LOTERJ recorre da decisão que suspendeu a regra que permite receber apostas de fora do estado

A Loteria do Estado do Rio de Janeiro – LOTERJ protocolou do Supremo Tribunal Federal (STF), no início da tarde desta sexta-feira (3), embargos de declaração com pedido de efeito suspensivo da decisão do ministro André Mendonça na ACO 3696, que determinou à LOTERJ e ao Estado do Rio de Janeiro que parem de receber apostas esportivas de quota fixa (bets) feitas fora de seu território. O prazo para a adoção de providências é de cinco dias, com o retorno da obrigatoriedade do uso de mecanismos eletrônicos de geolocalização.
Segundo a petição da Autarquia fluminense, a decisão padece de omissões, obscuridades e possíveis erros materiais, ensejando integração e complementação das razões de decidir, sobretudo por não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, enfraquecer a conclusão adotada”, além de desconsiderar importantes cominações legais e provisões constitucionais capazes de, igualmente, invalidar a decisão.
A petição, que pede urgência com os efeitos suspensivos, defende uma série de pontos e sugere modulação da decisão do ministro Mendonça.
A LOTERJ pondera que a decisão que obriga o retorno do uso de mecanismos eletrônicos de geolocalização, impõe à Loteria do Estado uma ordem para alteração de contratos públicos através do Termos de Credenciamento celebrados a partir do Edital 001/2023 devidamente assinados e publicados, após regular procedimento licitatório, antes mesmo da apresentação da contestação e do julgamento definitivo, “em evidente providência satisfativa da totalidade do pleito final da União”.
A imposição liminar dessa “obrigatoriedade do uso de mecanismos eletrônicos de geolocalização” significa, na prática, impor à LOTERJ a retificação unilateral de todos os Termos de Credenciamento com agentes operadores já regularmente credenciados após procedimento licitatório, fato que não apenas satisfaz o objetivo final da ação proposta pela União, como é manifestamente irreversível e poderá acarretar em incalculável impacto financeiro para esta Autarquia e para o próprio Estado do Rio de Janeiro, “haja vista que, diante da alteração unilateral de condições de Termos de Credenciamento já estabelecidos, assinados e publicados (in casu, para inclusão da obrigatoriedade indicada), os particulares credenciados poderão optar por rescindir ou não aceitar tais alterações, com invariável perda de arrecadação e, até mesmo, risco devolução parcial de outorgas fixas já adiantadas por ocasião dessas contratações”.
Segundo a Loteria do Estado a decisão poderá gerar pena de grave dano em potencial às rendas do Estado e desta Autarquia, que serão subitamente expostos a riscos de restituição de outorgas fixas, cessação de arrecadação prevista de outorgas variáveis, exposição à reparação de perdas e danos e variados outros impactos, de ordem multimilionária.
Geolocalização não é exigência legal, mas infralegal
Com relação ao mecanismo de geolocalização, a LOTERJ considera que trata-se de essencial ponto de omissão-obscuridade ou erro material, haja vista que o art. 35-A, caput e §§, da Lei nº 13.756/2018, com a redação dada pela Lei nº 14.790/2023, em nenhum momento impõe “adoção de sistema de geolocalização de apostas”. Ainda segundo a petição, a “adoção de sistema de geolocalização de apostas” é uma providência que a União, por meio da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda, pretende impor aos Entes Federados Estaduais por meio de norma infralegal.
Segundo a loteria, a utilização de declaração e anuência formal do apostador é um critério regularmente válido e dentro da discricionariedade da LOTERJ das previsões legais, “pois não há, em nenhum dispositivo das leis que regem o setor, previsão determinando a utilização do sistema de “trava de geolocalização” (conforme pretende a União, que tenta impor essa metodologia por normas infralegais aos Estados, em violação à competência material e regulamentar fixada nas ADPFs 492 e 493), justamente por ser um critério regulatório, conforme já abordado neste instrumento processual”.
A Loteria do Estado do rio de Janeiro registra que a Loteria do Paraná – LOTTOPA, a Loteria Estadual do Maranhão – LOTEMA e a Loteria do Estado da Paraíba, LOTEP, não são capazes de eliminar a oferta virtual de produtos lotéricos por seus credenciados fora dos limites territoriais dos Estados e apresenta “captura de IP” realizada através de teste de ping nos três casos.
Além disso, a petição da Autarquia Fluminense cita a declaração da representante da ANATEL, Gesilea Fonseca Teles durante a oitiva na “CPI das Bets” do Senado Federal de que: “a internet foi feita pra não ter fronteiras, ela foi desenhada pra isso, então qualquer tipo de bloqueio é tentar quebrar a natureza da internet. Então há uma dificuldade. O que a senhora colocou, por exemplo, de a China tentar bloquear algumas coisas, e aí a VPN vem como uma solução de burla desse bloqueio, é o desafio que todos nós temos. Então eu não consigo afirmar que é totalmente impossível, mas seria um desafio muito grande, muito grande, porque vai contra a natureza da própria internet”.
Retificação do Edital de Credenciamento
Com relação a publicação da retificação do Edital de Credenciamento ter ocorrido ocorreu um dia após a publicação da Medida Provisória nº 1.182/2023, ou seja, 25/07/2023, quando já vigoravam as novas regras estipuladas por essa Medida Provisória, depois convertida na Lei nº 14.790, de 2023, a qual, repito, introduziu o art. 35-A da Lei nº 13.756, de 2018 a LOTERJ esclareceu que o primeiro edital ou chamamento público foi “publicado em data anterior à edição da referida Medida Provisória, independentemente da data da efetiva conclusão ou expedição da concessão, permissão ou autorização, respeitados o direito adquirido e os atos jurídicos perfeitos”.
Além disso, o credenciamento estadual foi iniciado pela LOTERJ em 25/04/2023 (Edital de Credenciamento nº 01/2023), o procedimento como um todo submete-se sim à regra de transição preconizada, porque alterações subsequentes a um Edital licitatório não correspondem a uma licitação, mas sim ao mesmo procedimento. Ainda que não se considere, é fato que a Medida Provisória foi republicada no Diário Oficial da União de 26/07/2023, substituindo a versão de 25/07/2023, pelo que a própria retificação do Edital nº 01/2023 é contemporânea à publicação definitiva da Medida Provisória.
E cita que a MP 1.182/2023 não foi convertida na Lei nº 14.790/2023. “Na verdade, referida MP nº 1.182/2023, que absolutamente NADA previu ou dispôs sobre georreferenciamentos e critérios de localização, sequer restrições territoriais ou de domicílio, decaiu sem apreciação pelo Congresso Nacional, sendo que a Lei nº 14.790/2023 foi editada a partir do Projeto de Lei nº 3.626/2023”, contesta.
Pedidos da LOTERJ
Um dos pedidos da LOTERJ nos embargos de declaração com pedido de efeito suspensivo é a modulação dos efeitos para credenciamentos em curso.
“Considerando-se que as providências liminares ordenadas em sede de antecipação de tutela não podem ser satisfativas e não podem, de forma irreversível, macular atos administrativos e contratos públicos vigentes, tampouco porque não seja razoável impor risco multimilionário a esta Autarquia e ao próprio Estado do Rio de Janeiro por simples medida liminar a priori, roga-se, respeitosamente, que em qualquer hipótese as medidas ordenadas sejam moduladas para, neste primeiro momento, pelo menos preservarem-se os atos jurídicos aperfeiçoados, assim entendidos como os Termos de Credenciamento já assinados, frutos dos processos licitatórios de credenciamento regularmente concluídos até a data de edição da medida, ao menos até o julgamento definitivo da lide”.
A LOTERJ também registra que o prazo de cinco dias assinado para a retificação de um Edital e de diversos contratos públicos (Termos de Credenciamento) já assinados, publicados e plenamente vigentes, que sustentam relações jurídicas com particulares titulares de expectativas legítimas junto a esta Autarquia, é excessivamente exíguo e não se coaduna com os primados da razoabilidade ou da proporcionalidade, pelo que igualmente não pode prevalecer.
A Assessora-Chefe Assjur da LOTERJ, Natália Fernandes Santiago registra que diante da relevância das questões levantadas seja sobrestada a efetividade da decisão até que haja deliberação em Plenário da medida liminar deferida.
Entenda a decisão do ministro André Mendonça
Na medida cautelar deferida na ação cível 3696, o ministro decidiu, ainda, suspender a eficácia da retificação do edital de credenciamento nº 1/2023, que flexibilizou os mecanismos de fiscalização territorial para exploração de loterias na modalidade de apostas esportivas de quota fixa. A autarquia também está obrigada a exigir das bets credenciadas por ela a utilização dos mecanismos eletrônicos de geolocalização que garantam que as apostas são efetivamente originárias apenas do Rio de Janeiro.
A Loterj tem cinco dias, a contar da intimação da decisão proferida, para cessar a exploração de loterias e jogos eletrônicos fora dos limites territoriais do Rio. Mesmo prazo foi concedido pelo STF para que a autarquia coloque em funcionamento os sistemas de geolocalização. O sistema deve garantir que as apostas sejam efetivamente originárias do estado do Rio de Janeiro e bloquear apostas de outras regiões.
No entendimento da AGU, ao credenciar empresas para explorar o serviço em âmbito nacional, a Loterj prejudica o pacto federativo e a livre concorrência; desobedece as regras do Ministério da Fazenda e invade a competência da União ao explorar o serviço de loterias em todo o território nacional.