Histórias de jogadores mostram que moderação e atenção aos riscos são essenciais para apostar on-line
As apostas esportivas on-line vivem uma explosão no Brasil. O ano tem sido de expansão no contingente de brasileiros adeptos das plataformas digitais do ramo, as chamadas bets, cuja regulamentação entra em vigor em 2025, revela reportagem do O Globo.
Levantamento recente do Instituto Locomotiva indica que 52 milhões já apostaram na modalidade ao menos uma vez. Há seis meses, eram 38 milhões. As histórias dos jogadores indicam que navegar pelas bets sem comprometer as finanças pessoais requer moderação, equilíbrio e atenção aos riscos.
O estudante universitário Luiz Eduardo Paiva, de 22 anos, já era apaixonado por futebol quando conheceu os sites de apostas esportivas on-line, há quatro anos. Foi aumentando a frequência das apostas, o nível de informações que busca sobre as partidas e as “técnicas” de cada uma das plataformas e também o número de horas que passa nelas.
Ele diz que, no início, chegou a “quebrar muitas bancas” (termo usado no mundo das bets para indicar que o jogador perdeu a aposta) até pegar o jeito de como começar a ganhar. Quando percebeu que essa poderia ser uma fonte de dinheiro, ele decidiu até deixar um estágio na área de publicidade para se dedicar mais à atividade, que consome 20 horas semanais de sua rotina.
— Hoje eu acompanho uma grade cheia de jogos do mundo inteiro. Minha principal renda vem das bets — conta o jovem da Zona Leste de São Paulo, que mora com os pais e divide seus dias entre a faculdade, trabalho freelancer na área de redes sociais e o tempo dedicado às apostas relacionadas a partidas de futebol da Austrália à Malásia, apesar de não se tratarem de investimentos financeiros.
Ele se diz consciente de quão arriscada é a prática:
— Dá para viver bem, mas é uma atividade de alto risco. Precisa saber lidar com a perda. O que eu faço é dividir minha banca em porcentagens pequenas.
Mas nem todo mundo é bem-sucedido. Na pesquisa mais recente do Instituto Locomotiva sobre o perfil de quem joga on-line, 30% relatam ter mais perdas que ganhos, e 33% dizem que acabam empatando o que investem e os prêmios.
Negativo em R$ 1,8 mil
O conferente na área de logística Felipe Falcon, de 29 anos, faz parte da maioria dos apostadores que jogam de forma regular, mas só como entretenimento, variando o desempenho. Diz que costuma usar nas bets somente a parte da renda que “sobra” no fim do mês:
— Gosto da adrenalina. Também acho que (a aposta) deixa os jogos (de futebol) mais interessantes. Mas já fiz a conta de tudo que gastei e percebi que, em um ano, fiquei negativo em R$ 1,8 mil.
Entre os adeptos da modalidade “cassino” (como o “Jogo do Tigrinho”), as histórias de perda são ainda mais comuns. O barbeiro Gabriel Belchior, de 22 anos, perdeu tudo o que poupou desde que começou a trabalhar, ainda adolescente, nesse tipo de jogo virtual. Para tentar recuperar as perdas, chegou a fazer empréstimos no banco para apostar mais, agravando o círculo vicioso.
— Uma vez peguei R$ 15 mil emprestados no banco e perdi tudo em um dia. Em agosto do ano passado, decidi parar de jogar — conta o jovem, que hoje publica vídeos nas redes sociais para ajudar outras pessoas que também se viciaram ou têm dificuldades de moderar o uso de plataformas de jogo.
Regulação vai impor ferramentas de segurança
A regulação vai impor ao setor instrumentos para coibir o uso abusivo de apostas on-line e evitar vício e endividamento dos apostadores. A partir de janeiro de 2025 entram em vigar as regras aprovadas pelo Congresso, com normas do Ministério da Fazenda.
As plataformas terão de pagar pela licença para operar no Brasil e recolher impostos, mas também de cumprir salvaguardas para a segurança dos usuários. Terão de seguir regras para publicidade e criar ferramentas para identificar e coibir transtornos, como limite de valor por aposta e de tempo gasto na plataforma, a exemplo de países com mercados mais maduros, como o Reino Unido.
Em nota, a ANJL diz que os casos de superendividamento e comprometimento de renda “são raríssimos” diante do universo de milhões de jogadores.
‘Bets’ disputam espaço com o consumo no bolso do brasileiro e preocupam segmentos do comércio