar ‘bets’ para não estimular a informalidade, diz Appy

 

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